Cara à escravidão

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Por Heitor Rodal Lopes

Nestes dias de soçobra económica e coletiva, acho que não é preciso ser fino como um rato para perceber para onde é que se está a caminhar realmente.

Durante estes últimos anos, e apesar da  crise, os lucros empresariais em conjunto cresceram, mas essa mesma crise serviu e serve para impor governos antidemocráticos, tecnocráticos e corruptos como na Grécia e na Itália [e também na Espanha] e para igualar qualquer direito laboral ou social existente em qualquer lugar do mundo ao nível dos que possuem -“desfrutam”- a cidadania e os trabalhadores doutros competidores globais com níveis mais baixos, como a China (veja-se aqui e aqui).

Nada importa com que inúmeros economistas e especialistas fora ou ao margem do ‘stablishment’ oficial estejam a mostrar com dados um dia sim e o outro também que as políticas de simples restrição económica aplicadas à população em geral só levam para uma maior crise, desemprego, etc.; que demonstrem que a baixa de soldos progressiva e a suba dos preços associada (vivenda, alimentação, serviços, ..) produzida nos últimos anos só pôde ser compensada com a concessão às famílias de créditos duvidosos, por não chamá-los diretamente suspeitosos e impossíveis de retornar na prática, para que pudessem ‘financiar’ e equilibrar o seu ‘défice’… à custa de ficarem encadeadas a dívidas bancárias perpétuas e de hipotecar o seu futuro e o dos seus filhos.

Tampouco importa que assinalem com dados contrastáveis a falácia de que abaixar o salário mínimo interprofissional (SMI) vai afavorar a criação de emprego: enquanto os diretivos políticos e empresariais competem por salários, retribuições e compensações mais altas -mesmo nos casos em que ‘conseguem’ a falência dos seus Estados e empresas- os trabalhadores, catapultados ao mercado mundial sem restrições e à globalização universal da miséria, veem-se cominados a competir descarnadamente entre si polos salários mais ínfimos para “melhorarem a competitividade” …entre eles próprios! É assim que, os países da Europa com o salário mínimo interprofissional mais baixo -Espanha, Portugal, Grécia-, são os países com maior taxa de desemprego e os países com o salário interprofissional mais alto -Holanda, Alemanha, Finlândia- são os que menos desemprego padecem (veja-se aqui e aqui).

E há ainda nisto um segundo movimento de clara hierarquização do poder económico mundial: o capital espanhol já absorveu qualquer enteléquia de poder económico regional autónomo “galego” (Fenosa, Banco Pastor, NovaGalicia Banco …) e agora esse capital espanhol é chamado a se colocar pola sua vez no lugar hierárquico reservado para ele pola oligarquia mundial (aqui e aqui).

Achamo-nos nisto mais uma vez no que constitui ao meu ver uma autêntica e muito nociva usurpação da soberania popular e, nomeadamente, a das populações locais por parte das elites político-financeiras internacionais auto-nomeadas, retro-alimentadas e autojustificadas (veja-se aqui).

Certamente, e mesmo havendo com certeza saídas possíveis e melhores fora deste sistema, enleados e distraídos como andamos -e nos mantêm- em pequenas e ruins lideiras partidárias, desportivas, futebolísticas … , fico estarrecido com a baixa movilização e contestação que está a produzir isto entre a população. Na minha opinião aqui não vale transacionar nada com o sistema, como talvez poderia ser feito noutros temas. Por resumir brevemente, concordo ao 100 % com a cidadania grega silenciada pola imprensa internacional que se está a se manifestar nas ruas [“violentamente” (sic)] contra a tecnocracia golpista imposta pola UE contra a vontade popular e adiro igualmente ao 1000 % às palavras de James Petras (veja-se aqui).

Antes que cara à escravidão acho que era melhor caminharmos cara à insurreição.

Máis de Heitor Rodal