Há livros bons, há livros melhores, há livros necessários. E depois estão os imprescindíveis.
Não estou segura de onde colocar este dos feminismos e a LIJ galega mas, na minha condição de feminista e mestra e escritora e crítica, aí lhe anda, entre os necessários e os imprescindíveis.
Feminismos e literatura infantil e xuvenil en Galicia é um resumo/síntese da tese de doutoramento de Montse Pena Presas. O objetivo do seu trabalho é revisar a crítica feminista à LIJ e comprovar se esta deixou pegadas no sistema literario galego. A autora faz un recorrido desde os inícios na Galiza dos dous campos: o dos estudos feministas e o da produção de literatura infantil e juvenil, analisando se há ou não influências e relações entre esses dous espaços. Para isso recorre à clássica periodização cronológica, estabelecendo etapas desde a década de 20 do século passado até a atualidade.
Montse Pena estuda dous mundos marginais, não heterodoxos, nos seus respetivos campos: o feminismo entre as ideologias e a LIJ no sistema literário. E no recorrido que faz para nós, vemos como essa marginalidade fica refletida na ausência de visibilidade, mesmo no ocultamento, das suas respetivas achegas à cultura galega.
Montse Pena estuda dous mundos marginais, não heterodoxos, nos seus respetivos campos: o feminismo entre as ideologias e a LIJ no sistema literário. E no recorrido que faz para nós, vemos como essa marginalidade fica refletida na ausência de visibilidade, mesmo no ocultamento, das suas respetivas achegas à cultura galega.
Na primeira parte do livro, na que para a analisar a existência de crítica literária infantil desde os movimentos feministas, damos com duas mostras deste silenciamento: a ausência de bibliografia sobre o tema, de materiais críticos, e de corpus de obras sobre as que trabalhar. Trabalho que deve fazer a autora se quer pesquisar, pois (quase) nada antes. Porque o movimento feminista houve de mover-se nas margens, fora dos espaços académicos e, só por isso, pode parecer que não existiu. Mas rastrejando as suas pegadas nas revistas da época, transcende a existência, sim, de grupos de mestras a trabalhar por boa parte do território na elaboração de materiais coeducativos e mesmo de materiais literários.
E vem aí a segunda mostra: as mulheres escrevemos literatura bem antes do que as academias e as histórias literárias oficiais marcam, só que estas unicamente atendem a literatura adulta, esquecendo a pensada para crianças que, igual que as mulheres1, entra dentro do campo da não-literatura. E assim, Montse Pena recupera os nomes das pioneiras e adianta anos o aparecimento de autorAs no sistema galego. Onde as histórias literárias académicas dão espaço às mulheres nos inícios do século XXI, Pena Presas coloca-nos o Pericles e a balea de Xohana Torres como título pioneiro, e dá conta da entrada doutras mulheres no sistema (Sabela Álvarez, Gloria Sánchez, María Victoria Moreno, Fina Casalderrey…).
Montse Pena recupera os nomes das pioneiras e adianta anos o aparecimento de autorAs no sistema galego. Onde as histórias literárias académicas dão espaço às mulheres nos inícios do século XXI, Pena Presas coloca-nos o Pericles e a balea de Xohana Torres como título pioneiro, e dá conta da entrada doutras mulheres no sistema (Sabela Álvarez, Gloria Sánchez, María Victoria Moreno, Fina Casalderrey…).
E este é outro dos elementos dos que gostamos na obra: a proposta de básicos, dum cânone de literatura infanto-juvenil feminista, arriscando a fazer uma proposta de obras fundamentais que nos podem servir de guia a mestras, bibliotecárias e todo tipo de mediadoras. Só por esta proposta, com obras recuperadas2, obras reivindicadas3, obras reinterpretadas, devera ser livro de leitura obrigada para todas as mestras, bibliotecárias e mediadoras que no mundo somos.
Nesta seleção crítica de obras vamos comprovando outra das hipóteses de Montse Pena: o movimento feminista sim influiu na literatura infantil e juvenil galega, mais qualitativa que quantitativamente, e achamos que para bem: diversificação de temáticas, presença de protagonistas femininas, subversão de roles tradicionais, e em especial, a conceção da produção literária como um espaço ético. A primeira achega do feminismo foi introduzir a leitura crítica das obras LIJ hegemónicas, evidenciando a ideologia submersa (e nem tanto) nelas, para no seguinte passo, oferecer textos alternativos, com perspetiva de género e fundo ético. Como acontece com a literatura para adultas, comprova Montse Pena como muitas das autoras que seguiram esse caminho foram desprezadas por “ideológicas”, incidindo nessa falsa dicotomia entre hegemónico/masculino/neutro vs. marginal/feminino/ideologizado.
Feminismos e literatura infantil e xuvenil en Galicia não só oferece uma panorâmica histórica sobre as relações entre a LIJ galega e os feminismos que permitem perceber melhor o presente do sistema literário, mas faz também apostas de futuro. Quer dizer, a autora fecha a obra com toda uma proposta de roteiros de estudo e crítica, vias de pesquisa possíveis e potenciais, que marcam a riqueza desta simbiose entre essas duas margens, que na suma, fazem centro.
Retifico. Sim estou segura: imprescindível.
Montse Pena Presas:
Feminismos e literatura infantil e xuvenil en Galicia.
Laiovento 2018.
1Reduzidas em múltiplas ocasiões a não-homens.
2Sinto, tenho que citar A pequena aventura do Oscariño, de Gloria Sánchez, lembrado tantos anos após.
3Penso n’O segredo da Pedra Figueira de María Xosé Queizán.
[Este artigo foi publicado originariamente na Sega]