As pequenas lutas das línguas minorizadas podem fornecer-nos pistas valiosas sobre a situação que vivem, o que pode ser útil para compararmos as dinâmicas dos distintos idiomas que estão nessa situação. Portanto, pode ser interessante mergulhar em quatro notícias recentes sobre a língua catalã e os seus desafios e triunfos:
1) Entra en funcionament l’Oficina Pública de la Llengua Catalana (OPLC) de Perpinyà (Entra em operação a Oficina Pública de la Llengua Catalana (OPLC) de Perpinhão)
A Catalunha do Norte tem, pela primeira vez, um órgão de política linguística catalã: a Oficina Pública de la Llengua Catalana (web), uma realidade equivalente às já existentes para as línguas occitana, bretã, corsa e basca assim como para o crioulo de Reunião. Entre outros objetivos, a OPLC pretende impulsionar a definição e a aplicação de uma política linguística pública e concertada a favor do catalão bem como fornecer apoio financeiro às ações culturais que promovam a difusão do idioma.
Na França, a situação das línguas próprias que não são o abençoado francês é bem conhecida, sendo a saúde dos idiomas occitano e catalão especialmente crítica. De acordo com os dados coligidos pela Fédération pour les Langues Régionales dans l’enseignement public (FLAREP), no marco do ensino primário recebem uma educação imersiva na língua própria ou bem bilíngue junto com o francês 40,9% dos alunos bascos, 36% dos corsos, 17,5% dos alsacianos, 9% dos catalães e 3,3% dos bretões. Não se ofereceram dados percentuais no caso da irmã lenga d’òc. Tendo em conta os ensinos primário e secundário, na Catalunha do Norte estudam a língua catalã só 18,9% do alunado, do qual 6,4% fazem-no através de uma educação imersiva ou bilíngue e 12,5% apreendem-no como matéria optativa.
Na França, a situação das línguas próprias que não são o abençoado francês é bem conhecida, sendo a saúde dos idiomas occitano e catalão especialmente crítica.
2) Siri, l’assistent de veu d’Apple, parlarà català (Siri, a assistente de voz da Apple, falará catalão)
Os amantes das línguas podemos achá-lo um disparate sem rigor nenhum, mas fora do mundo das pessoas formadas na matéria ou minimamente cultivadas vai sair sempre um pseudoargumento potencialmente letal: há línguas mais “importantes” do que outras. Quais são as razões pelas quais alguém pensa assim? Provavelmente, nem o número aproximado dos seus falantes, nem a sua história literária estão a passar pela cabeça de quem diz isso.
Contudo, é razoável suspeitar que o facto de um idioma aparecer nas instruções dos produtos tecnológicos, nos cartazes dos supermercados ou nos cinemas pode conferir-lhe uma imagem de vigor perante outras línguas que ficam sem visibilidade. O mesmo acontece com a possibilidade de falar com os eletrodomésticos e com o grande companheiro dos humanos no século XXI: o telemóvel. O catalão, ao fim, será compreendido e falado pela Siri, a assistente de voz da Apple, cujos utilizadores poderão perguntar sobre os restaurantes que têm perto ou sobre a previsão meteorológica sem obrigação de demitir da sua língua. Coincidentemente, é uma questão de tempo que o Google Assistant, segundo informou o jornal Ara, incorpore também a língua de Pompeu Fabra.
É razoável suspeitar que o facto de um idioma aparecer nas instruções dos produtos tecnológicos, nos cartazes dos supermercados ou nos cinemas pode conferir-lhe uma imagem de vigor perante outras línguas que ficam sem visibilidade.
3) «La mort de Guillem» suma més de 600.000 espectadors als Països Catalans («La mort de Guillem» atinge mais de 600.000 espectadores nos Países Catalães)
Guillem Agulló foi profeta na sua terra. O filme sobre o jovem valenciano assassinado em 1993, que foi transmitido simultaneamente no dia 2 de outubro pelas televisões públicas valenciana, catalã e balear, atingiu um share recorde (10,9%) no canal valenciano À Punt, uma cifra a meio caminho entre os números da IB3 (4,4%) e da TV3 (17,6%). Ainda assim, cooperação não é sinónimo de receção recíproca dos sinais televisivos, o que é uma realidade só entre a Catalunha e as ilhas Baleares.
Como conhecem bem na Galiza, a receção recíproca de televisões que usam a mesma língua em territórios vizinhos, mas politicamente distantes, é uma tarefa titânica, e não precisamente por razões técnicas. Sabem-no igualmente os valencianos e valencianas que gostariam de poder ter na sua televisão os principais canais que emitem total ou parcialmente na sua língua desde Catalunha ou as ilhas Baleares. Entre 2013 e 2018, o período que vai da desaparição do singular Canal 9 até os primeiros passos da jovem À Punt, o catalão simplesmente não existia na sua TV convencional.
Como conhecem bem na Galiza, a receção recíproca de televisões que usam a mesma língua em territórios vizinhos, mas politicamente distantes, é uma tarefa titânica, e não precisamente por razões técnicas.
4) Samantha assoleix l’èxit amb una cançó en valencià (Samantha faz sucesso com uma canção em valenciano)
Samantha Gilabert é algo assim como a nossa Sabela Ramil. Ela é jovem, talentosa e com consciência linguística, além de outros méritos. A cantora de Beniarrés (Comtat), conseguiu que a canção “Espere que tornes” fosse a mais vendida no Estado espanhol durante alguns dias. Sem dúvida, precisamos daqueles artistas, com sucesso entre as faixas etárias mais jovens, que seguem a empregar as línguas minorizadas, a cuja difusão e prestígio podem contribuir mais do que outros profissionais ou ativistas altamente academizados, engajados ou afins à nossa cosmovisão do mundo, porém sem possibilidades de ter um atrativo tão forte para sectores despolitizados, intelectualmente preguiçosos ou simplesmente focados no lazer e o prazer imediato. Só uma digna minoria pode permanecer fiel a uma língua por convicção militante. O resto das pessoas, a maioria dos compatriotas que encontramos diariamente na rua, precisará vê-la como uma ferramenta útil para obter oportunidades, conhecimento e evasão.