O dia 12 de abril, a Faculdade de Filologia da Universidade de Corunha (UDC) acolheu um seminário dedicado à estratégia binormativista, proposta dos próprios estudantes. Assistiram ao seminário o professor da UDC Xosé Ramón Freixeiro Mato e o presidente da AGAL Eduardo Maragoto.
Freixeiro começou a sua exposição comparando os dados dos dois mapas sócio-linguísticos galegos, o primeiro feito no ano 1992 e o segundo no 2004. Nesse período, o galego perdeu quase o 10% de falantes. Aponta o professor da UDC que o galego está, neste momento, numa situação “anormal”, já que a normalização do nosso idioma continua a ser um objetivo a conquistar, por desgraça. De situações anormais, devemos observar todas as opções e escolher aquelas que podam melhorar a situação do nosso idioma. De facto, Freixeiro já menciona o significativo papel que tem o português na Galiza atual, utilizado para distinguir dentro da normativa o que é espanhol, e o que é galego.
Também fez menção a numerosas personalidades históricas que falaram a favor da reintegração da nossa língua. Com certeza, foi mencionada a famosa frase de Carvalho Calero “O galego ou é galego-português ou é galego-castelhano”, mas também outras talvez menos conhecidas pelo público como a opinião de Rafael Dieste de: “Existe entre o galego e o portugués tan estreita afinidade que canto máis portugués é o portugués e máis galego é o galego, mais veñen a se asemellaren”. Todas estas menções, utilizadas por Freixeiro Mato, vêm significar não existir a chamada “Terceira via” para a língua galega. Ou bem nos aproximamos do português, ou a nossa língua será castelhanizada.
Chegamos, depois desta introdução, à exposição sobre a proposta “Binormativista”, de parte de Eduardo Maragoto. O “Binormativismo” consiste na utilização no seio duma sociedade de vários modelos linguísticos diferentes, na maioria dos casos isto consiste num modelo de carácter mais popular, baseado na variedade local e nas suas características próprias, mais “nacional”; e outro mais confluente com as diferentes variedades do sistema linguístico, mais “internacional”. A relação entre estas duas variedades é, normalmente, unidirecional: um suíço entende um alemão porque conhece a sua variedade, mas o alemão não entende o suíço, ao não ser estudada a sua variedade local no país vizinho, o que leva ao suíço a mudar de variedade para se adequar às necessidades do seu interlocutor. Segundo Maragoto, este não é o caso galego, pois há uma grande inter-compreensão entre o galego e o português. Para levar este debate à sociedade, é preciso informarmos ao público galego de outros casos de binormativismo (como Noruega, Suíça, Moldávia/Transnístria, etc.) para que assim saiba que a Galiza não é uma exceção: são muitos os países onde estes casos acontecem, se bem não em todos (último exemplo citado) é uma situação de convivência mas de conflito, mas sempre pondo em consideração que “Binormativismo” é só uma etiqueta, onde cada caso concreto é único, original, e pode ser organizado do modo que a sociedade quiser para satisfazer as suas necessidades. Portanto, o debate deveria ser estendido através do ensino, no que o estudantado galego seria informado das duas normas e das suas vantagens e desvantagens. O objetivo, de se realizar, levaria a uma sociedade onde as duas normativas, tanto a “nacional” como a “internacional”, seriam aprendidas por todos os galegos e o seu uso dependeria só, quer do contexto, quer da consciência do falante.
Depois das duas exposições, o público assistente teve a oportunidade de fazer perguntas e/ou comentários sobre o exposto.
Uma das pessoas mais ativas nesta secção foi o professor da UDC Celso María Alfonso Alvárez Cáccamo, que perguntou por que falava Maragoto de “galego normativo”, já que na Espanha nunca se legislou sobre normativas ou modelos linguísticos (Nenhuma lei dá, desde um princípio, licença à normativa RAG/ILG para ser a única normativa legal e oficial do galego). Maragoto respondeu que ele sempre tenta utilizar a nomenclatura mais estendida, e por esse mesmo motivo preferia a forma “lusista” sobre o nome “reintegracionista”, pois a primeira, se bem tem um matiz negativo, é mais conhecida que a segunda. Também comentou Alvárez Cáccamo sobre a tentativa de reformar o Estatuto de Autonomia depois da vitória do Bipartito PSOE/BNG nas eleições do ano 2005: segundo o professor, tentou-se, ao menos, introduzir uma referência à língua portuguesa, mas esta reforma não foi adiante devido à pressão do PP. Por conseguinte, para Alvárez Cáccamo, fica claro que para o reintegracionismo triunfar, este deve dar-se numa Galiza independente, e não dentro do marco legal e social da Espanha atual.
Também participou no seminário o editor do PGL Ernesto Vázquez Sousa. Defendeu que não devia o reintegracionismo centrar-se tanto na escrita, mas procurar um modelo semelhante ao árabe, onde um único modelo escrito leva vários modelos orais segundo o país. Logo, é possível termos a mesma grafia e escrita que os portugueses e brasileiros, ao mesmo tempo que desenvolvemos uma variedade oral própria.
Maragoto teve também de responder dúvidas sobre quais eram as duas normativas propostas neste modelo binormativista. Em concreto, perguntou-se pelo papel que teria a escrita tradicional reintegracionista, também chamada de Normativa AGAL, num modelo que semelhava que só tinha como elementos o modelo português e o modelo RAG/ILG como próprio. Maragoto respondeu que isto era suposição do próprio questionador, pois na realidade o binormativismo é, nesta altura, uma proposta. Depois de levar ao povo o debate ortográfico e normativo, a própria sociedade galega teria de decidir qual seria o modelo binormativista mais aconselhado. Para Maragoto, quem tem de decidir sobre esta mudança não é o reintegracionismo, minoritário pelo de agora, mas a sociedade galega no seu conjunto.
Issac Lourido Hermida, também professor da UDC, chamou a atenção à necessidade de ouvir opiniões do estudantado, já que este foi quem organizou o ato. De entre os comentários tirados dos interventores que pertenciam ao estudantado da Faculdade de Filologia da UDC ponho o meu foco numa anedota contada por uma estudante: Quando Tuenti (rede social) teve uma versão em galego por primeira vez, nesta não se utilizava a forma normativa “Gústame isto” mas a forma reintegracionista/aportuguesada “Gosto disto”. Desconhecemos se isto foi um erro, ou foi algo intencional. Quando o seu círculo pessoal pôs o Tuenti em galego, todos os seus companheiros começaram a utilizar a forma “Gosto disto” na sua fala coloquial, por influência do site web.
Em verdade, esta anedota ajuda-nos no esforço de normalizar a nossa língua, pois conseguiu algo que muitas outras estratégias até agora utilizadas não conseguiram: alterar o comportamento do público galego. Se conseguirmos desenvolver teorias arredor de quais são os principais agentes de influência na sociedade atual, podemos fazer um melhor lavor com os poucos meios dos que atualmente dispomos.
O ato, em geral, foi positivo à hora de informar duma outra maneira de conceber a nossa língua e a nossa política linguística. Porém, a falta de tempo impediu de que Maragoto explica-se de maneira definida a opção binormativista e deixou uma imagem pouco clara arredor de determinados fatores, por exemplo, quais seriam as normativas a propor para esta nova convivência, pois a apresentação inicial de Maragoto deu a entender que estávamos a falar da normativa RAG/ILG e a normativa portuguesa, mas o próprio PowerPoint utilizado estava em normativa AGAL, o que levou à pergunta que começou os comentários do público: qual seria o papel à normativa AGAL em tudo este processo. Ademais a esta se poderia ter acrescentado uma outra sobre qual posicionamento deveria ter o reintegracionismo fronte o Acordo Ortográfico de 1990, pois lembremos que o nosso país vizinho, do que se tiraria a denominada “norma internacional”, esta curiosamente num processo de mudança da escrita que não está livre de polémicas.
Dos numerosos exemplos de casos binormativistas, tanto Maragoto como Freixeiro focaram-se no caso noruego, entre as normativas Bokmål e Nynorsk (Também chamada esta segunda no mundo lusófono com o seu nome traduzido: “Novo norueguês”). Porém, não se trataram casos que, como o galego, tivessem o estigma associado de serem línguas ameaçadas, em processo de se substituírem por outras.