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O Congresso dos Lusitanistas 2.0

Carlos Quiroga – Em Agosto o JL abriu mão do seu esquema com mais de vinte anos, que destinava a última página a um “diário”, para dedicar duas à versão que me tinha encomendado do Congresso dos Lusitanistas em Faro.

A entrega da crónica encima da hora, e o ter feito inicialmente à solta sem contar carateres, me colocou naquela situação constrangida de ultrapassar à entrega, e em muito, o tamanho requerido. Mas é que, apesar do privilégio, ainda tinha sido necessário cortar o texto primitivo. Agora, e a pedido do PGL, entrego a sua versão alargada que não acredito seja preferível.

Diziam camponeses da aldeia que se fala da feira segundo nos vai nela. A mim nem bem foi nem estive a toda. Tratei de saber do que não fui, para não defraudar o alto pedido de diariar, mas de certeza será uma visão instável do Congresso da Associação Internacional de Lusitanistas, um dos mais importantes eventos periódicos do planeta académico em volta da Língua Portuguesa. Também diziam os camponeses que bem está o que bem acaba, e ele acabou bem. Só que não sou de Congressos, por muito que tenha estado em muitos por dentro e por fora e até tenha escrito serem eles tanto habituais quanto essenciais –pois facilitam relações não só comerciais mas até doutorais, sociais, intestinais, sexuais, e daí culturais e outros que tais. Pago quota de professor neste mas persisto no erro curricular de não levar comunicação. Agravo-o com nem ir bem como escritor: vou mediar uma mesa deles, consagrados, apagado em mal observar o que acontece. Mais de 350 docentes universitários escolheram Faro pensando no Destino Turístico (e não é o livro do Rui Zink), encontraram um general sem efetivos nem Tropa de Elite (e não é filme mas esperava-se extras), e vou lá resumir como tudo se resolve.

17 de julho, abeiramentos

Revertendo Amália, ‘Havemos ir de Viana’, pois à chegada do pedido já sabia que devia sair mais abaixo de Compostela. O compromisso prévio de lá falar de língua, com Rui Vieira intermediados por Benjamim Moreira, aquele ‘leitor de silêncios’ que tão delicadamente escrevia o outro dia no JL, colocou aí o meu ponto de saída. Substituía um Diretor Geral de Política Linguística, algo que ignorei até ao dia a seguir –o discurso pelos vistos foi bem diferente. Nada melhor que essa fala para aquecer Lusofonias antes do congresso. E a caipirinha no pós com Benja, que apesar da continência só às 03 me põe diante do hotel. Marco o código da senha que me entregaram e atravesso para um encantamento: apercebo-me de a chave não ter número, apenas o andar 1º e o nome de ‘Rosa’. Mas os quartos não são mulheres, em que estaria eu a pensar. Percorro um jardim de portas de flores e, quando dou com a delícia do meu, cuido que não tinha visto margaridas. Reparo na senha e então leio o nome do albergue que nem tinha visto: Margarida da Praça. Ah, não acredito! Ficará na memória este lugar, desvendado como um segredo mesmo que não seja de carne –é como se dormisse com a Margarida mais sonhada.

Ao café de manhã ainda falo com os amigos da Livraria Pedreira, tomo outro com Benja, e parto tarde à Póvoa de Varzim. Almoço com Manuela Ribeiro, Coração de Correntes d’Escritas, de maneira que me apetrecho de magníficas recordações olhando o mar. E do que podem ser Cortes de Letras construídas com zelo, num preparo de comparações impossíveis. Deixo carro, pego avião no Porto, 45 minutos de voo, anuncia o piloto, depois da verborreia interminável em inglês. Arrancamos a isso das 22. O prodígio do voar breve, de noite, sobre terra com nervuras de luz, pode ser celestial se não querem vender-te atropeladamente de tudo. Colocar-nos cigarros fingidos ultrapassa todas as paciências com os ryaneiros do caralho. Só o iminente inclinar da nave para aterrar encerra o souk aéreo. A lua quase cheia, o mar perto de liso, e a cidade abaixo reclamando aconchegante. Na confusão de caras e cartazes com nomes ninguém me espera no aeroporto. Vou à fila interminável dos táxis durante meia hora. Alcanço por fim o modesto hotel às 24:00, onde desconhecem que seja a AIL mas guardam um quarto. Duche, ensaio veloz de restaurante ao lado, conformação final aos amendoins com sanduíche no bar. E aparece o Márcio Muniz, da Bahia, leitor que fora em Santiago! Coincidência, alvoroço. E uma garrafa de Borba tinto.

18 de julho, inauguração

08:20, autocarro para o Campus de Gambelas. Às 09:00, congressistas pastam em filas: recolha da carpete azul com fotocópias de programa e certificado de presença. Ninguém sabe de mesa de escritores –só mais tarde terei pasta. Perco-me entre ralos pinheiros. Em Viana chovia mas Faro aperta de calor. Vou ter a uma cantina de estudantes deserta que tem guaraná. À sua libação exterior junta-se a repentina alegria do Onésimo e da Leonor: apanham-me desprevenido como uma miragem. Voltamos à civilização do auditório mas eu vou ao galinheiro, com Márcio Muniz e a Jovem Turma Galega (JTG).

10:18, arranca a Abertura, cinco pessoas na mesa, todos homens. Abre Petar Petrov, comandante da Comissão Executiva: recorda ser ele a organizar, e mostra-se apocalíptico a propósito de cultura e literatura. Segue Elias J. Torres Feijó, presidente da AIL: discurso confluente e amável sobre a convergência lusófona. O Reitor da Universidade do Algarve afirma a magnitude diaspórica da CPLP. Helder Macedo trata de colocar algum tique humorado e dá passagem à conferência inaugural. O Reitor da Universidade de Cabo Verde, Paulino Lima Fortes, resulta ser um matemático que equaciona bem preocupações acerca de língua, ensino e lusofonia, e simplifica a divisória entre crioulo e português para maior glória da ciência e do progresso do povo cabo-verdiano. O Reitor local ainda contesta o Petrov apocalíptico, lança os melhores augúrios para o congresso, mas o comandante dissimula e encerra chamando à pontualidade –e a dar sentido aos certificados de presença! Levantamos com sorriso.

Almoçar ao pé do Onésimo garante boa digestão mesmo que o polvo seja duro. Já que terei escassas conjunções, pois a sua companhia é disputada, aproveito a primeira. Aos cafés, desagregam-se ajuntamentos e preparam-se fugas, situam-se praias a respeito de hotéis, marcam-se aqueles com piscina para ir visitar. E repassam-se nos programas os compromissos de assistência, nunca académicos e apenas pessoais. A JTG (Charo) tem foto de TM com horários do autocarro 15, o único transporte público que resgata do campus antes das 21:00. Saltamos as sessões iniciais, comparecemos antes da primeira pausa, pois a Cristina vai a palco nas 15:15.

As primeiras horas de congresso são para tomar conta do território, saber onde estão as coisas, completar elencos de abraços. Engolir comunicações é ridículo para além de impossível: são 325, apresentam-se simultâneas e todos os textos integrais foram colados antes na web para facilitar o debate, a que se reserva metade de cada sessão. Nela confirma-se o texto ou reelabora-se em função da conversa, até 15 de setembro. No princípio ninguém gosta do esquema, mas ele vai andando.

Há três níveis de Congresso, no 1º a direção da AIL, que desaparece durante a primeira tarde para debater duas frentes naturais: hipóteses geográficas para dentro de três anos, renovação da sua própria estrutura. No 2º nível, os trabalhos nas sessões, que desta vez seguem o formato de antecipação que se disse, com textos em geral já avaliados. No 3º nível, parte dos congressistas avaliam já a temperatura das piscinas e cervejas locais –para as praias é prematuro o primeiro dia. Em toda a semana não tiro da mala fato de banho nem roupa de correr, mas trato de navegar entre os níveis, como cabe a um habitante do limbo –e à primeira oportunidade no meio da tarde junto-me à JTG para desertar no autocarro 15.

Regresso ao hotel pensando no elenco que coordeno, de que nada conseguem informar no secretariado. Sei só do Germano Almeida e é um princípio. Mas à chegada encontro nota do grande Márcio Souza, e após outro duche vou encontrá-lo. Ele tinha voado muitas horas e esperava certamente outro mimo. Não conta de princípio, anima-se na fala rica de experiências, a que se junta uma professora vinda do bar. Depois a Leonor e o Onésimo, vindo da Cimeira no 1º nível –deste, é o único confinado no hotel Alnacir. Souza entrega-me o belo História da Amazônia com penacho tribal no “ô”, e o lindo Cadernos de Literatura Brasileira a ele dedicado. Agradeço envergonhado porque eu nada trouxe.

Desfeita a roda, o pessoal desfila já para jantares. Caminho para a Baixa com igual intenção ao lado do Souza, mas acabamos por ir ter com Carmen Villarino que ele vai cumprimentar. Aí o brasileiro desaba para queixas que a mim só insinuara. Chegar a aeroporto desconhecido como convidado, depois de muitas horas no ar, não achar amparo nem ninguém à espera, ter que descobrir hotel por si (ele tinha euros para táxi?), e alcançar o tal com desengano (não tinham lugar pior para ele?), nem é bom modo princípio nem sentir-se convocado. Chegou a procurar avião de retorno. A Carmen em desagravo –do que não era com ela mas da organização– leva-o jantar ao 1º nível. Eu vou encontrar a JTG que durante a manhã adotara o André da Extremadura espanhola. Vamos no Vasco da Gama e aos copos aparecem Raquel Bello e Elias Torres procedentes do 1º nível. Interrogo o presidente e a diretora da Veredas: a hipótese Cabo Verde, mesmo com dificuldades de intendência, avança como próximo Destino Turístico, contra a Itália, a Hungria e até talvez a Polónia, hipóteses que nalgumas esquinas da tarde circularam. Por outro lado, os propósitos de renovação para a cúpula são escassos: economia boa, crescimento notório, todo o mundo que está quer ficar. E mesmo há fila para entrar. Da reunião da Corte, a debater coisas como mudança do logo, só chegam indícios dessacralizantes a nome do Onésimo, previsível porque dele não consta que se bata por estar lá encima –é o lá encima que brilha com ele estar. O núcleo do poder lusófono continuará galego, o que não deixa de ser paradoxal, à luz do que vivemos na terra –onde nem núcleo nem poder nem lusófono, e mesmo nem galego.

19 de julho, mesas rolantes

Dia congressual maciço. A fórmula de depoimentos rápidos ganha conformidade. Ninguém lê trabalho alheio na web mas gosta: o esforço de redigir tudo antes e não treinar versão restrita, o comodismo que era enviar o texto depois na calma de meses, vai abrindo passagem à consciência de três novos argumentos poderosos:

O 1º é que está lá (quase) pronta uma publicação admitida, que os textos constituirão capítulos de livros agrupados tematicamente, de edição prevista para o final deste ano, no que será o conjunto mais importante por número e atualidade de toda a área das Ciências Humanas lusófonas no mundo. O 2º, importante para aliviar a “realidade” factual deste tipo de congressos, é que não será necessário aturar depoimentos próprios e alheios eternizados, que tudo vai rápido. E, o 3º, que com esta agilidade até as “discussões” acabam por ser uma troca interessante. Os dísticos genéricos, que agrupam por tríadas as comunicações, servem de guia para achar o que temática ou metodologicamente o apetite desnorteado queira comer.

Saramago recebe homenagem com etiqueta distintiva, por algo é o Nobel do grémio, com 15 comunicações aprovadas e repartidas durante todos os dias do Congresso, além da presença na secção de Literatura Comparada. Estudos de Literatura Portuguesa, Brasileira, Africanas de Língua Portuguesa, Linguística, Educação & Identidade, Política & Desenvolvimento, Teatro, Metodologia Literária, Arte & Sociedade, Arte & Ditadura, Literatura Ilustrada, Cinema, Estudos Culturais, Sociais…, e até Estudos Galegos com praça própria. Mais admirável do que isso é como clássicos de sempre continuam a motivar matiz. Eis os Pessoa, Machado de Assis, Guimarães Rosa, Eça. Outros andam a caminho do Olimpo, Lobo Antunes, Llansol, Nélida, Agualusa. E gente mais jovem (menos), alguns amigos, amigas, sobre a grelha. Ainda bem.

No fim da manhã retiro para preparar, com Germano e Márcio Souza, a estratégia da mesa que encerrará o dia. Lídia Jorge e Nuno Júdice estão na sua casa e com ela já troquei impressões por mail, para além de vê-la na inauguração. O Nuno está com família em férias na redondeza, fica em liberdade para seguir sugestões acordadas ou voar livre. Marcamos um eixo, falamos de nada e deixamos que o Germano vá às compras com a filha. Buscamos um café próximo e o Souza conta-me da sua vida de escritor e homem de teatro. Voltamos achar o Germano e a filha, horas de almoço, peixe, com fala prolongada e no consórcio de outra linda cabo-verdiana e um italiano. Voltamos tarde ao hotel. Trato de ir sozinho a Gambelas ouvir o Onésimo mas não acho transporte imediato. Compreendo o perigo estúpido de desatender a tarefa e desando ao sol algarvio a prumo, mando sms de desculpa ao incomparável. O seu Pessoa até me teria interessado.

Medito o plano, a ordem, pergunto-me se ausência de Ana Paula Tavares deixa campo para um galego dizer palavra também de escritor, mas abandono à circunstância. Subimos em dois táxis, chegamos folgados a Gambelas, caras, falas. Quase na hora da mesa resulta que ninguém abre o Auditório Verde no prédio do lado. A organização acomoda a sessão numa das salas das comunicações. Arrancamos. O esquema fica pop e até camp. A gente apertada e nós também. Apresento (mal) Lídia que está radiante (como sempre) e fala estrita e sedutora: os escritores estamos na linha da desordem.
Antes que ela acabe, reclama-me um sinal de Petar Petrov. Rompo a etiqueta que não havia e vou lá ter: o Auditório Verde já está verde, e nele 60 pessoas aguardam. Pede-me levantar a mesa e transferir-nos. Volto dentro, acaba Lídia, explico. Motim geral. Ainda volto fora parlamentar em nome do povo que resiste a sair mas não há ninguém com quem negociar. Se me aventuro ao outro prédio arrisco que atrás a temperatura da sala rebente. Regresso, conto, e o Onésimo ajuda a apaziguar. A gente aceita mudar-se.

A melhora de espaço é notável mas perdemos tempo. Alguma gente leva o dia todo no Campus e o cansaço do público é patente. A última manobra uma afrenta para os que não ouviram Lídia e para os que sim mas cederam. Márcio Souza aborda o mapa editorial do Brasil, conseguindo melindrar brasileiras do fundo leste. Quando estive em Manaus no FLIP-Floresta verifiquei como o Amazonas é realmente outro planeta e o resto do Brasil olha para outro lado. E Souza sabe do que fala. Mas o público não está para brincar. Júdice, voltado para o mundo à parte da sua vertente de poeta, consegue desviar as contingências, e o Germano, relatando como se tornou escritor, e como é a precariedade do livro nas Ilhas, completa a domesticação. Só no final me apercebo de que deveria ter seguido o modelo rápido das comunicações e remeter apenas à web as biografias. Pelo menos consigo fazer bem um retorno à Lídia que encerra o círculo, contentar os 60, e compensar o espaço masculino que a ausência de Ana Paula tinha de novo evidenciado. Lídia acrescenta inteligência sobre a distinção de géneros e a suturação do romance. Faltavam 20 e tal minutos e não cabia apontamento sobre a resistência galega para os que lá estavam. Abri à plateia, houve três perguntas, respostas, e fechamos a mesa. Que talvez por ter-se dito redonda acabou por rodar. O jantar, como se o restaurante fosse do Hatoum ou do Germano, pois ambos escreveram livro com o seu nome, (Os) Dois Irmãos, foi melhor sucedido.

20 de julho, cabos e arremessos

Era incontornável para Congresso que trata de espalhamento de Lusofonia, que é da Associação mais importante do ramo, e que decorre a pouca distância da suposta e mítica base do lançamento das naves, a lembrança explícita da geografia. Assim que se programou excursão a Sagres e Lagos, com saída à 09:00 e comida por aquelas partes. Com idêntica inspiração foram marcados outros “lançamentos” para a tarde, livros e projetos, ao retorno do passeio. Ninguém do meu periférico hotel pelos vistos ia ao passeio, e eu em princípio nem pensava, mas logo que assumi este papel de relator fui assinar a lista para contá-lo. E até acordei às 07:30 na disciplina de ser recolhido na hora habitual mesmo que o programa só falasse de 09:00. Aguardei periférico e às 09:30 tive a certeza que ninguém iria recolher. E perdi tanto tempo a desesperar que até perdi a cintura de manobrar a uma praia ou assim.

Patrulho a estação de Faro a flanar mas não embarco em nada, procuro um café e encontro a Pastelaria Cofre, onde guardo com preguiça caras da terra e estampas com resíduos de turistas que tardiamente procuram o litoral. Motards retardatários, da concentração de 31000 que tinha havido, e algum rasgão dos aviões que não incomodam nem aos pássaros. E a mulata deslumbrante de meia hora antes no labirinto de ruas a contornar agora a mesa vermelha onde escrevo. Escrevo que a AIL andante deve andar por Lagos. Perco o tamboril do almoço mas de resto não perco nada. Já estive nessa orla toda por dias e melhor acompanhado, já vi o Cabo Kennedy da nassa de D. Henrique, e não acredito que daí fossem foguetões pela água. Nem mexeu muito em mim o sentimento lusofónico, ao contrário do que no Arnaldo –que também desta não foi, mas que depois para mim se lembrou comovido das idas. Os que foram à excursão contam que a corrida não descobriu continentes.

A experiência dos lançamentos de tarde foi traumática. Decorriam em paralelo em duas salas e meti-me na primeira porque a autora brasileira de uma curta me pediu assistir. Engoli vários de livros de poesia e esperava poder mudar de sala para acompanhar o Samartim na explicação da Agália que agora dirige ele e acontecia no final ao lado. Devia ser bem simples chegar. Mas na primeira sala até a temperatura se adensava com o recitado de poemas e memórias pessoais até à náusea. Cheguei à curta sem frescura para apreciar o tratamento da violência de género vista do Brasil, que mesmo sem nada novo merecia melhor disposição. Resisti duas horas até ao livro de homenagem a Mª Lúcia Lepecki como tributo pessoal e, quando faltavam 5 livros, saí. Mas ao lado tudo tinha corrido tão bem que a Agália do final já tinha voado. Senti-me desolado por faltar.

19:15, assinatura de protocolos. Quando vi seis garrafas de água na mesa temi o pior. Mas a coisa arrancou com ritmo e falas mínimas. OLP, ABIL, APSA, BRASA, MLA e ABRAPLIP. Só sei bem o que é a última, pois fui a uma mesa de escritores à Bahia na sua última cita. Gostei da BRASA –talvez porque os seus congressos sugerem churrascos. De resto, a AIL alarga a capacidade de convergência da Lusofonia com formalidades destas. O pior é que os fantasmas dos lançamentos nos perseguem até ao Anfiteatro e lá penduram livros pendentes. E já não há transporte até tudo rematar. Assisto com inveja à fuga de quem tem carro alugado e volto dentro para o último lançamento, uma antologia africana da elegante Laura Padilha. A plateia exausta. E faltavam as Actas da Madeira!

O jantar foi de novo reconciliante. Parti para a Baixa a pé com o Márcio Muniz, assentamos num restaurante de ementa com poema da Mensagem, e lançamos um idem para a JTG. Compareceu esta sem o André mas com o Carlos Pazos recrutado de fresco. O Joel R. Gômez já devia estar também em Faro mas ao amparo de família. Prolongamos cansados. Mas não houve coragem para copo.

 

21 de julho, assembleia

09:00 de mais trabalho maciço. A poesia contemporânea ocupa parte relevante, e ainda as questões de género que neste dia tem mesa própria. Literatura e guerra colonial, literatura infanto-juvenil, tradição oral, aditam um etiquetado complementar aos lotes mais correntes acima aludidos. A manhã e primeira parte da tarde parecem mais leves e chega-se às 17:00 com boa disposição para Assembleia. O discurso de Elias Torres consegue dar substância àquilo tudo em público com autoridade. Invocam-se as sugestões de colaboração que chegam à AIL. “Somos uma Associação Científica”. E os dois grandes temas resolvem-se sem maior problema: Cabo Verde é candidatura única, como estava cantado, apresentada pelo reitor matemático. O XI Congresso será na sua terra em Julho de 2014. Quanto à composição dos corpos diretivos, não varia substancialmente: re-eleito Elias Torres, reforça-se a orientação que ele dá. No Conselho Fiscal entra Pires de Lima, Carmen Villarino passa a vogal, entra Roberto Samartim como secretário. Entram Itália, Hungria, entra o organizador do presente Congresso e o do futuro, sai Polónia, continuam Madeira, USA. Brasil fica apenas com 3 vogais mas pelos vistos fortes, como Laura Padilha –também pelos vistos o Brasil não se concentra em votar no Brasil. Continua Raquel Bello na frente da Veredas, e, enfim, a AIL segura sua presente orientação.

Ainda nessa certa boa disposição encerra-se o dia com uma sessão agradável no Auditório Verde: a apresentação do romance As Luzes de Leonor, de Maria Teresa Horta. A autora falou com entusiasmo e foi momento alto. Não era conhecida de muitos professores do mundo, que só leram nos livros o mito da censura sobre as três Marias, e ficam encantados com esta.

22 de julho, os críticos

09:00, sessões. Concentra-se neste dia a maior parte das comunicações da JTG e de amigos/as doutras latitudes –que desculpa para não estar a nenhuma! Mas o diferencial da Sexta é às 16:30: mesa-redonda sobre as Relações Literárias e Culturais Luso-Afro-Brasileiras, com Benjamin Abdala Jr. e Mendonça Teles pelo Brasil, Francisco Noa por Moçambique, Fernando Cristóvão e Arnaldo Saraiva por Portugal, mediação de Onésimo Almeida –por si próprio ou em todo o caso pelos Açores. Noa fala de uma política concreta de apoio à distribuição do livro na África, Saraiva daquele requinte do cordel mas menciona a Galiza. Cristóvão é quem mais se centra no tema e Mendonça Teles quem consegue irritar de novo algumas compatriotas, tocando na política universitária de Lula. Enfim, não há sangue e passa-se ao Grande Auditório para Conferência de encerramento, ‘Iterações na itinerância’, de Anna Klobucka, da Universidade de Massachussets. Género, Língua. Incisiva e elegante. Boa conferência.
O presidente da AIL reitera o objetivo cumprido, os propósitos de consolidar a AIL como espaço de encontro, e a aprovação da ida a África como fortalecimento dos laços com Europa e América. “Vamos a Cabo Verde aprender”. Depois a Tuna do Algarve (sem palavras). Aos autocarros e para o restaurante A Frangaria, tamboril ou espetada, bom humor, barulhada imensa, o pessoal do 3º nível estava todo de volta das praias e piscinas de um Algarve aqui desabado, e corre a impressão geral de que tinha havido altura: salva de palmas para o Pedro Sousa, que era quem arranjava os problemas. E ponto final.

23 de julho, no pós

Muita gente fica até domingo, e mais. Entramos nas férias pela porta deste Congresso. Isso deixa bom sabor. Eu, que sou péssimo congressista e fico retraído para comércios, que nisto só me animo no humano de alegres primeiras intenções (e elas nisto por certo sempre escassas), não devia talvez ter aceitado encomendas de diário. Também pela imagem de lobby galego que de fora pareça. Por isso acabo dizendo que nem no parentesco casual nem nos desígnios da boa cabeça circunstancial da AIL cabem confundir-se encomendas como esta: no fundo fui a Faro como em serviço público outro. E para mostrar que realmente lá encima temos algo de tudo. E vi mínimo Inferno, soube que Céu havia, e palmilhei só no Limbo. Esse que nem para o Vaticano existe.

 

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