Chegar tarde a um lugar é sempre inoportuno e molesto. Nas relaçons pessoais, demorar-se numha cita é signo de pouco respeito à outra pessoa, supom levar pouco em conta a importáncia do seu tempo e, ao cabo, a organizaçom da sua vida; no laboral, todo o mundo sabemos as consequências de entramos reiteradamente fora de hora no posto de trabalho; no político, denota torpeza e até desconsideraçom, como se comprovou na conhecida gestom espanhola do Prestige, ou mais recentemente na intervençom do poder político na catástrofe climática de Valência: o meio está desfeito, ou centos de pessoas já morreram, e sobre esse panorama desolado irrita ouvir profissionais da política a chegarem com promessas e promessas.
Mas que acontece com chegar antes de tempo? É outra forma de inoportunidade, por isso Baltasar Gracián, no seu “Oráculo Manual” recomendava aos prudentes que “se ha de llegar por los espacios del tiempo hasta el centro de la ocasión”. Ora, as consequências da açom prematura som menos inequívocas que as do retraso. O assunto tem a sua importáncia política, desde que o independentismo galego leva décadas, ou mesmo séculos, chegando antes de tempo (os nossos precursores, os rebeldes de 1846, fôrom arredistas muito antes das condiçons sociais do país permitirem o sucesso da proposta). Há muitas décadas que antecipou que a doutrina do bilingüismo harmónico conduzia para a morte doce do galego, e nom tivérom que passar centúrias para o nosso idioma virar minoritário no país; recuperou a grafia histórica nas ruas, ante mofa de muitos, bem antes de responsáveis galegos do PP participarem na defesa pública dos “potenciais da lusofonia”, 40 anos depois; assinalou a primeiros desta centúria que a turistizaçom era um plano estratégico baseado na monocultura dos serviços que ia privatizar espaços públicos, danar o convívio e pôr em risco os nossos espaços naturais e culturais, e naquela altura, a da “globalizaçom feliz”, predicou no deserto; afirmou na década de 90 que a desorde mundial havia de vir de mao do caos climático, e isso muito antes dos veraos virarem tórridos e inacabáveis, e quando ninguém concebia que os lumes letais no eucaliptal galego-português iriam ameaçar a vida humana; apontou que estavam na natureza do poder espanhol o autoritarismo e a pulsom da violência, independentemente de nós sermos beligerantes ou pacíficos, e isso lustros antes de milhares de polícias espanhóis abrir a cabeça a votantes cataláns desarmados que pretendiam consumar um independentismo “da lei à lei”.
Os nossos críticos mais severos apontam com desdém esta nossa capacidade antecipadora porque, com um bocado de razom, perguntam: de que serve esta previsom se nom arrasta massas organizadas que se oponham aos planos do poder? E nisso estám certos, porque a política é umha arte da concreçom que consiste em incidir na vida colectiva, e tem prazos de intervençom mais curtos do que a filosofia ou a ciência, cujo percurso é milenário, e que em muitos casos som artes gratuitas, isto é, sem directa aplicaçom.
Os nossos críticos mais severos apontam com desdém esta nossa capacidade antecipadora porque, com um bocado de razom, perguntam: de que serve esta capacidade antecipadora se nom arrasta massas organizadas que se oponham aos planos do poder?
A claridade do pensamento nom depende em muitos casos -claramente, nom no que nos ocupa – de maior inteligência, senom da posiçom. A nula dependência da academia, com os seus jogos de poder e a sua planificaçom do pensamento submetida a agendas de concorrência inteletual e consecuçom de preeminências, permite a abertura a umha contemplaçom panorámica e a deteçom de problemas que os grandes pensadores nom dam visto, nem muitas vezes querem ver; e o feito de nom submeter-se a umha grande maquinária partidária, com a sua burocracia e demandas de sucesso eleitoral permanente, como no caso do nacionalismo institucional, permite nom perder-se na balbúrdia das mil batalhas tácticas e enxergar a grande batalha estratégica. Faraldo, por começarmos com o nosso fundador, foi um pensador independente, e nos termos sócio-económicos de hoje, diríamos que um precário ou desclassado; mas também o fôrom Marx e, no campo dos mais lúcidos rebeldes heterodoxos que tivérom o valor e a nobreza de questionar a esquerda desde dentro, Henry David Thoureau ou Simone Weil.
Os nossos críticos tenhem razom em parte, mas junto à sua emenda, devessem admitir que a independência de posiçom é um requisito fulcral para alcançar a claridade; também seria justo admitirem que, ainda que os humanos nom sempre somos quem de solventar os problemas que criamos, si que podemos ter a habelência de detectá-los antes de estes tornarem-se enormes e impossíveis de gerir. Qualquer doente que enfrenta umha séria ameaça à saúde agradece um diagnóstico agudo e temperao.
Como arredistas, seria importante evitarmos as condutas nocivas que adoita produzir esta posiçom. A atitude do rosmom, que, como os pais zangados, entoa o “já cho dizia eu” com umha mestura de amargura e de soberba; ou, mesmo pior, a do arrogante que compensa com um sentido de auto-importáncia inteletual a sua nulidade política. Por isso, junto o saudável orgulho por termos apontado cenários reais e propostas sensatas, a voz da exigência devesse intensificar o nosso esforço por procurar a chave das nozes: a organizaçom de longo prazo que convirta os diagnósticos em açom certeira.
[Este artigo foi publicado originariamente no galizalivre.com]