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Tiago Alves: “Corpo, identidade e língua estão intrinsecamente ligadas na experiência humana e na expressão artística”

Tiago Alves é o responsável da última novidade da Através, a antologia poética, A boca no ouvido de alguém, que reune mais de 40 poetas de sete países. Falamos com ele.

A boca no ouvido de alguém, a última novidade editorial da Através, é a primeira coletánea poética da editora, e provavelmente a primeira coletánea -que tenhamos conhecimento- que incorpora autorias de até sete países de fala portuguesa incluíndo a Galiza. Como surge esta ideia?

É uma ideia que levava há algum tempo na minha cabeça e fui enriquecendo-a com as minhas vivências de 14 anos na Galiza, bem como pelas transformações que eu próprio sofri, assim como descoberta da minha própria identidade galega. Sempre senti que seria vital unir as vozes poéticas deste mapa dialogante e de afetos das várias comunidades de língua portuguesa que nos unem, mas queria fazê-lo a partir da Galiza. Penso que, dessa forma, poderia dar outro sentido a esta antologia, revigorando as línguas, descobrindo as potências libertadoras e criando um ponto de partida para um espaço galego-lusófono real.

Angola, Moçambique, Brasil, São Tomé e Príncipe, Guiné-Bissau, Portugal e Galiza. Que encontramos em comum?

Claro que a língua nos une medularmente, mas também a amizade, a cultura, a poesia e os afetos, apesar, obviamente, das nossas diferenças, que nos unem também. No entanto, e como menciono no prefácio, acredito que esta antologia ganha outra singularidade ao partir da Galiza, capaz de descentralizar, mas também sendo inclusiva e afetiva, provocando transgressões e fissuras e produzindo novas éticas. E acredito que essa “galeguidade” a que faço referência atravessa todos esses países. Acredito que cada poeta leva consigo um pouco da Galiza consigo.

No prologo do livro explicas que um dos critérios na escolha das pessoas participantes é geracional, todas nasceram depois de 1975. De que forma essa data marca um antes e um depois?

1975 é um ano repleto de acontecimentos políticos em todos estes países. É óbvio que há aqui uma data que nos marca que é o 25 de abril, que coloca um antes e um depois. Julgo que a escolha de participantes nascidos depois de 1975 para uma antologia também deve representar uma tentativa de capturar a visão e a experiência de uma geração que cresceu em contextos históricos, políticos e sociais distintos. Cada país viveu as suas próprias transições democráticas, o que torna essa seleção importante para proporcionar novas perspetivas, temas e abordagens enriquecedoras para o panorama literário. Essa abordagem oferece às/aos leitores uma visão, desde o meu ponto de vista, mais abrangente e diversificada da literatura contemporânea.

Julgo que a escolha de participantes nascidos depois de 1975 para uma antologia também deve representar uma tentativa de capturar a visão e a experiência de uma geração que cresceu em contextos históricos, políticos e sociais distintos.

Alberte Sánchez Regueiro

Como foi o processo de escolha e contato com mais de 40 autores e autoras?

Foi um processo muito fácil. Os autores e as autoras mostraram sempre muito entusiasmo quando lhes foi apresentado o projeto e foram unânimes na sua intenção de fazer parte deste longo diálogo. Confesso que nunca pensei que este processo fluísse tão bem. E aqui tenho de mencionar as pessoas que ajudaram a tecer o diálogo com os países representados, académicos e poetas, vinculados com os países, que deram uma força vital na escolha de cada autor. Além das premissas “Corpo-Identidade-Língua”, que foram servidas como mote para escrever os poemas, foi dada às/aos poetas inteira liberdade para escreverem. No fundo, seriam os seus corpos sonoros a responder à minha ideia inicial. Seriam eles que dariam a última mão na edificação deste lindo edifício comum e multicultural. Queria também deixar uma palavra para Timor Leste, país que, infelizmente, não conseguimos ter representação.

O subtítulo do livro é “corpo-identidade-língua”, de que forma se conetam estas três palavras?

Estas três palavras estão intrinsecamente ligadas na experiência humana e na expressão artística. O corpo, no fundo, é a materialização física da identidade, que é influenciada e moldada pela língua e cultura que cada um de nós vive, mas que, no caso desta antologia, tem uma corrente histórica que nos conecta. E julgo que a poesia possui os elementos ideais para interagir e manifestar-se de maneira singular esta corrente, permitindo que as/os poetas expressem as suas identidades e experiências pessoais através da língua. E isso ficou demonstrando com os seus poemas, explorando de forma inaudita esta relação complexa, mas ao mesmo tempo tão pujante. Julgo que reafirmaram as suas realidades poéticas como uma força motora capaz de revigorar as nossas sociedades, possibilitando não só novas formas de perceber o tempo que nos tocou viver, mas também desvelando a multiplicidade potenciadora da expansão das pessoas e das sociedades que integram.

Aproveito para referir que no inicio da antologia há um capitulo onde se faz uma resignificação das palavras “Corpo-Identidade-Língua” a partir dos poemas da obra, apetece-me revelar a parte da “Língua”, que ficou desta forma: uma língua aberta pelo facão da claridade / se extravia das normatividades da Língua / eis o primeiro fonema”

A imagem de capa é um collage, feito por ti. Que relaçom tens com as artes plásticas? De que forma a capa também dialoga com o miolo, com os textos?

Eu normalmente tenho uma forte relação com todas as artes, incluindo as artes plásticas. Sempre tento colaborar com artistas de diversas áreas nos meus projetos para criar novos fluxos, novas formas de pensar e provocar novas sensibilidades. Para mim, as capas são fundamentais para canalizar a energia das obras. O collage saiu de forma muito espontânea e até algo surrealista, o que me agradou sobremaneira. Nele há uma espécie de sussurro que nos agita para algo novo, um atrevimento, cultivando desde logo uma espécie de alegria subversiva. Na minha opinião, os poemas vão todos nessa correnteza vital.

As capas são fundamentais para canalizar a energia das obras. O collage saiu de forma muito espontânea e até algo surrealista, o que me agradou sobremaneira. Nele há uma espécie de sussurro que nos agita para algo novo, um atrevimento, cultivando desde logo uma espécie de alegria subversiva.

Já houve um primeiro lançamento do livro na Corunha, há mais algumha cousa prevista?

O primeiro lançamento na Corunha foi um sucesso e demonstrou que há um grande entusiasmo em conhecer este projeto. Ficamos extremamente felizes com a reação das pessoas na Corunha, o que também não me surpreende, e por isso gostaria de agradecer à Maria Xosé Bravo por ser uma construtora de diálogos e ter contribuído para a realização deste evento. No que diz respeito a novos lançamentos, já temos alguns em vista na Galiza, Portugal e inclusive em Cabo Verde. Além disso, recebemos uma proposta para um lançamento em Barcelona, onde acabei de me mudar recentemente. Estamos muito animados com estas possibilidades e ansiosos para continuar a partilhar este projeto com cada vez mais pessoas.

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