Rimas assonantes só nos pares

Partilhar

Grande respeito tive sempre por Yolanda Castaño. Admiro-lhe a capacidade de construir o seu ofício1: poeta. Porque é certo que o espaço que ela ocupa na literatura galega [quase] não existia quando chegou. Uma trajetória de mais de trinta anos a ligar trabalho poético e dedicação laboral. Sempre a considerei entre aquelas que mais defenderam a dignidade das poetas enquanto autoras e sempre senti nela uma mão tendida às que chegamos atrás. Por isso era grande o meu interesse em ler-lhe o ensaio Economía e Poesía. Rimas internas

Nele parte dessa sua experiência de mais de trinta anos para reflexionar sobre o processo de profissionalização do ofício poético e dos danos e perdas que isso traz consigo. A própria autora adverte da complexidade do assunto e convida a superar “rancias dicotomías que reducen a realidade” (pág. 70). Porém, li e o que percebi foi isso: uma falsa dicotomia desenvolvida durante toda a narrativa deixando de banda parte das questões que outorgam complexidade ao tema. 

Admito, primeiro de todo, que me senti diretamente interpelada pola autora: faço parte dessas poetas com outra profissão e que ganham mais de dous mil euros ao mês (pág. 91). Sou consciente desse meu privilégio económico: nesta etapa da minha vida a preocupação por contar com dinheiros para pagar vivenda, internet, livros, transporte ou alimentos não me ocupa a mente, que podo libertar para ler, mesmo ensaios, e escrever, mesmo recensões. Se podo redigir este texto é porque tenho um bom trabalho que me permite umas férias em que relaxar pensando em economia e rimas. Não é o caso de tantas companheiras. Desde aqui escrevo. Vaia por diante.

Se podo redigir este texto é porque tenho um bom trabalho que me permite umas férias em que relaxar pensando em economia e rimas.

A falsa dicotomia que percebi na leitura foi a de confrontar por uma banda poetas que nos desenvolvemos profissionalmente noutro espaço e poetas dedicadas em exclusivo à escrita, vivendo dela. Dentro dessa dicotomia, sem atender à variedade de vicissitudes que podemos encontrar nela (não é a mesma a minha situação, com trabalho estável por conta alheia, que a de María Reimóndez, por exemplo, tradutora e intérprete por conta própria), indica-se que o primeiro grupo, assim como em bloco, não exige o pagamento do seu trabalho poético fronte ao segundo, que precisa desse pagamento para viver. Não parece haver aí diversidade, ou arre ou xó. Não há, parece, autoras que reivindiquem a dignidade do ofício ainda que contem com outro sustento. Ademais, parece estar ela sozinha na luita. E não é assim. Como indiquei no início, muitas aprendemos do trabalho dignificador de Yolanda Castaño (et alii.), e pode que há quinze anos não lhe déssemos importância ao feito de cobrar ou não um recital, um texto para uma revista, mas hoje em dia temos claro que isso deve ser assim. Neste sentido a sensação na leitura é que na experiência da autora nem passou o tempo nem houve evolução no sistema literário. Os exemplos e anedotas que proporciona para justificar as suas argumentações estão quase sempre desligados de contexto (quando e onde se deram) polo que tanto podem ter acontecido em 1995 como em 2023. Mas na realidade sim houve mudanças. A autora, por exemplo, cita a sua participação em um festival «“popular”, “solidario”, “militante”, “divertido”, “reivindicativo” (…/…) que “teima em apelidarse “de poesía”» (pág. 47). Deduzo que se refere ao Festival de Poesia do Condado. Narra a sua experiência negativa nesse festival com as diferenças entre as músicas, bem tratadas profissionalmente, e a poesia, não remunerada e relegada a tempos mortos. Procuro na rede e vejo que a sua participação foi em 2002. Anos mais tarde tocou-me a vez, recém chegada ao mundo poético. Eu lembro ter cobrado pola minha intervenção. Imagino que graças ao trabalho feito por poetas que antes foram. O mesmo acontece com as editoras. Todas, insisto, todas as minhas editoras, fora a da primeira obra, pagam pontualmente direitos de autoria e estabeleceram comigo relações contratuais dignas. Outra vez graças ao trabalho feito por poetas que antes foram. Acho que todos os convites que tive para eventos poéticos ou júris de prémios nos últimos anos traziam consigo a remuneração da participação. Porém, se atendemos ao ensaio Economía e Poesía. Rimas internas, nada mudou desde esse 2002. Nesse sentido o livro parece-me antigo, necessário há quinze anos, quando eu começava na escrita, extemporâneo agora.

Os exemplos e anedotas que proporciona para justificar as suas argumentações estão quase sempre desligados de contexto (quando e onde se deram) polo que tanto podem ter acontecido em 1995 como em 2023. Mas na realidade sim houve mudanças.

No ensaio adjudicasse-nos às poetas não profissionalizadas uma conceção da poesia mitificada, baseada na inspiração e colocada fora do espaço e do tempo histórico (pág. 45). Apõe-se-nos como razão para nos refugiar2 noutras profissões a consideração da poesia como uma arte que não pode contaminar o bilhete de banco, o cheque, a tarifa marcada. Umas poetas boémias e inocentes que acreditam na pureza do verso e a virgindade da arte. Acho que não é o caso de quase nenhuma de nosoutras3. É mais, para muitas de nós, o feito de contarmos com outra profissão tem que ver com o contexto histórico, social e político em que vivemos. Coladas absolutamente à realidade, nem mais nem menos. O contexto ausente na obra de Yolanda Castaño. 

Decidi fazer tentativa de ser poeta e publicar quando já tinha estabilidade económica. Decidi fazer tentativa de ser poeta e publicar porque tinha estabilidade económica. Ou isso ou renunciar à minha liberdade criativa. Confesso: sou reintegracionista. Podo viver da escrita usando nh’s? Tenho claro que não. Sou realista. A maioria dos prémios literários que ganhou Yolanda Castaño (com os consequentes ingressos pecuniários) estão vedados a autoras coma mim. Uma fonte de ingressos possível menos. A rede de bibliotecas públicas não compra os meus livros porque seique não escrevo em galego. Menos acessibilidade das leitoras à minha obra e menos possibilidade de eventos em que participar. As editoras com mais presença no mercado editorial galego não publicam as minhas obras. Tenho obra infantil inédita, porque às crianças pode rebentar-lhes o cérebro se leem um ç. Ter outro trabalho é a única maneira de eu manter as minhas ideias e publicar. É uma escolha. Consciente. Em absoluto romantizada. 

Decidi fazer tentativa de ser poeta e publicar quando já tinha estabilidade económica. Decidi fazer tentativa de ser poeta e publicar porque tinha estabilidade económica. Ou isso ou renunciar à minha liberdade criativa. Confesso: sou reintegracionista. Podo viver da escrita usando nh’s?

Ainda mais: sou escritora post-prestige. Vivi o movimento Nunca Mais desde a base do associacionismo, não como poeta. Porém fui testemunha do tratamento institucional recebido polas artistas diretamente implicadas na sua direção: a censura e o ostracismo. Falam algumas das protagonistas no documentário Suso. Fóra de lugar. Eu decidi ser poeta porque tinha outro trabalho e era essa a maneira de exercer a minha escrita em liberdade, sem depender de censuras institucionais ou políticas. Poder posicionar-me com defende à galega, contra o feche do diario cultural ou contra Altri sem temer polos dinheiros para pagar vivenda, internet, livros, transporte ou alimentos. É uma escolha. Consciente. Em absoluto romantizada. 

Porque uma das grandes ausências no ensaio de Castaño é a política. A política de partidos. O governo. A Conselharia de Cultura. Praticamente até a página 110 o livro desenvolve a ideia dicotómica de que somos as autoras com outra dedicação laboral e as associações / instituições promotoras de atividades as que pomos obstáculos à profissionalização das poetas, umas por não cobrar, outras por não pagar. É nessa página que se oferece uma pista sobre um elemento básico, porém não se desenvolve: «Dende finais dos noventa ata arredor do ano 2007, o crecemento económico alíase cun paulatino desenvolvemento das industrias culturais e do lecer, cunha incipiente ilusión de normalidade na nosa língua (e cultura) e polas -máis proclives à mesma- políticas do fugaz bipartito» (pág 114. itálicos da minha responsabilidade). Indica a autora que foi nessa época em que maior empreendimento se deu entre as poetas para procurar um caminho laboral de seu. As políticas dos governos facilitam ou bloqueiam as iniciativas sociais, culturais. Os governos guiam / cegam a cidadania4. E não há reflexão sobre isto. Indica a autora que as novas gerações estão “liberadas de poses románticas” mas que “nas opcións de vida, o pragmantismo rendido a unha evidencia: de novo intentar o funcionariado volve revelarse como a máis recomendable e segura das alternativas” (pág 115, itálicos da minha responsabilidade). Porém, não considera como possível evidência contarmos com um governo hostil à cultura galega, que censura autoras e coletivos, que gere a res publica como uma leira privada submetida à arbitrariedade caciquil. E não considera isso razão para algumas escolhermos outros caminhos na escrita. Parece assim arremessar pedras contra as outras davidas, deixando o enorme goliat sentado na sua cadeira de braços, tranquilo e invisível. 

Porque uma das grandes ausências no ensaio de Castaño é a política. A política de partidos. O governo. A Conselharia de Cultura.

Outro elemento que me ranxe na escrita é a ausência de companheiras. Aparecemos citadas, em feminino, de maneira coletiva ou anonimizada quando são descritos comportamentos inadequados pola nossa parte (participar em eventos sem cobrar, não queixar-nos das condições injustas por não dar problemas5). Essa citação em feminino resulta-me problemática. Feminiza-se a crítica sem achegar uma análise com perspetiva de gênero6: os poetOs cobram e as poetAs não? São as poetAs as que sempre cedem? São mais pressionadas para ceder? Que questões estruturais influem nisto? Inncomoda-me, ademais, na leitura, a renúncia da autora a exercer de exemplo de ação. Ela mesma fala de que a via profissional, para as poetas, tem que ser quando menos uma possibilidade (pág. 80). E defende isso Sara Ahmed (nosoutras com ela): Os sistemas dominantes fazem com que muitas cousas sejam impossíveis. Temos que pelejar pola possibilidade. Temos que pelejar para alguma de nosoutras ser possível7. Porém, a retórica do ensaio instala-se na reprimenda. Onde eu aguardava uma grande poeta mostrando como deu chegado aonde está, oferecendo chaves para quem se queira iniciar no caminho da profissionalização, advertindo de erros possíveis e assinalando potencialidades por explorar8, dei com um descargo de reproches que, de ser eu a noviça que pensa em se dedicar ao ofício, me levariam direta aos temários da oposição do que for. Aquela desvinculação temporal de que falava no início contribui a isso, pois faz parecer que em trinta anos nada mudou. Contribui também a enunciação na primeira pessoa do singular, sem lugar para ninguém mais que a autora, e sem mais experiências que a própria, aparecendo-se como um iceberg no meio do oceano, como profeta no deserto9. Não há em Economía e poesía. Rimas internas outras poetas de ofício, e se as há, não têm nome10: Estíbaliz Espinosa, María Lado, Lucía Aldao, Silvia Penas, Nuria Vil, Antía Otero, Dores Tembrás, por dar alguns exemplos, não aparecem referidas11. Vem-me à cabeça o Reverso, de Uxue Alberdi, em que, para analisar a discriminação de género no bertsolarismo, trabalha a partir de entrevistas feitas ao resto de companheiras, enriquecendo assim as suas impressões pessoais. Se algo do estilo fez Yolanda Castaño, não o enuncia. 

Quando um ensaio assenta de maneira tão forte na questão de cobrar ou não cobrar, do diletantismo de umas, da mal entendida generosidade das mesmas, acho importante incluir na equação o artivismo. Colocar toda a atividade não-cobrada na mesma sacola, sem estabelecer diferenças, parece-me erro. Precisamente acho que aí é onde deve estar a reflexão naquelas que vivemos no privilégio de contarmos com outro trabalho: quando podemos oferecer o nosso trabalho poético de balde?, a quem?, para quem?, estão ao mesmo nível o Consello da Cultura Galega e o Clube de Leitura das vizinhas de Cerdedo12? Para isto há só quatro linhas (pág. 165), quando me consta que a autora bem sabe do tema, pois contribuiu durante anos a gerir o Implícate, de Implicadas no Desenvolvimento. 

Colocar toda a atividade não-cobrada na mesma sacola, sem estabelecer diferenças, parece-me erro. Precisamente acho que aí é onde deve estar a reflexão naquelas que vivemos no privilégio de contarmos com outro trabalho: quando podemos oferecer o nosso trabalho poético de balde?, a quem?, para quem?, estão ao mesmo nível o Consello da Cultura Galega e o Clube de Leitura das vizinhas de Cerdedo12?

O artivismo consiste em fazer da arte intervenção política. Escrevo isto para o web d’A Sega, espaço que construímos sobre os nossos ombros, os nossos corpos, os nossos tempos, as autoras que o promovemos. Consideramos esta uma ação necessária à que não encontramos cabida nos canais institucionais do sistema literário. Não vemos que promovam a crítica feminista. Porém, acreditamos na possibilidade. E levamos adiante para visibilizar essa possibilidade. Pode haver algo mais que o ego, a vaidade ou a procura da visibilidade quando decidimos fazer algo sem cobrar. Porque a questão do artivismo leva-nos a outra: É toda a poesia possível no espaço económico? Aceita o espaço económico a diversidade? Pagaria alguém esta recensão (extensa de mais para os parâmetros industriais)? Cabe no Fugas de LavozdeGalicia? Deixo de escrevê-la porque ninguém paga? 

Yolanda Castaño previne-nos durante toda a narrativa sobre a romantização do trabalho poético, porém o que percebo eu é a romantização da profissionalização: as autoras que temos outra dedicação laboral temos que reservar-lhe à escrita as horas da insónia, os restos do lazer, sem tempo para reflexionar e meditar, e acabamos por oferecer obras medíocres e pouco trabalhadas (págs. 65, 93). É na dedicação a tempo completo onde aparece a inovação, o enriquecimento poético, a abertura de mente13. Porém a autora obvia a necessidade de um espaço mental, de um tempo mental. Das minhas conversas com Nuria Vil, a frase dela que mais ressoa em mim é a de “a ver quando podo ter vagar para escrever”, porque o seu tempo todo esvai entre os dedos do pensar em pagar autónomos, faturas, o carro e em gerir projetos para ganhar os seus dinheiros. Fala disto Yolanda Castaño. E com isso vira em falácias essas afirmações sobre a qualidade da escrita. Nessa romantização elidem-se os trabalhos alimentícios14: participar em eventos de pouco interesse artístico porque há que comer, colaborar com certos poderes porque há que pagar autónomos, legitimar com a nossa obra, o nosso nome, o nosso caudal simbólico, ações que nunca legitimaríamos de não ser a fatura da luz. 

E aí outro elemento sobre o que não há reflexão. Estabelece-se uma dicotomia irónica entre “anticapitalistas” (pág. 66) e poetas conscientes do sistema económico do que fazemos parte. A dicotomia. Apocalíticas ou integradas. Sem ponto meio. E novamente elidem-se questões. Porque o capitalismo cá está entre nós, sim. Mas tem perigos que não se nomeiam, e merecem ser referidos: um o já indicado acima do quê o capital está disposto a pagar. O outro, opoetwashing15: lavar com a nossa obra, com a nossa participação em eventos, como o nosso nome, ações, instituições ou empresas que fraco favor estão a fazer à cultura, em geral, à cultura galega, em particular, ou mesmo que atuam à contra. E que, sem embargo, pagam. Este risco deveria ser considerado no ensaio. 

Ao tempo, colocar-nos no mercado, o tempo todo no mercado, faz que a autora ignore (propositadamente ou não) a existência da comunidade. Do comum. Das redes associativas, de afetos, de solidariedade, às que muitas, ademais, devemos o que somos. Como vou cobrar uma atividade à ACD Dorna (por pôr um exemplo), se aí pude aprender todo o que sei sobre navegação tradicional16 e escrever depois a noiva e o navioAssim tenham dinheiros para me pagar. Nunca lhes cobrarei. Porque não quero. E essa é uma escolha. Consciente. Em absoluto romantizada. E absolutamente legítima17.

E chego ao elemento que mais me incomodou na leitura: a elisão por parte de Yolanda Castaño dos seus privilégios. Entre as anedotas que acompanham as argumentações da autora, há duas para mim bem significativas: em uma cita ao conselheiro de Cultura (qual?, não se sabe, des-contexto espaço-temporal) em uma conversa privada com a autora (pág 168); na outra, páginas depois, fala de uma reunião informativa em uma casa que resulta ser a Moncloa (pág.174). Um parágrafo para cada exemplo. Assim coma quem. Como se todas as poetas deste país tivéssemos acesso direto ao conselheiro ou ao Palacio de la Moncloa. No início do livro cita uma entrevista em um “dos sete xornais de maior tiraxe en España” (pág. 63), de resultados falidos. Como se todas as poetas tivéssemos acesso a entrevistas em LaVozdeGalicia. Yolanda Castaño é uma das poetas mais conhecidas e reconhecidas da Galiza. Isto proporciona-lhe um poder simbólico bem alto que facilita o acesso a espaços, meios e dinheiros18. Não nomear este seu privilégio prejudica a narrativa, pois o tom irónico e retranqueiro com que descreve ações que considera inadequadas (exercidas por companheiras) chega a parecer condescendente, quando não cínico. Quantas companheiras podem marcar as tarifas que ela tem? Quantas companheiras recebem as propostas que ela recebe? Quantas somos convidadas a ler pregões, a ser mantedoras de atos literários? Que fazemos as que não saímos na TVG nem em Lavoz para dar a ver as nossas obras? A autora pede no seu livro argumentações menos “nesgadas”, não levadas por ser parte interessada na cadeia do livro ou por ser poetas que ganham(os) mais de dous mil euros (pág. 91). O risco não está na posição que ocupamos no sistema, mas em não a ter em conta. E acho que Yolanda Castaño não o faz em várias ocasiões. 

É por todo isto que essas rimas internas que procura a autora no ensaio, me pareçam assonantes: há versos que rimam com aquilo que eu opino (dignificar o ofício, receber pagamento justo polo trabalho, não precarizar o labor das poetas) e outros que não casam, porque há palavras que não soam, que não são nomeadas.

Yolanda CastañoEconomía e poesía. Rimas internas. Editorial Galaxia, 2024

1 Nas aceções 1 a 3 do dicionário: 

1) Qualquer arte manual ou mecânica.(2) Cargo ou emprego.(3) Profissão. ≃ dignidade.   https://www.estraviz.org/of%C3%ADcio

2 Só se concebe a nossa dedicação a outra profissão como um refúgio, sem considerar outras razões, mesmo o interesse, para a escolha: “As poetas silencian as súas necesidades, migran cara a traballos remunerados que non as forcen a reclamaren o propio,…” (pág. 72, itálicos da minha responsabilidade) 

3 Não a daquelas que fazem parte das minhas redes de trabalho e afetos.

4 Falando da sua própria trajetória a autora afirma que conseguiu forjar uma carreira “dun xeito moi persoal e medio fortuíto: non grazas a plans estratéxicos impulsados con siso por administracións que me amparen” (pág. 110), porém, outra vez, não afunda nesta questão senão que aproveita para reprochar-nos às companheiras a nossa pouca solidariedade gremial. 

5 E vou lendo exemplo trás exemplo e sinto-me como a judas das poetas: e será por mim? Negaria eu três vezes, e mais, o ofício?

6 Insinua-se na página 83, no epígrafe Sospeitosos Parecidos, porém para responsabilizar às poetas de deixar que a poesia faça parte dessa carga de trabalhos não remunerados, como os cuidados ou a criança. 

7 Sara Ahmed: Manual de la feminista aguafiestas. Caja Negra Editora 2023, pág 221 (tradução da minha responsabilidade).

8 Cousas todas que me consta que Yolanda Castaño faz de maneira pessoal.

9 No epígrafe Predicar no deserto enuncia em positivo, mas desde a individualidade mais absoluta, ressaltada no título (pág. 108).

10 Estamos no de sempre: se não se nomeia, não existe.

11 Outra reflexão com perspetiva de género ausente: por que as que conseguem viver do ofício são elas? 

12 Cito a última atividade que fiz de balde.

13 Vou cometer a soberba de referir a minha própria obra para refutar tais afirmações.

14 Considero-os necessários para quem quer fazer da poesia (da arte) profissão, e nunca os critiquei em uma companheira, mas devem aparecer na listagem do deve e do haver.

15 Adoramos inventar palavras: criamos esta em paralelo ao conceito de greenwashing.

16 Da mão de marinheiros que depois da sua jornada laboral continuam a exercer de balde, ou a custo simbólico, para nos aprender.

17 E, ao pensá-lo, já me sinto um pouco menos a judas das poetas.

18 Não afirmo que não mereça, também eu ganhei merecidamente a minha vaga de docente de secundária e isso não oculta o privilégio do salário fixo.

Máis de Susana Sánchez Arins