Galiza e Palestina

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O genocídio palestino segue abraiando-nos cada dia. Medram os mortos, a destruição de vivendas e hospitais, mas também de mesquitas, centros de formação e museus. Sentimo-nos impotentes para frear o ódio destrutivo do governo sionista, que não atende as razões do cessar-fogo que lhes chegam de todo o mundo. Apenas podemos solidarizar-nos e apoiar com os nossos donativos a ajuda humanitária que só lhes chega com conta-gotas. Não lhes abunda com matar mulheres e crianças com bombas, tanques e o tiro livre dos soldados, também os querem matar com a fome.

O sionismo é ódio, vingança e devezo dos territórios da velha Palestina. Uma terra milenária que foi por séculos cenário constante de conflitos; mas, sobretudo, após a formação do estado de Israel. Desde aquela foi arrombando desta terra fértil os velhos habitantes árabes musulmanos, cristãos e outros povos, que conviveram pacificamente durante séculos com os judeus –que só eram o 6% da povoação- para convertê-la no lugar exclusivo destes. O problema da destruição de Gaza não é acabar com Hamás, mais seguir com a “colonização branca” de todo o território, reemprazando a povoação indígena pelos colonos israelitas; por razões político-econômicas, mas apoiadas num blasfemo“direito religioso” a essa terra.

Muitos lembrávamos estes dias o carinho dos cristãos desde séculos atrás a esta “Terra Santa”. A terra do povo da Bíblia; com a capital Jerusalém (“cidade da paz”) e Belém (“casa do pan”); mas também Nazaré e os povos de Galileia, ao norte. A terra dos Profetas e de Jesus de Nazaré; um “vulgar galileu”, mas o Cristo, o “Príncipe da paz”, que morreu assassinado na capital pelo ódio dos dirigentes religiosos do seu povo, com o beneplácito do império romano e a xenreira do povo ao que tanto amou.

Os católicos nacionalistas galegos do geração “Nós” gostavam de comparar aquela querida Palestina da Bíblia com a Galiza amada. Duas terras nas quais viam muitas semelhanças: extensão (arredor dos 30.000 km2), geografia (muita terra fértil com montes e vales, e muito mar), uma cultura milenária… e mesmo uma língua própria falada pela maioria do povo, o arameu e o galego, mas discriminada por uma língua oficial, o hebreu e o castelhano. Jesus de Nazaré era “um homem que falava arameu”. Salientan nisto R. Otero Pedrayo e, sobretudo, V. Risco: “Ambos [judeu e galego] son pobos oprimidos, predestinados a un lugar –Palestina nos primeiros e Fisterra nos segundos-, padecen o fado da emigración… (“Pensamentos encol da fe e mais da cultura”, Logos 18,1932).

Palestina foi chamada na antiguidade Canaã; ocupada pelos filisteus e os fenícios desde finais da Idade de Bronze. O mito bíblico conta que esta foi a “terra prometida” a Abraham, que foi conquistada belicamente pelos israelitas, que teriam fugido da escravitude sw Egito num épico êxodo pelo Mar Vermelho, e logo vivido décadas no deserto. As histórias que conta a Bíblia da conquista de Canaã (Josué 1-12) são tremendamente violentas; mesmo até receber de parte do seu deus a ordem de exterminar á povoação das cidades conquistadas, para não misturarem-se com os seus cultos e cair num sincretismo, ao que se opunha um Yhaveh cioso da sua primazia absoluta, como quedara claro no Éxodo: “O que ofereça sacrifícios a outros deuses, fora do Senhor, será exterminado” (Ex 22,19). O povo judeu sentia-se desde a sua fundação um “povo elegido” pelo único Deus, para ocupar e viver nessa terra “que mana leite e mel”. Esse território, inicialmente unido na monarquia de David e Salomão, dividiu-se logo nos reinos do Norte (Israel) e do Sul (Judeia); viveram historias diferentes mas sempre cheias de enfrentamentos e violência; dentro pelas lutas de poder, e cara a fora pelos diversos impérios que o ocuparam e arrasaram.

O povo judeu sempre foi violento e belicoso; na antiguidade até as guerras contra o império romano. Com a auto-imolação de Masada e a última destruição de Jerusalém no ano 70, teve que ir à diáspora, repartindo-se nos diversos estados europeus; foi perseguido na Espanha dos Reis Católicos, logo na França e no resto dos países de Europa, e quase exterminado pelo anti-semitismo nazi. Esse espírito belicoso e vingativo, afogado por séculos, reviviu nos últimos setenta anos; mesmo reproduzindo o acontecido com eles no genocídio nazi.

Afortunadamente, há muitos judeus de bem, mesmo entre os mais ortodoxos, que não compartem esta violência sionista; uma violência que está a gerar em todo mundo um novo sentimento anti-semita. “O sionismo arderá no inferno”, líamos numa manifestação de judeus ortodoxos em Jerusalém. Com tanta morte inocente não se pode construir um futuro com o devecido shalom bíblico.