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Português Padrão

Por Nuno Gomes (*)

Perdoem-me desde já a prosa. Não será minha intenção castigar os já saturados cérebros galegos: Hablar español, falar galego, falar galego assim ou assado, escrevê-lo de unha maneira ou à portuguesa. As opções são, à partida, demasiadas para um qualquer, e avassaladoras para os mais conscientes. Sem querer confundi-los a um nível ainda mais esquizofrénico, informo-vos que eu, humilde cronista, não vos escrevo numa língua diferente da vossa, honoráveis leitores. Não utilizo a norma do Português da Galiza, nem tampouco do Português de Portugal, nem mesmo a norma brasileira da língua. Escrevo-vos, isso sim, no futuro Português Padrão (PP).

Ao ratificar o Segundo Protocolo Modificativo, o Estado Português tornou o Acordo Ortográfico (AO) oficial na Comunidade dos Países de Língua oficial Portuguesa.

O período de moratória instituído significa que o Português Europeu demorará ainda seis anos a imergir-se no PP. O que quer dizer que, até lá, até 2014, me sentirei um pouco mais galego. Tanto um galego que regista as suas ideias em galego ‘oficial’ (ILG-RAG) ou um galego que utiliza o galego-português (AGAL) enfrenta dúvidas semelhantes. O primeiro, que com alguma inconsciência mas com a melhor das intenções procura grafar à espanhola a fala dos seus pais, enfrenta certamente a perplexidade dos seus pares, dominantemente castelhanófonos, ou mesmo galegófonos em part-time. O segundo, mais ou menos lusista, certamente mais reintegracionista que o anterior, enfrenta a perplexidade de todos, castelhanófonos ou galegófonos. Mesmo um português avulso que calhe de ler os seus escritos acusará semelhante perplexidade, ignorante da realidade em que tal se insere.

Eu escrevo, de há uns meses para cá, segundo o AO. Às vezes, muito raramente, tenho de alterar alguma palavra. No meu blogue ou em público, sempre que os meus amigos me permitem tais divagações, defendi o AO acerrimamente. Tirando os amigos que não opinam sobre o assunto, quase todos os outros se declararam, com maior ou menor esclarecimento, contra o AO. O argumento é invariável: declaram-me, com certeza assustadora, que este Acordo é uma rendição incondicional ao Brasil e à sua fonética. Alguns, raiando o limiar da pura ignorância, afiançam-me mesmo que o vocabulário português será corrompido pelo samba brasileiro, de ritmo inebriante. Matraquilhos transformar-se-ão em pimbolim, guarda-redes passará a goleiro, autocarro será ônibus, etc.

Para quem realmente acredita nisto, não tenho muito mais a acrescentar. E, até 2014, terei de os aturar ao escrever em PP. Depois, inevitavelmente, todos me darão razão.

(nota: apesar de estar redigido segundo o AO, este texto não exigiu nenhuma alteração em relação à norma ‘atual’ vigente em Portugal. bem, antes era ‘actual’, agora é ‘atual’. e nada mais.)


Nuno Gomes é escritor. Natural do Porto, vive actualmente na Póvoa de Varzim, onde dá aulas de inglês.

(*) Texto publicado originalmente no número 69 do Novas da Galiza (15 de Agosto a 15 de Setembro de 2008).

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