Hoje aconteceu-me algo que já nem pensava que pudesse acontecer: uma jovem, ao me despachar pan numa loja chamou-me «palhaça» por falar em galego. Ainda , segundo ela, faltei-lhe ao respeito simplesmente por lhe perguntar o preço do pão em galego.
– Quanto é?
– ¿Cómo? ¿Cuanto es?
-Não. Disse «quanto é?», em galego.
– Es que yo no hablo gallego. Estamos en España.
– Pois aqui estamos na Galiza. Podemos falar castelhano no resto do Estado, mas só galego aqui.
– Yo ni lo sé ni quiero saberlo.
– Sabes o quê? Já não levo o pão.
Ao sair eu pela porta escutei:
– ¡Payasa!
Voltei-me e perguntei-lhe donde é que era.
– De Lugo.
– E não tens vergonha de não saber galego? Não tens vergonha de ofender os teus avôs, os teus pais, a ti mesma?
– No no tengo ninguna vergüenza: soy espanhola y esoes lo que tengo que hablar. Usted me faltó al respeto [suponho que lho faltei por lhe falar em galego].
Ao sair à rua, várias mulheres, em idade madura como eu, aplaudiram e comentaram: «tem razão: assim é que deveríamos defender o nosso».
Casos como este, cuido eu, são os que provocam as poses extremistas. Eu sou já experimentada. Dei aulas muito tempo e tenho visto de tudo. Mas manca-me ver que gente nova sinta vergonha da própria cultura e de se reconhecer galega, o que não implica, para nada, ser solidária com outros povos e outras gentes, nem ignorar outras línguas, coisa que sempre foi enriquecedora.
Que educação demos à nossa mocidade para que abandone a língua de seus pais, a cultura de seus avôs e avós, e prefiram auto-castrar-se da própria cultura?
O saber não ocupa lugar. Isso é um axioma que se demonstra verdadeiro, nomeadamente para a gente culta. Mas eu queria que isso fosse compreendido pela generalidade da população e, ainda, assumido como norma de abertura e de tolerância para nós próprios e para outras línguas e outras culturas. Na Espanha há um grande défice em conhecimento de línguas; onde mais domínio de idiomas estrangeiros encontrei foi em Barcelona —será porque os catalães, ao se quererem a si próprios, aprederam a ter a mente aberta para outras culturas?
Não nos fechemos a nós mesmas. Não deixemos crescer o complexo de inferioridade que nos priva de abrir-nos aos outros/as e de compreender a diversidade linguística e cultural que faz parte da diversidade da vida.
Digamos «viva!» à cultura e à dignidade de sermos nos próprias!! Irá-nos muito melhor. Sabido é que à Galiza não lhe vai por agora nada bem, se a compararmos com o conjunto das terras da Espanha. Mudemos de atitude e , se calhar, irá-nos melhor.