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A receção da nomeação de Chico Buarque ao Prémio Camões

chico-buarqueO ano passado, 2019, foi anunciado que Chico Buarque de Hollanda ia receber o Prémio Camões. O escritor e cantor brasileiro foi premiado tanto pela sua obra literária como também pelo seu lavor musical. A cerimónia de entrega, se bem estava planeada inicialmente para o 25 de abril deste ano (portanto, fixado para a mesma data do aniversário da Revolução dos Cravos em Portugal), pode ficar atrasada se a situação de quarentena atual continuar.

Para fazer um breve resumo da sua trajetória, Chico Buarque é um dos mais destacados músicos e escritores brasileiros. Também é conhecido pela sua atuação no âmbito político, sendo uma das principais figuras da esquerda no país e partidário do Partido dos Trabalhadores, do que os seus pais foram fundadores. Isto, no processo de viragem política que está a suceder no país, colocou o motivo da notícia não só no debate literário mas também no político, sendo Chico Buarque acusado não tanto pela sua condição de músico (e que, portanto, não “mereceria” um prémio literário) como de escritor engajado, comprometido em causas políticas.

O governo de Jair Bolsonaro, mais uma vez, interveio no campo cultural. A reação de Bolsonaro de não firmar o documento do Prémio, que tradicionalmente é assinado pelos presidentes de Portugal e o Brasil (os dois países que organizam o Prémio Camões), captou muita atenção mediática mas talvez não seja o mais preocupante da situação. São sinais mais claros de censura por parte da administração Bolsonaro os vários atos no estrangeiro de promoção de Chico Buarque e a sua obra que foram boicoteados pelas embaixadas do Brasil. Também é alarmante que, enquanto observamos respostas negativas à intervenção de Jair Bolsonaro fora do Brasil, nomeadamente de Mia Couto, quem anunciou a procura dum consenso entre os premiados com esta distinção para a publicação dum comunicado coletivo frente ao que considera de “ataque”; dentro do Brasil encontramos muitas menos reações à notícia.

São sinais mais claros de censura por parte da administração Bolsonaro os vários atos no estrangeiro de promoção de Chico Buarque e a sua obra que foram boicoteados pelas embaixadas do Brasil.

Os motivos detrás desta falta de posicionamentos poderiam ter várias causas. Duma banda, consideramos que alguns agentes, uma vez tendo intervindo Bolsonaro na nomeação de Chico Buarque, poderiam procurar uma maior autonomia para o campo literário ao não se posicionar num debate que eles consideram político. Por outra banda, temos de considerar o medo e incerteza que provoca a afirmação de Bolsonaro. Como já comprovamos neste último ano, o presidente do Brasil e outros agentes próximos ideologicamente têm participado ativamente no campo cultural, censurando atos e obras (um dos últimos exemplos foi a tentativa falida de tirar da Netflix o especial de Natal do grupo humorístico Porta dos Fundos), eliminando o Ministério de Cultura e ameaçando com eliminar instituições de promoção cultural, como a Agência Nacional de Cinema, também conhecida como Ancine. Estes exemplos de intervenção no sistema cultural e literário formam parte do programa ideológico e político do novo governo: a chamada de “guerra” contra o “Marxismo cultural”, que muitos agentes próximos a Bolsonaro, como Olavo de Carvalho, afirmam está presente nas instituições educativas e culturais brasileiras.

Este trabalho, portanto, que inicialmente foi dirigido a captar as tensões produzidas na atribuição do Prémio Camões a Chico Buarque pela condição do agente de cantautor, a sabermos se existia ou não um setor do campo cultural brasileiro que negava a condição de literato dum cantante ao considerar uma barreira entre o que seria “poesia” propriamente e as letras das canções; os resultados mostraram mais bem a repercussão que teve e vai ter no sistema literário brasileiro a chegada ao poder de Jair Bolsonaro, que coincidiu no mesmo ano que a eleição de Chico Buarque para o prémio. De facto, só encontramos uma única fonte, um artigo da autoria de Ademir Luiz, onde se critica a Chico Buarque não pelo seu posicionamento no campo político mas que, ainda sendo um “gênio” na música, o autor carece de “qualidade” como escritor, e portanto não merece um prémio “literário”.

 

Outro facto que parece indicar que as reações negativas à nomeação de Chico Buarque são provocadas pelos seus vínculos com a esquerda e o Partido dos Trabalhadores é a profunda diferença de opiniões dentro e fora do Brasil. Enquanto dentro do Brasil existe debate acerca de se Chico merecia ou não o Camões, fora do Brasil só encontramos posicionamentos positivos cara a nomeação, mesmo alguns chegaram a opinar que Chico Buarque não só merecia o Camões mas também o Nobel, fazendo uma comparação entre o cantor e escritor brasileiro e o norte-americano Bob Dylan, premiado com o Nobel no ano 2016 com uma obra quase exclusivamente musical.

Enquanto dentro do Brasil existe debate acerca de se Chico merecia ou não o Camões, fora do Brasil só encontramos posicionamentos positivos cara a nomeação, mesmo alguns chegaram a opinar que Chico Buarque não só merecia o Camões mas também o Nobel, fazendo uma comparação entre o cantor e escritor brasileiro e o norte-americano Bob Dylan, premiado com o Nobel no ano 2016 com uma obra quase exclusivamente musical.

É um assunto, porém, muito atual e que ainda fica por finalizar. Tentei, no trabalho, recolher o máximo número de fontes possíveis para analisar as diversas opiniões sobre o assunto. Também procurei nova informação sucedida depois da elaboração do trabalho em janeiro deste ano, mas não encontrei nada de interesse. Se alguém tiver acesso a outras fontes que puderem ter informação mais atual ou proveniente de fontes menos centrais, ficaria muito agradecido se indicassem através de enlace nos comentários a este artigo.

Este trabalho, elaborado inicialmente para a cadeira de Teatro e Espetáculo do Mestrado de Literatura, Cultura e Diversidade, não teria sido possível se não fosse pela direção do professor da UDC Carlos Caetano Biscainho Fernandes, que propôs o tema e esteve presente durante todo o processo de elaboração.

Finalizo considerando que, talvez, para futuras investigações acerca das tensões provocadas no campo cultural pela nomeação de cantautores a prémios literários, seria bom contrastarmos a informação adquirida neste caso com a doutros agentes que, se bem têm uma extensa obra como letristas, carecem de atividade editorial. Um exemplo magnífico que apareceu na própria investigação foi Bob Dylan, de quem a obra publicada, excluindo recompilações das suas letras e auto-biografias, reduz-se ao livro de poesia experimental Tarantula (1971), pelo que não recebeu nenhum reconhecimento.

Disponibilizo através desta plataforma o trabalho inteiro, onde ofereço mais informação e também, para quem quiser comprovar os dados anteriores, está a bibliografia com as fontes de onde os tirei.

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