Dualidades e bipolaridade

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Caro Paulo,

Envio-te, esta mensagem para que sirva como ampliaçom ou apêndice do artigo intitulado “Carballo Calero/ Carvalho Calero” e publicado no Faro de Vigo, já que tenho certas dúvidas e umas perguntas para o senhor José Luís Méndez Ferrín. Neste texto recebe o estudioso Ferrín umha desafortunada e infeliz pergunta: Como escrevermos o nome do senhor Carvalho Calero? Bom, no artigo o senhor Ferrín –ao que chamamos polo segundo apelido, à portuguesa–  tenta traçar uma diacronia vital para concluir afirmando que o que importa é o começo da história e nom o final.
Eu, como som um neno de aldeia e pouco sei, tenho mais algumhas perguntas para o senhor Ferrín. Se gosta tanto de analisar diacronicamente, como é que com as normas da nossa língua atende mais a umha sincronia tecnocrática do que a umha diacronia historicista? Se o mais importante é a quantidade de tempo que Carvalho assinou como Carballo, como pode ser que o iberorromance ocidental, com mais anos do que o oficialismo tecnocrático, tenha umha soluçom administrativa totalitarista antes do que a reintegracionista segundo o seu raciocínio? Como pode ser que disserte sobre “ideologias lingüísticas” o separatismo enxebrista autárquico tentando branquejar a sua condiçom e posiçom sistémica? Como última pergunta: Se alguém galeguiza o seu nome ou apelido seguindo as normas tecnocráticas tem algum valor de futuro ou continuamos a denominá-los polas formas anteriores?
Repare em que “galeguizar” tem o sentido de recuperar o que é de nosso segundo o galeguismo em que Carvalho militou e não em aplicar métodos tecnocráticos para desvirtuar o que, em grande honra, fai parte da nossa história. Ora bem, desculpe este pequeno asteta por tamanha ventura de questionar o que o título nobiliário da sagrada instituiçom académica acredita, mas os que ignoramos os desígnios burocráticos temos de ler a fórmula legislativa, o preceito regulamentar, e ainda deste jeito nom compreendemos bem os termos em que se exprimem os adeptos da doutrina chanceleresca do sagrado Impaís.
Finalmente, achamos –em resposta nom requerida ao senhor Fernández–, que se umha pessoa muda o seu apelido, ainda que só forem um par de letras, merece que se respeite a sua última decisom. Resta dizer que se está morto, como é o caso, nom vai responder a perguntas que teriam de lhe ser formuladas a ele diretamente, ainda que nesta ocasiom tenham umha óbvia resposta. Carvalho nom mudou de parecer de um dia a outro, nom foi abduzido por entes sobrenaturais nem um apóstolo predicador da única e sacra doutrina linguística galeguista. Carvalho foi a pessoa mais lúcida e coerente de quantas pisaram o chão desta nossa terra e da Santa Inquisição Académica Galega. Foi desde 1973 que Carballo começou a mudar para Carvalho, quando Lapa escreveu na revista lisboeta Colóquio/Letras nº13 e também quando Piñeiro desde Grial se exprimiu contra o professor português por interpretar erradamente as suas palavras.
Despedimo-nos do senhor Ferrín acompanhando-o num dos seus desejos nom cumpridos, que nom lhe dedicassem o Dia das Letras ao senhor Carvalho. Muitos achamos vergonhento que umha instituiçom que lhe deu as costas, que o isolou e que desmereceu o trabalho de toda umha vida pola Galiza e o galego, tenha o direito de subir no púlpito o corpo queimado da caça de bruxas após tantos anos de abafante cheiro a carne torrada. Ora, mais vergonhento é queimar alguém por bruxaria, ressuscitá-lo e insinuar que foi queimado por outra razom. Sejam valentes, ainda que seja só umha vez na vida, e utilizem o nome do sacrificado tal e como figura nos seus últimos escritos, o seu testamento.

Saudações, Balbino

PD: A julgar pelas vezes que aparece o seu nome como José Luís em artigos de El Correo Gallego, diversas publicações e até nas Eleições ao Parlamento Europeu de 7 de junho de 2009. Não sei se me dirigir ao senhor como José ou Xosé. Paulo, podes-me ajudar com esta dúvida?

 

Obrigado pela tua mensagem, caro Balbino,

Acho que as tuas dúvidas fazem bastante sentido, pois indicas diversas incoerências na forma de atuar do senhor Ferrín. Pouco posso acrescentar ao que tens mencionado e tampouco tenho conhecimento de quando utiliza o escritor Ferrín a forma José e a forma Xosé e em que textos, contextos ou situações. O que sim posso afirmar após estudar textos de Carvalho, é que é coerente. Primeiro analisa, estuda, e depois leva à prática o estudado. Isto pode ser aplicado ao seu lavor como docente ou como estudioso da língua e da literatura. As teorias linguísticas que seguia levaram-no a ajeitar o seu apelido à norma que utilizava, do mesmo modo em que foi corrigindo a sua forma de escrever desde os seus primeiros escritos em galego da década de 20 até os da década de 80.
Que Carvalho tenha mudado a grafia do seu apelido é obviamente consequência da sua evolução quanto a conhecimentos sobre a língua. Uma evolução que se pode apreciar facilmente na antologia que acabamos de publicar em Através. Nesta, podemos ver como é a grafia nos quatro volumes que compõem quase a totalidade do livro e mesmo comprar com os três poemas que foram excluídos e que mantém a escrita primeira. Eu próprio tenho analisado esta evolução na minha tese de fim de grau, onde faço uma edição crítica do seu poemário Anjo de terra. Carvalho evolui, não muda porque alguém lho diga em determinado momento, isto, acho, é ridículo. Só há que ler os seus artigos sobre sociolinguística para compreender o pensamento do senhor Ricardo. Aliás, pode ler o artigo1 do Martinho Montero Santalha para sair de dúvidas.
Em definitiva, faço tuas as minhas palavras e faço minhas as tuas dúvidas a respeito dos pensamentos do senhor Ferrín. Não tenho as capacidades para poder compreender o que se passa pela cabeça do senhor Ferrín, mas não hesito quando digo que Carvalho escolheu esta forma por coerência, capacidade crítica e evolução pessoal. O do segundo apelido pode ser digno de análise, desconheço a causa que o levou a não mudá-lo, mas acho que tem mais possibilidades de ser “Caeiro” do que “Calleiro” ou similares. Finalmente, não te deves alporizar desse modo e de meter no mesmo saco a todos os membros da RAG, não são todos farinha do mesmo saco, aliás o Ferrín já não faz parte deles. Na Real Academia Galega há quem leve o leme e há quem tire dos cabos para encher de ar as velas, ainda que o patrão não entenda de ventos nem marés. Infelizmente, o nosso velho barco tem muitas fendas e a tormenta apresenta-se forte, quem será o capitão último em abandonar a nave?

Paulo F.Martigo-ferrin.