Cuidado com nós!

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Por Ângelo Pineda Marinho

As três inquiridas enfrentaram-se à última pergunta. Faltavam poucos dias para o 8 de Março daquele ano e esse era o motivo da entrevista. Assim, a modo de conclusão, os membros da revista solicitaram uma reflexão final sobre um texto bastante extenso da UNIFEM que falava na feminização da pobreza no mundo, na desigualdade salarial, na violência de género.

A primeira inquirida, militante duma organização feminista, deu uma resposta tópica. Falou em que aquele texto reflectia uma triste realidade que devia ser mudada. A segunda entrevistada, aderida a uma fundação que trabalhava ao redor da questão de género, exprimiu-se nuns termos muito semelhantes, lamentando que as mulheres fossem vítimas da dominação masculina.

Não obstante eu lembro com uma grande claridade a última intervenção, porque foi comovente e porque escapava de determinados lugares comuns. Tratava-se da socióloga catalã Maria Jesus Izquierdo quem, confrontada com o texto, afirmou: “Isto não serve para nada”. O rechaço aos termos nos que se expressava a situação da mulher no escrito foi justificada da seguinte maneira: “Damos lástima quando deveríamos dar medo”.

As palavras da senhora Izquierdo vêm-me à cabeça sempre que assisto a alguma comemoração ou acto relacionado com a língua e alguém toma a palavra para realizar um discurso. O discurso, com frequência, declama-se num tom lastimoso: a nossa língua ultrajada, vexada, humilhada… e demais adjectivos que convidam a qualquer coisa menos à esperança. Esta estratégia lacrimogénea como muito inspira um paternalismo paralisante e desalentador.

Até agora, não nos foi demasiado bem. Concentremo-nos em que o inimigo trema.

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