Xosé Iglesias é carteiro. Nasceu em Novegilde, uma aldeia do concelho do Vale do Duvra e é sócio de ADEGA e delegado sindical da CIG no seu centro de trabalho. Define-se como comunista, anti-imperialista e nacionalista e adora xadrez, fotografia e natureza. Não perde o tempo e oferece-nos aqui um top-6 de material audiovisual ótimo para os nossos miúdos e miúdas.
Nasceste na paróquia de São Romão, no concelho do Vale do Duvra. Como foi o teu relacionamento com o galego?
Natural. Na minha paróquia nunca se falou espanhol. É mais, dentro do concelho do Vale do Duvra (excepto a capital Bembivre, o médico e mais o cura) nunca se ouviu falar outro idioma que não fosse o galego, e isso que é um concelho limítrofe com Compostela.
Em que momento isto mudou e que supujo em ti esta mudança?
Sofri a espanholização pertinente quando me meteram no Seminário Menor em Compostela para cursar o BUP, botei anos traduzindo na minha cachola palavras e frases ao espanhol.
Hoje és carteiro. Se tivesses de fazer um livro sobre o teu emprego e a língua galega, que nos contarias?
Contaria a roça ideológica intencionada que fazem da nossa toponímia e dos roteiros de ruas, a facilidade que encontra o poder estabelecido para através dos meios de comunicação fazer renegar à gente do seu.
Sem dúvida, denunciaria como é posível que a gente siga recebendo cartas com nomes de ruas franquistas que hoje já não existem (“calle General Mola”, “calle Generalísimo Franco”, “Primo de Rivera”, “General Aranda”, etc…). O mais fedento que cheguei a ver foi uma missiva enviada ao Valedor do Povo situado na rúa do Hórreo de Compostela, rua que a pessoa tinha traduzido por “calle del Granero”. São os casos mais chamativos mas a diário vem-se autênticas barbaridades dignas de denunciar.
Também destacaria a boa consideração da que goza este ofício e o trato sempre amável do povo ao que prestas serviço. Eu gosto do trato com a gente e desfruto do meu trabalho sendo um ator diário mais das suas vidas. Dás-te conta de que para chegar á alma da gente não há nada como falar-lhe a língua que mamaram de cativos e cativas; aí começa parte da relação de confiança mútua.
És sócio de ADEGA e delegado sindical da CIG. Como pessoa participativa no ativismo social e político, como achas a perceção dos galegos e galegas para com estes movimentos?
A maioria da gente não se sente identificada com nenhum movimento associativo que não lhe produza lucro económico, quer dizer, achegamo-nos ao sindicalismo quando temos um problema laboral (normalmente demasiado tarde) e lembramo-nos da natureza quando vemos que não temos monte.
Os movimentos sociais estão intencionalmente desprestigiados e só a consciência faz que as pessoas cheguem a eles. Considero que o ativismo deveria formar parte de todo indivíduo.
Adoras xadrez, formas parte dum clube em Compostela e competes na Liga Galega de Xadrez. Por que gostas deste desporto? Achas que há vida mais além do futebol?
O futebol hoje em dia é um instrumento mais do sistema. Eu gosto do xadrez e pratico-o desde os seis anos porque na escola pública de Porto Mouro houve uma série de mestres que nos ensinaram todo o tipo de desportos. Quem jogava ali ao futebol era porque não servia nem para o atletismo, nem para o ténis de mesa, nem para o voleibol, nem para… eu que sei, havia de tudo!
O xadrez tem de mau que precisas mais tempo que outros desportos para começar a desfrutar dele, precisa mais tempo de aprendizagem, mas uma vez tenhas uns conhecimentos mínimos pode chegar a ser aditivo e não estaria mal que se lecionasse nas escolas como matéria. Tem muitos benefícios.
Tens duas miúdas e vontade de compartilhar com elas a língua da Galiza. Que medidas tomas para o conseguir? Dora, a aventureira é uma aliada?
Isso é todo um mundo. Criar as tuas filhas na língua do teu país é quase impossível. Custa-nos muitíssimo encontrar coisas audiovisuais em galego e na TV da casa se não há Xabarín muda-se ao idioma do canal de áudio da TDT – a inglês (vantagens da tecnologia). A ver quando podemos receber o sinal das TV de Portugal!
Utilizamos muito material de um disco rígido que temos ligado à TV e quase tudo está em português do Brasil. É-nos muito fácil o brasileiro, e por fazer um top de audiovisual para miúdos e miúdas.
- A Galinha Pintadinha (as crianças estão fartas de vê-la!)
- Peppa Pig (em português do Brasil)
- Dora,a aventureira (em português do Brasil, também)
- Xana Toc-Toc
- Paco Nogueiras com o seu Brinca Vai!
- Panda e os Caricas
E não continuo por não aborrecer, mas… tenham filhos e saberão o complexo que é dar-lhes a nossa língua.
Que opinas de um projeto de ensino em galego como Semente?
Único. Acho que se a Semente não conseguir continuísmo passará à história como o fracasso de um povo. Que outra opção tem alguém para educar as crianças em galego e receber a tradição cultural do seu país? Teríamos de pedir-lhe ao senhor Wert que assumisse os custos da Semente para aqueles pais e mães que não tenham garantido o ensino público em galego dos seus filhos e filhas!
Que visão tinhas da AGAL e como deste o passo para o galego internacional?
Já conhecia a AGAL por um mestre de galego que tive (um tal Souto) e a proximidade com a gente deste projeto fez-me chegar até aqui.
És um grande aficionado por fotografia. Como gostarias que fosse a ‘fotografia linguística’ da Galiza em 2020?
A fotografia sobretudo é sentimento. Se a imagem não diz nada (dá igual o dinheiro que custasse a câmara fotográfica ou o boa que fosse a impressão) tudo será embalde por muito retoque que tiver.
A fotografia linguística da Galiza em 2020 há de ser em branco e azul.
Conhecendo Xosé
- Um sítio web: www.sermosgaliza.gal
- Um invento: A escrita
- Uma música: Tradicional (Recomendo uma orquestra galega de música tradicional: Sondeseu)
- Um livro: A memoria da Choiva, de Pedro Feijoo.
- Um facto histórico: Está por chegar: a República da Galiza
- Um prato na mesa: Bacalhau à Zé do Pipo
- Um desporto: Xadrez
- Um filme:Memoria del saqueo, de Pino Solanas
- Uma maravilha: Galiza
- Além de galego: Operário