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Chano Pinheiro, o cineasta da nossa Galiza

chano-pinheiro-foto-de-nueva-tribunaEstou a recuperar para a minha série de grandes vultos da Lusofonia de aqueles que se dedicaram à sétima arte do cinema, que chegaram a ter uma destacada filmografia que ficou para a posteridade, para desfrutar das imagens dos seus filmes, tanto jovens como adultos. Quero, então, dedicar este depoimento a um cineasta da nossa terra e lusófono, estou a referir-me ao conhecido com o nome artístico de Chano Pinheiro (1954-1995). O presente artigo dedicado a ele faz o número 72 da série que estou a escrever, e o 184 da coleção de grandes vultos da humanidade iniciada no seu dia com Sócrates, o grande educador grego da antiguidade.

UMA PEQUENA BIOGRAFIA

De nome completo Luciano Manuel Pinheiro Martínez, conhecido artisticamente como Chano Pinheiro, nasceu a 12 de outubro de 1954 em Forcarei (Ponte Vedra) e faleceu em Vigo à idade de 40 anos vítima da doença de Crohn, no dia 21 de março de 1995. Filho do boticário Manuel Pinheiro Landeiro e de Soidade Martínez Garrido, o cineasta era filho e neto de boticários de Ponte Caldelas. Por problemas com a sua gravidez, a mãe de Chano teve que dar à luz no hospital S. Lourenço de Compostela. Chano Pinheiro narrou-o de forma muito poética no seu momento ao relatar o seguinte: “Nasci às 00h05 horas do dia 12 de outubro do ano de Deus 1954. No meu bilhete de identidade dizem que nasci em Forcarei, que foi onde me registaram, embora, na realidade, a minha mãe pariu-me no sanatório de S. Lourenço (acho que já não existe) em Compostela. Ainda me lembro de aquele famoso edifício de pedra lavrada por bons canteiros, das suas escadas da entrada, da sua alegre luz, filtrada pelas velhas árvores gigantes. Quando nasci, não cheguei a pesar os dois quilos e meio. Foi uma gravidez muito difícil, pois, depois de uma ameaça de aborto, a minha mãe passou os quatro últimos meses deitada na cama. Não tive irmãos. Sou, portanto, vinculeiro”.
Em Ponte Caldelas passava Chano todas as férias do verão, embora Forcarei, onde o pai tinha a sua botica, nos seus dez primeiros anos fosse a localidade mais importante. Lá foi à escola pública dirigida pela professora rural Carmen Cubela, à qual muito apreciava e sempre lembrou. Rapaz inquieto e hiperativo, foi um ótimo estudante, ainda que fosse melhor nas disciplinas de letras do que nas de ciências, que considerava não necessárias. Do que menos gostava, e muito sofreu, era de que na escola naquela altura o ensino se realizava numa língua alheia à dos rapazes do rural, que era em todos a galega. Por isto, chegou a escrever: “Nunca fui capaz de ser um mais dos meus companheiros, porque o meu pai era o boticário e eu falava castelhano. Muito mais tarde, reparei que era marginalizado porque eu não falava galego. Minha mãe, especialmente, considerava o falar galego falar mal. Por ser meu pai boticário, fez-me estar até aos dez anos na escola de pré-primária da Dona Carmen, porque o outro professor era um “besta-asno” que batia nos rapazes. Foi um acerto”. Anos mais tarde lembrou estas vivências no filme Sempre Xonxa.
chano-pinheiro-foto-de-galiza-unicaEm criança Chano gostava muito do cinema, pelo que ia veros filmes projetados no Colón de Forcarei e também no Capitol de Ponte Caldelas, normalmente aos domingos. As fitas que se projetavam eram as típicas da época: as de Laurel e Hardy, as de Marisol, as do “Índio” Fernández, as do Faroeste, etc. Mais tarde, para a sua vocação da arte cinematográfica, foi muito importante a influência que recebeu do cineasta Manuel Barreiro e dos seus filhos Manuel, José Luís, Isabel e Pablo. Este último chegou a ser o responsável pelo som, produtor musical e autor da música da maioria dos filmes realizados por Chano. José Luís Barreiro ensinou-o a tocar guitarra com cantigas dos Beatles. Do cineasta Manuel Barreiro aprendeu também a arte fotográfica, o revelado e o positivado e as artes típicas da fotografia naquela altura.

José Luís Barreiro ensinou-o a tocar guitarra com cantigas dos Beatles. Do cineasta Manuel Barreiro aprendeu também a arte fotográfica, o revelado e o positivado e as artes típicas da fotografia naquela altura.

Depois de fazer os dez anos, os pais decidem que entre como escolar interno no colégio S. Narciso dos PP. Paules de Marim, onde a sua experiência foi bastante desagradável, e mesmo os seus pais refletiram: “Nunca devemos internar o Chano naquele colégio, pois sempre foi um menino fraco e muito sensível. Deprimia-se muito. Só recuperava a sua alegria quando o íamos buscar para voltar à aldeia durante as férias. Talvez naqueles anos começasse a incubar a sua longa doença…”. Nesse colégio o ensino era muito tradicional, com estrita educação religiosa e na linha típica da época do ensino franquista. Sobre isto Chano chegou a dizer: “Fui um rapaz “estudioso e formal”, que sempre andava com os braços cruzados nas filas que tínhamos que fazer para qualquer coisa. Sério, calado, com matrículas em conduta e em aplicação, além de alguma outra em qualquer disciplina que não fosse de ciências. Jogava bastante bem futebol, e era o capitão da equipa. Lá tive a primeira “namorada” e muitas primeiras coisas. Era um colégio de padres, com disciplina, formação religiosa e de espírito nacional. Por isto, eu sou um reacionário daquela educação”.
chano-pinheiro-foto-na-sua-farmacia-de-vigoCom o bacharelato finalizado, dez anos mais tarde ingressa no Colégio de La Salle de Compostela, para fazer o curso de PREU e preparar o acesso para os estudos universitários na universidade compostelana. Em 1971 ingressa em Fonseca na Faculdade de Farmácia, naturalmente, por influência da tradição familiar. Realiza os seus estudos de cinco anos de licenciatura numa época política e culturalmente muito dinâmica, ao ser os últimos anos da ditadura franquista, prévios ao falecimento em 1975 do fascista e nazista Franco. Chano frequentava em Compostela nos tempos livres o cinema e as sessões cineclubistas. O resto do tempo estudava profundamente, sem levantar a cabeça dos livros para ter um bom sucesso nos seus estudos superiores. Também foi nesta época quando lhe foi diagnosticada a sua terrível doença, e lhe realizaram uma série de operações para poder erradicá-la. Nesta mesma época, em 1973, conheceu a sua namorada, e mais tarde esposa, Mariluz Montes Quireza, colega de faculdade. Foi muito importante na sua vida para manter a esperança vital e também para iniciar a sua carreira de cineasta. Ambos alcançaram a licenciatura no mesmo ano e convocatória, já casados (o casamento foi em 1974) com os seus vinte anos feitos. Mariluz era de Rubilhão do concelho ourensano de Avião, cuja vida rural, quando Chano a pôde viver ao vivo, tanto influiu na maioria dos seus filmes. Tal como o chegou a comentar: “A partir de casar com Mariluz descobri uma Galiza diferente. A Galiza mais velha, mais pura da gente de Rubilhão. E fiquei em Rubilhão de alguma maneira. Fez-me sentir o latejar da terra muito forte”. Em 1975, quando estudava o terceiro ano dos estudos de Farmácia, a esposa deu a Chano uma câmara Minolta de super-oito milímetros e “aí começou tudo”, foi a primeira pedra da sua carreira cinematográfica. Filmografia que comentaremos a continuação e que, infelizmente, pela morte prematura de Chano, quando tinha por diante ainda muitos anos para continuar realizando filmes, ficou truncada, depois de realizar meia dúzia de filmes. Com isto, a nossa Galiza perdeu muito no campo do cinema e da cultura cinematográfica. Paralelamente Chano, já licenciado, chegou a dirigir uma farmácia na cidade de Vigo.
chano-pinheiro-foto-rodando-3Pela sua obra cinematográfica Chano Pinheiro chegou a receber os seguintes prémios: Da Crítica na Seção de Artes e Ciências de Representação na Galiza, pelo seu filme Mamasunción no ano 1985; Grande prémio do Cinema Espanhol, Carabela de Prata do ICI e Grande Prémio Mikeldi de Ouro do Festival de Cinema Documental e Curta-metragem de Bilbao em 1984; Melhor guião no 4º Certame de Cinema Amador de Vila Garcia pelo filme Os pássaros morrem no ar; Prémio Film de Ouro do Ministério de Cultura, pelo mesmo filme e ano e Medalha de Prata de Galiza, a título póstumo em 1995. Nas cidades de Vigo e Ourense foram-lhe dedicadas ruas, e os prémios do Audiovisual Galego (AGAPI) levam o seu nome. A escola pública de infantil e primário de Gondomar leva o seu nome, igual que o Instituto de Ensino Secundário de Forcarei. Por sua vez, João Acunha publicou nas edições do Cúmio, em 1999, uma interessante monografia intitulada Chano Pinheiro: Uma história do Cinema Galego.
Nota: Mais informação sobre a sua vida e obra pode encontrar-se nas ligações de culturagalega.gal e em esacademic.com.

FICHAS DOS DOCUMENTÁRIOS E FILMES

A.-Documentários
1.-Especial Chano Pinheiro.
Duração: 54 minutos. Ano 2015.

2.-Sempre Chano.
Duração: 8 minutos. Ano 2010.
Entrevista de Manolo Rivas a Chano Pinheiro (realizada em 1984).

3.-Mamasunción volta ao correio.
Duração: 50 minutos. Ano 2015.
Documentário realizado por Francisco Rozados para o Concelho de Forcarei.

4.-Um livro de homenagem a Chano Pinheiro.
Duração: 3 minutos. Ano 2020.

5.-Chano Pinheiro ou a teima dum sonho (Livraria Couceiro).
Duração: 3 minutos. Ano 2020.

B.-Filmes
1.-Mamasunción.
Duração: 21 minutos. Ano 2012 (realizado em 1984).

2.-Mamasunción (Parte 1).
Duração: 10 minutos. Ano 2008 (realizado em 1984).

3.-Sempre Xonxa.
Duração: 108 minutos. Ano 2013 (longametragem realizada em 1989).

ANÁLISE DA SUA OBRA CINEMATOGRÁFICA

Antologia de seus filmes
1.-O Caminho das estrelas: Ano 1993. 34 minutos.
Argumento: A história de amor entre um lobisomem e uma sereia é o pretexto para mostrar diferentes aspetos da cultura galega. Foi uma encomenda da Conselharia de Cultura que produziu a S.A. de Gestão do Plano Compostela 93, além da última obra de Chano Pinheiro. DVD disponível no CGAI.

2.-Esperança: Ano 1986. 34 minutos.
O problema do alcoolismo no pai de uma  família é visto da perspetiva de uma criança. Representou a Espanha no Prémio de Curtas-metragens da CEE em 1987. Chano foi realizador e roteirista.

3.-Eu, o tolo: Ano 1978. 110 minutos.
A vida de Eu desde criança até chegar a presidente do governo, passando pelo cárcere.

4.-Mamasunción: Ano 1984. 21 minutos.
Uma velha vê passar os dias sem que lhe cheguem notícias do seu filho, emigrado há muito tempo na América. Uma olhada lírica e crítica sobre os efeitos da diáspora galega. DVD disponível no CGAI.
Grande prémio do cinema espanhol e troféu do Instituto de Cooperação Ibero-americano no XXVI Festival Internacional de Bilbao (1984). Prémio da Crítica na Seção de Artes e Ciências da Representação na Galiza (1985). Prémio da Federação Internacional de Críticos em Oberhausen (1985). Prémio da Federação Internacional de Cineclubes de Cracóvia (1985). Grande prémio de curtas-metragens em Figueira da Foz (1985). Segundo filme mais votado pelo público no festival de Sidney (1985). Grande prémio do festival de Tetuán (1986).

5.-Os pássaros morrem no ar: Ano 1977. 34 minutos.
Uma menina quer fazer uma ponte entre dois montes, pensando que será uma vantagem para o seu povo. Na procura de ajuda vai encontrar-se com Castelão e Basílio Álvarez.
Mereceu o prémio Filme de Ouro do Ministério de Cultura e o de Melhor Roteiro no IV Certame de Cinema Amador de Vila Garcia (1978). Quixote de Honra e segundo prémio do IX Certame Cidade de Alcalá de Henares (1978).

6.-Sempre Xonxa: Ano 1989. 114 minutos.
História de uma mulher, Xonxa, e dois homens, Pancho e Birutas, desde a sua infância no ano 1947 até a sua maturidade no ano 1986. A emigração nas suas duas vertentes de sucesso e miséria, a complexidade das relações humanas, a lenda que se confunde com a realidade numa aldeia que vai morrendo nos montes de Galiza. Comercializado em DVD com áudio em galego. DVD disponível no CGAI.

CHANO PINHEIRO DENTRO DO CINEMA GALEGO

chano-pinheiro-foto-rodando-0As primeiras projeções cinematográficas (invento dos Lumière) chegaram à Galiza na cidade da Corunha em setembro de 1896, e a Vigo e Ponte Vedra a princípios de 1897. Já mais tarde vão aparecer as primeiras filmagens de imagens de cinema galego, realizadas por José Sellier na cidade herculina, e depois por José Gil na cidade olívica, tendo também em conta a promoção que fez desde Compostela Isaac Fraga, e desde Vigo Cesáreo González com a sua Suévia Filmes. Podemos assinalar que os pioneiros do cinema galego, além de José Gil (1870-1937), que também foi um fotógrafo importante, foram o grande fotógrafo alaricano José Suárez (1902-1974), os irmãos corunheses João Henrique e Ramóm Barreiro, o ourensano António Romám (1911-1989), Manuel Mur Oti (1908-2003), Ramóm Torrado Estrada (1905-1990), Armando Hermida Luaces (1909-1997), Ernesto Diaz Noriega (1912-2002), Amando de Ossório (1918-2001), Manuel Arís Torres (1920-2013), e, muito especialmente, o natural de Cartelhe (Ourense) Carlos Velo Cobelas (1909-1988), que realizou grande parte da sua obra fílmica, primeiro na Galiza antes e depois da República, e mais tarde no seu exílio mexicano.

Os pioneiros do cinema galego, além de José Gil (1870-1937), que também foi um fotógrafo importante, foram o grande fotógrafo alaricano José Suárez (1902-1974), os irmãos corunheses João Henrique e Ramóm Barreiro, o ourensano António Romám (1911-1989), Manuel Mur Oti (1908-2003), Ramóm Torrado Estrada (1905-1990), Armando Hermida Luaces (1909-1997), Ernesto Diaz Noriega (1912-2002), Amando de Ossório (1918-2001), Manuel Arís Torres (1920-2013), e, muito especialmente, o natural de Cartelhe (Ourense) Carlos Velo Cobelas (1909-1988).

Em janeiro de 1973, na primeira edição das Jornadas do Cinema de Ourense, organizadas pelo Cine Clube “Padre Feijóo”, do qual o que assina este depoimento era secretário, toma-se consciência da importância de que a Galiza tenha um cinema próprio, para expressar a sua realidade cultural, educativa, histórica, artística, geográfica e o seu património natural. Colocada esta primeira pedra, foram aparecendo novos realizadores, novos grupos, novos filmes e novos projetos fílmicos. Aproveitando até finais dos setenta e princípios dos oitenta, o poder apresentar os trabalhos fílmicos nas diferentes edições das “Jornadas”. Os mais destacados cineastas e realizadores desta nova época foram Eloi Lozano Coelho, Miguel Gato Luaces, António Simón, Henrique R. Baixeras, Miguel Castelo, Carlos L. Pinheiro, Xavier Vilhaverde, Carlos Varela Veiga, o catalão Lorenzo Soler e, muito especialmente, Chano Pinheiro, que é o que teve maior difusão da sua obra a nível internacional. A continuação foram aparecendo outros realizadores e, entre eles devemos destacar Pilar Sueiro, Juan Pinzás, Luisa Peláez, Alfredo Garcia Pinal, Milagros Bará, Raul Veiga, Héctor Carré, Xavier Bermúdez, Margarida Ledo, Simone Saibene e Oliver Laxe.

TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR

Visionamos os filmes e documentários referidos anteriormente, e depois desenvolvemos um cinema fórum, para analisar o fundo (mensagem) deles, assim como os seus conteúdos.
Organizamos nos nossos estabelecimentos de ensino uma mostra-exposição monográfica dedicada a Chano Pinheiro, importante cineasta da nossa Galiza e lusófono. Nela, além de trabalhos variados dos escolares, incluiremos desenhos, fotos, murais, frases, textos, lendas, livros, vídeos, DVDs e monografias.
Podemos organizar no nosso estabelecimento de ensino um Ciclo Cinematográfico, escolhendo para projetar (com apresentação inicial de cada um e colóquio posterior entre os alunos e docentes espectadores) aqueles filmes mais interessantes de Pinheiro. No ciclo devem ser incluídos, se houver hipótese, os seis filmes realizados por Chano Pinheiro, de 1977 a 1993.

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