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Falamos com Xoán Carlos Carreira e Emílio Carral, autores de O PEQUENO É GRANDE, AGRICULTURA FAMILIAR COMO ALTERNATIVA

Nove anos depois do seu lançamento, agora a Através Editora disponilibiliza o volume digital em aberto.

O pequeno é grande, com o subtítulo, agricultura familiar como alternativa, o caso galego surgiu em 2014 e no seu prefácio afirmava-se: aspiramos a ser um ponto de partida, não de chegada. Qual era, na altura, o ponto de partida?

EMILIO: A pouca atenção científica/técnica e da administração à agricultura familiar. Nas administrações, Academia incluída, promove-se fundamentalmente, por não dizer exclusivamente, o agronegócio e agricultura industrial. Era evidente que a agricultura industrial influía claramente no desenho das políticas agrárias, e sempre no caminho de prejudicar a pequena agricultura. A agricultura familiar é mais resiliente, melhor capacidade de adaptação, mais diversidade na produção,  menor impacto negativo no meio, maior capacidade de criar riqueza equilibrada no seu reparto e grande capacidade de construir comunidade e redes colaborativas e de ajuda mútua.

A agricultura familiar é mais resiliente, melhor capacidade de adaptação, mais diversidade na produção,  menor impacto negativo no meio, maior capacidade de criar riqueza equilibrada no seu reparto e grande capacidade de construir comunidade e redes colaborativas e de ajuda mútua.

XOÁN CARLOS: Sim, havia, e continua a haver, muitos preconceitos sobre o suposto atraso e falta de inovaçom na agricultura familiar que, por outro lado, permanecia invisível para umha grande parte da academia, da ciência, da técnica, dos meios de comunicaçom e da opiniom pública.

Na agroecologia, e para a maior organizaçom campesina mundial, a Via Campesina, já se estava a defender que a agricultura familiar é precisamente o modelo a seguir no futuro, o que melhor garante a alimentaçom das populações e a sustentabilidade dos recursos naturais. Na Galiza, estas ideias e posicionamentos ainda eram mui desconhecidos, exceto para as Comisións Labregas-Sindicato Labrego Galego, integrado na Via Campesina, nas organizações que se moviam no ámbito do ecologismo e para alguns setores académicos minoritários. Por isso, com o livro pretendemos pôr sobre a mesa um conjunto de ideias para incentivar um debate que parecia ser cada dia mais necessário. Nesse sentido falamos dum “ponto de partida”.

Nove anos depois, em que medida se tem transformado a agricultura familiar? Em que medida as questões climáticas têm mudado a sua realidade e a visão que tem a sociedade galega?

EMILIO: Entende-se que foi para pior. Certo é ainda ficarem iniciativas de agricultura familiar mas a tendência é serem cada vez menos pelas dificuldades próprias (pequeno tamanho, problemas de comercialização, armadilhas institucionais) e.g.: na pandemia os mercados ao ar livre (produção familiar) foram proibidos, dificuldades administrativas para instalação de pequenos centros de transformação/matadouros…

A sociedade acho que não é consciente, de maneira genérica, da relação mudança climática-pequena agricultura. Realmente não respondemos corretamente a dita mudança: diminuição do consumo e consumo de produtos de temporada e de proximidade. Nas administrações não se trabalha, com alguma exceção, para que a sociedade seja consciente da importância da dita relação. 

XOÁN CARLOS: Do meu ponto de vista a agricultura familiar seguiu dous caminhos. O primeiro foi o que seguírom as unidades agrárias que conservárom um sistema de produçom tradicional e um modo de vida característico das casas de labrança. O segundo caminho foi o que seguírom as unidades agrárias que optarom por tentar ter êxito incorporando-se ao sistema agrário dominante e capitalista. Até somando-se muitas de elas ao monocultivo exportador, especialmente ao monocultivo do leite.  Em consequência, a agricultura familiar transformou-se em funçom do caminho seguido. No primeiro dos caminhos, na minha opiniom, a agricultura familiar mantivo-se dentro das coordenadas da agricultura campesina e a análise dela que se fai no livro continua a ser substancialmente válida. No segundo dos caminhos as unidades agrárias perdêrom em boa medida as características próprias da agricultura familiar. 

As questões climáticas tenhem mudado a realidade dumha grande parte do campesinato em todo o mundo, fazendo mui difícil, quase inviável, continuar com os seus sistemas produtivos destinados a alimentar a populaçom mais próxima. Mas, ainda que na Galiza possamos dizer algo similar em relaçom ao impacto das questões climáticas sobre a agricultura familiar, ao meu entender este impacto nom alcança o nível que alcança em outras partes do mundo.

As questões climáticas tenhem mudado a realidade dumha grande parte do campesinato em todo o mundo, fazendo mui difícil, quase inviável, continuar com os seus sistemas produtivos destinados a alimentar a populaçom mais próxima.

Quanto à visom da sociedade galega, por desgraça, nom acho que as questões climáticas fizessem que esta mudasse maioritariamente a sua perceçom da agricultura familiar, se bem há setores minoritários mas muito ativos que valorizam a pequena agricultura campesina como se merece.  

Há realidades, mais ou menos longínquas, onde nos espelhar?

EMILIO: A escala global o processo é muito semelhante. Grandes países de referência na agricultura familiar e na agroecologia, como o Brasil e a Índia, também está a sofrer o resultado das políticas agrárias dominantes. Mais agronegócio/agricultura industrial e menos agricultura familiar. Tudo isto com financiamento do banco mundial e grandes corporações da agricultura industrial.

XOÁN CARLOS: No livro recolhe-se umha citaçom de Victor M. Toledo, umha pessoa de grande prestígio a nível mundial no ámbito da ecologia política. Victor M. Toledo no ano 2002 pom o exemplo da China, onde o seu minifúndio histórico já é umha lenda, e salienta que neste país mais de 200 milhões de unidades agrárias familiares que tenhem menos de um hectare cada umha de meia conseguem a autossuficiência alimentara para umha populaçom de 1.200 milhões de habitantes. E isso que, ao todo, estas unidades agrárias familiares ocupam apenas umha superfície equivalente à do Rio Grande do Sul.

O mesmo Victor Toledo considera também mui instrutivo que quando Cuba ficou sem petróleo suficiente para abastecer a agricultura industrializada das grandes unidades agrárias estatais e cooperativas, e com umha aguda escasseza de alimentos, os olhos tiveram que virar-se para a pequena agricultura familiar.

Em todo o caso, na minha opiniom, se tivéssemos mais confiança no que somos, em lugar de tratar de imitar modelos alheios, talvez nos atrevêssemos a dizer: olhai para a Galiza, o modelo possivelmente está aqui. E nom estou a desvariar.

No livro cita-se um debate entre Servolin e Cavailhes. Este último julgava que as pequenas explorações agrárias familiares seriam engolidas pelo capitalismo enquanto Servolin achava que não iam concorrer com as grandes produtoras de alimentos. A quem dará a razão o futuro?

EMILIO: O futuro não chegou, mas o presente indica a dificuldade de supervivência da pequena, há concorrência entre as duas agriculturas.  O agronegócio tenta ficar com tudo, com grande ajuda da administração. Somente a formação de redes das pequenas agricultoras que ainda permanecem, podem significar a sobrevivência da agricultura familiar. 

XOÁN CARLOS: O ritmo de desapariçom de pequenas unidades agrárias parecia dar a razão a Cavailhes, mas então na agroecologia e o movimento campesino mundial formula a questão camponesa de umha maneira que supera este debate. O conceito de campesinato apresenta-se como umha forma de se relacionar com a natureza ao considerar-se como parte de ela, num processo de coevolução que configura um jeito de usar os recursos da mesma com  umha perspetiva meioambiental. 

Assim sendo, o debate já nom é se as pequenas unidades agrárias vam ser engolidas polas grandes empresas capitalistas ou vam resistir e continuar a existir já que nom comcorrem com elas. O debate é se as pequenas unidades agrárias familiares som a alternativa ao capitalismo, a alternativa mais adequada para gerir os recursos naturais e alimentar a população mundial.

Eu, que sou de natureza otimista, acredito que as pequenas unidades agrárias familiares não vão ser engolidas polas grandes empresas capitalistas e que vão configurar um novo modelo agrário mais justo e mais respeitoso com o meio ambiente que vai assegurar que todas as pessoas que vivem neste planeta possam aceder a alimentos suficientes e saudáveis.  

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