O passamento de José Paz, em abril de 2021, deixou-me estuporado. Mais do que já estava. Vinha sobre outras tristuras, hesitações e preocupações sobrevindas e inesperadas que me tiveram ultimamente meio paralisado. Demorei demais em escrever isto, em pagar, dalgum jeito, o respeito devido.
O Paz era – acho- uma dessas pessoas que vão entrando, aos poucos, nas nossas vidas. Nas que não reparas no primeiro encontro, mas que vão se fazendo com a nossa atenção discretamente, até sabermos com toda a cordialidade do mundo que estão aí. A pouco que botemos um olho a velhos números da AGÁLIA, a fotografias e documentos de atos educativos, culturais e reintegracionistas, nomeadamente em Ourense, topamos, sem falta com o sorriso e presença do Paz.
Na minha foi entrando, assim. Como referência na palavra dos amigos, de uma pessoa muito ativa no reintegracionismo histórico, de um pedagogo e professor em Magistério, que como mestre de mestres fora deixando por muitos anos uma impronta de saber e também de simpatia e humanidade. Depois, através desse espaço formativo e associativo tão importante como é o PGL, e mais adiante na AGLP e noutras aventuras, foi-nos acompanhando tanto como prolífico escritor quanto companheiro, durante muitos anos.
As aulas no cinema, deveu ser a seção mais longeva e produtiva do PGL. Depoimentos com caráter de fichas e resumos sintéticos que apresentavam recomendações audiovisuais e documentais para destacar momentos, figuras, elementos culturais, propostas e que apareciam semanalmente com contadíssimas ausências e tudo o mais demoras. Todas as falhas devidas não a descuido quanto a problemas técnicos ou informáticos, ou às demoras causadas nas revisões que chegavam tarde ao também muito cumpridor e nunca pago como mereceria do Salvador Mourelo, acontecidas pelas suas desconexões e nas viagens à India e pelas suas estadias no campus tagoreano de Santiniketon, onde passava vários meses todos os anos e mais depois do seu aposentamento.
As aulas no cinema, deveu ser a seção mais longeva e produtiva do PGL. Depoimentos com caráter de fichas e resumos sintéticos que apresentavam recomendações audiovisuais e documentais para destacar momentos, figuras, elementos culturais, propostas e que apareciam semanalmente com contadíssimas ausências e tudo o mais demoras.
Nesta sua seção apareceram pedagogos, artistas, escritores da Lusofonia, personagens galegas e universais dos séculos XX e XIX, do mundo das Ciências, das Artes, da Música, do pensamento, antigos, clássicos e modernos da filosofia e momentos estelares do Cinema. As escolhas sempre eram suas e refletem um gosto bem heterogéneo e uma tolerância que muitas vezes surpreendia, e pelas que nalguma ocasião temos debatido, pela sua oportunidade ou matiz. Mas ele sempre sabia explicar as razões e terminava por me convencer.
Não existia, para além, no espaço peninsular um trabalho destas características. Falávamos por vezes, de selecionar e reunir As aulas no cinema. Da importância de usar aqueles pequenos trechos fílmicos, de projetar em destaque o grande cinema ou de fazer uso dos documentários para focar a aprendizagem. Ele sabia bem pelos seus mais de 35 anos no Cineclube Padre Feijó de Ourense e por ter também na sua biblioteca uma importantíssima coleção de livros e folhetos dedicados ao cinema. Coleção, talvez a mais importante em mãos privadas, com a que tinha o projeto (algum dia que infelizmente não chegou) de alguma das suas doações nalguma instituição especializada.
A mais importante achega, porém, para mim, é o conjunto com aquelas referidas a modelos, exemplos, publicações, escolas, projetos educativos, instituições educativas, filósofos e pedagogos de tipo experimental, humanístico, reformador. Muitas delas desse período fascinante e bastante apagado da memória coletiva que foi o mundo de entre guerras mundiais.
Estes exemplos e modelos pedagógicos, tagoreanos, socráticos, republicanos, pensados populares (por mais que fossem na prática experimentais e elitistas), críticos e de avançada, configuravam um acervo fascinante. E também uma réplica e defesa ante este modelo educativo que se foi impondo pelo Estado Espanhol em que andamos e que nos tem submersos e sem ar: sujeitos a valores, objetivos, resultados, terminologias, vindos do mundo da empresa e medidos por indicadores de processos próprios da produção capitalista.
Estes exemplos e modelos pedagógicos, tagoreanos, socráticos, republicanos, pensados populares (por mais que fossem na prática experimentais e elitistas), críticos e de avançada, configuravam um acervo fascinante.
Era uma cousa boa reunir as mais delas nalgum tipo de espaço ou volumezinho. Sempre pensei que podiam ser de muita utilidade como manual ou repertório modelo numa escola galega e nomeadamente nas Sementes. Eu teimava, porém ele achava que eram simples cópia cola, dados reunidos das seções de referência e manuais diversos. Eram fichas para leitura e debate nas aulas, assim estavam concebidas. Não se importava muito com as formas, quanto com a divulgação. Predominava a vocação do magistério e divulgação de cineclube.
Era uma cousa boa reunir as mais delas nalgum tipo de espaço ou volumezinho. Sempre pensei que podiam ser de muita utilidade como manual ou repertório modelo numa escola galega e nomeadamente nas Sementes.
E estes artigos, que tanto custava editar, maquetar e ilustrar, e que não tinham o eco de comentários, debate e espelho noutras redes sociais galegas, tinham uma quantidade fabulosa de leitores. Era procurar nos dados estatísticos do portal. Os mais deles vinham de fora da Galiza. Muitos deles do Brasil e de Portugal. Atingiam, pelo que fomos analisando, estudantes de escolas de Magistério ou Educação. A futuros mestres e mestras que consumiam com voracidade esses materiais que o Paz ia deixando e que de passagem atraíam o foco da Lusofonia ao PGL e, portanto, ao reintegracionismo e à Galiza.
Ao abrir o PGL, tenho saudades dos correios, dos postais e cartas do Paz, dos seus projetos e escolhas em foco; saudades do seu sorriso e do seu magistério discreto.