Umha das primeiras leitoras em se incorporar ao “Desconfinamos a obra de Carvalho” é a professora Maria Do Mar Pérez Fra (Lugo, 1969), docente da área Economia, Sociologia e Política Agrária na USC; e investigadora em matéria de processos de câmbio agrário e de avaliaçom e desenho de políticas de desenvolvimento rural.
Após o primeiro encontro virtual de leitura do Scórpio, celebrado no passado dia 5 de agosto, conversamos com ela a respeito da língua, da norma, de Ricardo Carvalho Calero e desta obra narrativa, à qual voltou de novo durante o período de confinamento.
Agora, através desta janela aberta que é o Portal Galego da Língua, compartilhamos com a audiência toda este testemunho particular como estímulo para que a comunidade leitora tome também a iniciativa e una a sua voz a este movemento que procura o desconfinamento da obra deste escritor silenciado.
NEOFALANTE
Som umha neorural que se criou numha grande cidade fora de Galiza e que nom falou galego até os 18 anos. Agora, 32 anos depois, continuo tendo problemas com a colocaçom dos pronomes e empregando só 5 vogais. Som um desastre para os idiomas. De facto sempre odiei as línguas na escola.
O meu dia a dia é 100% em galego. Sem exceçons. E som mai de duas crianças que (nom sem muito trabalho por parte dos seus pais) falam galego, quando menos na casa. Emprego a norma de AGAL, na minha vida diária e também no meu trabalho.
No trabalho relaciono-me com gente do Brasil e de Portugal e mesmo dou aulas ali de quando em vez. Aulas que dou com fonética galega e nunca tive problema nemhum, salvo a curiosidade natural que suscita o meu modo de falar entre o alunado. A maior parte dos estudantes, e mesmo algum docente, ficam surpreendidos já que nom sabiam que na Galiza se fala umha língua da lusofonia (sobre todo no brasil). Algumha vez me têm perguntado se eu nascera em Cabo Verde.INICIAL REJEITAMENTO DO REINTEGRACIONISMO
Por que emprego esta norma? Pois porque como a recém neofalante integrista que era eu com 19 anos fiquei enfadadíssima com um professor da Faculdade de Económicas que empregava a norma de AGAL nas suas aulas. Decidi que ia aprender sobre a origem do galego para poder confrontar com esse “lusista”. Sentia-me ofendida por aquele home que queria reduzir a categoria do meu recém estreado idioma ao pretender assimilá-lo a outra língua com a que nada tinha a ver. Foi umha grande liçom de vida, aprendi que ler é perigoso porque pode mudar os teus preconceitos. Só 6 meses depois estava empregando eu a norma de AGAL.O GOSTO POLA LEITURA… e o Scórpio
Sobre a minha relaçom com a leitura: leio muito, durante o dia ensaio (cousas do trabalho) mas quando chego a casa leio romances basicamente. E nem sempre de qualidade. Para mim a melhor forma de quedar a dormir é com um assassinato truculento ou com um livro de viagens.
Conheço a obra de Carvalho desde há muitos anos, cheguei a ele quando estudava em Santiago. Volvi ao Scorpio no confinamento. Do que mais gosto é da descriçom tam precisa que faz da sociedade das primeiras décadas do S.XX. É bem curioso ver umha sociedade que está mui viva, cheia de gente nova e ativa socialmente e que ao mesmo tempo é tam classista e misógina. Penso que é das melhores aproximaçons a esse período histórico.