Neste exercício de responsabilidade associativa tenho por diante o desafio de recolher nas minhas palavras o sentir de muitas pessoas. Quero ser a voz daquela mocidade que se incorporou à AGAL na primeira hora, preparada pola equipa fundacional: a Geraçom dos anos ’80. Poderiam estar agora mesmo intervindo Manuel Portas, Maria José Díaz Pinheiro, Luís Foz, Paulo Valério, Henrique Rabuñal, Carmo Cozinha, Ângelo Cristóvão, José Manuel Barbosa, José Francisco Carro, Manolo Forcadela, Carlos Quiroga, Ernesta Basanta, José António Souto e um longo etcétera. Todas e todos retornariam 40 anos atrás para falarem com orgulho dos seus mestres e contar-vos algo deste teor.
Em 1981 tínhamos entre 16 e 25 anos. Entrávamos na Universidade e uníamo-nos a quem estava já dentro dela e ainda àqueles homens e mulheres que obtiveram a licenciatura e que principiavam as suas carreiras docentes. Nos lançamentos da Dialéctica do desenvolvimento e do Estudo crítico vimo-nos, falamos e fomo-nos conhecendo e fazendo associaçom. Com José Luís de ponte entre a equipa profissional e a juvenil, o sistema de comunicaçom funcionava e foi assim que conhecemos os nomes de Jenaro Marinhas, de Ernesto Guerra da Cal e de Xavier Alcalá; recebemos convite para associar-nos à AGAL e, já nas assembleias, nutrimo-nos de amor à terra e de paixom dinamizadora através das palavras de Maria do Carmo Henríquez e de António Gil, de Elvira Souto, de Maria das Dores Arribe, de Ramom Lôpez Suevos, de Aurora Marco, de Martinho M. Santalha…
Atrevo-me a sinalar um encontro simbólico do universo cultural emergente: as Jornadas da Poesia Galega, Portuguesa e Brasileira celebradas na Faculdade de Filologia em 1983. Ali estiveram Xosé Luís Méndez Ferrín, Bernardino Graña e Ricardo Carvalho; Sophia de Mello e Eugénio de Andrade; e o brasileiro Cláudio Murilo. A nossa equipa docente tecia -como lhe chama José Maria Sánchez Carrión– o “espaço simbólico” do modelo de convívio policêntrico das diferentes literaturas do nosso diasistema linguístico. Sobre essa base assentava o novo Seminário de Estudos Galegos em que nos formávamos antes de assistirmos aos cursos de alfabetizaçom celebrados na Residência Universitária do Burgo, ministrados por Manolo Portas e Luís Foz, e que serviram de preámbulo àqueles outros em que nos estreamos como docentes -com o Método prático como guia- no ano académico posterior, o mesmo em que se celebrou o Iº Congresso Internacional da Língua Galego-Portuguesa, onde conhecemos o Isaac.
Atrevo-me a sinalar um encontro simbólico do universo cultural emergente: as Jornadas da Poesia Galega, Portuguesa e Brasileira celebradas na Faculdade de Filologia em 1983.
Aquela cita de 1984 em Ourense foi o nosso primeiro ponto de encontro presencial. Com aqueles relatórios assimilados, e com os centenares de nomes e de obras descobertas, entrávamos na fase de levantarmos com as nossas próprias forças umha nova ponte, ao estilo da que pouco antes fora levantada para nós. A estrutura tomava consistência: Ricardo, Jenaro e Ernesto, da Geraçom do 36; Isaac, da das Festas Minervais; a legiom da da Transiçom; e a do Burgo das Naçons… trabalhando mao com mao.
Resultado daquela unidade assentada no respeito mútuo, multiplicaram-se os cursos e foram aparecendo Meendinho e Artábria e Bonaval e a Associaçom Nacional de Estudantes de Letras. Chegavam José Manuel Aldea e Xico Paradelo e os irmaos Alonso Nozeda; e Gonçalo Grandal e Maurício Castro; e Carlos Garrido; e Rosário Fernández Velho e Francesco Traficante; e Jesus Sanches Sobrado e Beatriz Árias… E o espaço simbólico fortalecia-se e aparecia o Movimento de Defesa da Língua, embriom da futura Academia da Língua Portuguesa.
Resultado daquela unidade assentada no respeito mútuo, multiplicaram-se os cursos e foram aparecendo Meendinho e Artábria e Bonaval e a Associaçom Nacional de Estudantes de Letras.
Com a mudança de século, incorporavam-se os nossos alunos e alunas oficiais: Séchu Sende, Beatriz Bieites, Eduardo Maragoto, Ugio Outeiro, Maria Vila Verde… Enfim: a semente da Semente. Já nom estavam Ricardo, nem Jenaro, nem Ernesto. Isaac passava a ser o nosso patriarca. Justificado estaria que naquela altura lhe tivéssemos tributado homenagem ao tradutor dos Salmos, editados em 1966, 40 anos atrás; das encíclicas de Joám XXIII e Paulo VI; ou do texto do Concílio Vaticano II, que levava o subtítulo de “A Igreja no mundo moderno”. Que bom seria que tivéssemos um carinho para o nosso mestre originário da Vila Seca de Trasmiras que com 30 anos já arava no amencer com a mesma paixom e amor à terra com que o seu vizinho de Vilar de Rei, Luís Álvarez Pousa, sementava loguinho de clarejar. Estaríamos fazendo justiça ao coordenador do Dicionário ilustrado, que começava a publicar-se em 1983; ou ao autor, editor e comercializador do monumental Dicionário da língua galega publicado em 1986, o mesmo que sintetizou a obra para que chegasse a um público mais numeroso na ediçom de Sotelo Blanco. Estaríamos dando alento ao mesmo lexicógrafo que seguiu apanhando, peneirando e atesourando 139.101 palavras para as entregar generosamente ao mundo através da internet: “Uma explosão de luz no universo da língua”.
Nom fomos capazes.
Em 2004, a coincidir com o trigésimo aniversário da publicaçom em Lisboa e Madrid do Manifesto para a supervivência da cultura galega, deveríamos ter nomeado Membro de Honra o Martinho de Casal de Gonce (Cerdido), um Irmandinho que colaborou para que desde Roma se lançasse ao mundo a mensagem reivindicativa do nosso idioma, como antes (1954) lançaram desde América os emigrantes e exilados que apresentaram a “DENUNCIA diante a Unesco da perseguizón do idioma galego poI-o Estado Hespañol”. Seria umha magnífica maneira de celebrarmos os 25 anos da ediçom das Directrices para a reintegración lingüística galego-portuguesa (Ferrol, 1979) e na mesma cerimónia teríamos oportunidade de festejar o décimo aniversário das Memórias de Filipe de Amância, pajem de Dom Merlim (Edicións Laiovento, 1994).
Tampouco fomos capazes.
No ano seguinte, em 2005, teríamos uma oportunidade ideal para nomearmos membro de honra o autor da ediçom e estudo do cancioneiro de Joám Airas de Santiago, publicado 25 anos antes por José Luís Rodríguez, de Vila Maior de Negral (Gontim), o mesmo que fora secretario da Comisión de Lingüística da Xunta preautonómica que elaborou as Normas ortográficas do idioma galego (1980). Seria umha oportunidade de ouro, porque se celebrava o quinto ano da apariçom dos dous volumes dos monumentais Estudos dedicados a Ricardo Carvalho Calero coeditados polo Parlamento e o Serviço de Publicaçons da Universidade de Santiago de Compostela; e porque nesse mesmo ano José Luís Rodríguez, umha aluna –Carmen Villarino Pardo– e um aluno –Elias Torres Feijó– foram organizadores do VIII Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas, celebrado em Santiago de Compostela sob o título Da Galiza a Timor: a lusofonia em foco.
Tampouco desta vez!
Na verdade, sonhávamos com fazer algo assim, mas nom tivemos capacidade para fazê-lo. O esforço comunicativo com o tecido associativo galego -por exemplo com Xosé Ramón Barreiro, em qualidade de Presidente da Academia Galega- tivo custos internos e avançamos mais lentamente do que seria desejável. Contodo, a passagem do tempo está-nos dizendo que selecionamos bem as prioridades. Mereceu a pena, porque abrimos os braços e recolhemos a aperta fraterna da Geraçom Através, a da autêntica transversalidade, e o que eram sonhos tornaram-se realidades tangíveis. Os livros começaram a chegar simultaneamente às principais livrarias de toda a nossa geografia, nos circuitos comerciais normais; o Portal Galego da Língua passou a ser gerido profissionalmente, como desejavam os seus criadores: José Henrique Peres e o Vítor Lourenço; os centros de ensino recebêrom a oferta de obradoiros ministrados pola AGAL; e a nossa mensagem prendeu nos Centros Sociais urbanos e nas Sementes que hoje emergem em toda a naçom.
Mereceu a pena, porque abrimos os braços e recolhemos a aperta fraterna da Geraçom Através, a da autêntica transversalidade, e o que eram sonhos tornaram-se realidades tangíveis.
Felizmente, hoje comparecemos na Nave de Vidám para agradecermos a generosidade do Estraviz que nos anos ’70 ensinava o idioma galego no Ateneu de Madrid e na Irmandade Galega-Lóstrego; a entrega do Martinho que fazia outro tanto incluso nas mesas dos bares em Ferrol, o mesmo que colocava nos bancos da igreja aquelas folhinhas com orientaçons para participar na celebraçom litúrgica; a dedicaçom do sucessor de Ricardo Carvalho na escola filológica de Compostela, que nos abriu as portas da obra de Manuel Rodrigues Lapa e da Col. Noroeste da Sá da Costa -o modelo editor de que gostamos-, dos Bichos de Torga, da Sibila da Agustina, dos Sagarana do Guimarães Rosa ou do Mayombe do Pepetela. Hoje, por fim, recuperamos o espírito da Escola das Areias, do Padre Sarmiento; e sentimos a força que nos transmitem a Escola de Fingoi e a do Colégio Rosalia de Castro, de Vigo, dirigido por Antia Cal.
Agradecermos a generosidade do Estraviz que nos anos ’70 ensinava o idioma galego no Ateneu de Madrid e na Irmandade Galega-Lóstrego; a entrega do Martinho que fazia outro tanto incluso nas mesas dos bares em Ferrol, o mesmo que colocava nos bancos da igreja aquelas folhinhas com orientaçons para participar na celebraçom litúrgica; a dedicaçom do sucessor de Ricardo Carvalho na escola filológica de Compostela, que nos abriu as portas da obra de Manuel Rodrigues Lapa e da Col.
Companheiras e companheiros da Geraçom Através (Valentim Fagim, Miguel Penas, Beatriz Bieites, Eduardo Maragoto, Maria Vila Verde, Ugio Outeiro…), a força do nosso amor é construtiva. Por isso queremos mais amor para José Maria Monterroso, Maria do Carmo Henríquez, Luís Foz, Joám Carlos Rábade, Moncho Reimunde, Veneranda Rodrigues, Manuel Rivero, Aurora Marco… que som Sócias e Sócios de Honra e a nós honra-nos honrá-los com esta distinçom. Nom é umha exigência. É umha mostra pública de que os nossos ombros estám aqui para colaborar disciplinadamente.
E para vós, Mestres de Honra, vai este símbolo da metamorfose que queremos para a nossa terra e para o nosso idioma. É a história dumha família galega que no seu dia marchou para Guildford, na Inglaterra; que fijo fortuna económica e que retornou para começar aqui umha nova etapa. Em pleno século XXI, umha mamá e umha avó, viajam -desta vez como turistas- para mostrarem às netas onde está a génese do seu bem-estar. Naveguemos, pois, para o Norte:
A minha avó pediu-me
umha fotografia,
ela sozinha,
diante do primeiro hotel em que trabalhara.
A minha mai tiramos-lhe outra
no bolardo que atropelara
na sua primeira prática de conduçom
(pola esquerda).
[Mãe e filha; avó e mãe]
saem quase às escuras, deslumbradas pola luz dos faros,
um pouco movidas, a piques de vir caminhando
cara a nós
Nesse momento nom tapavam a cara
e assim é que os seus sorrisos
podem arder sempre.
O poema é de Laura Ramos Cuba, da quarta geraçom de filhas e filhos da AGAL, que recebeu o magistério do Isaac através do Dicionário; a mesma que aprendeu do Martinho através do Método prático; exatamente a mesma que fijo escola com as palavras do José Luís quando o entrevistou e juntos reivindicarom um Dia das Letras para Ricardo Carvalho Calero.
Isaac, Martinho e José Luís: a força do vosso amor dá resultados magníficos!