O Prémio Carvalho Calero e o silêncio

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carvalho-calero-premioEm 1990, ano da morte de Ricardo Carvalho Calero, a Sociedade Cultural Medúlio e o Concelho de Ferrol convocárom a primeira ediçom do Prémio de Criaçom Literária e de Investigaçom Linguística e Literária que leva o nome do professor ferrolano. Tanto a denominaçom como a periodicidade do prémio fôrom experimentando diferentes alteraçons ao longo do tempo mas, dum modo ou outro, conseguiu consolidar-se como umha referência reconhecível no heterogéneo mapa de certames literários que acompanhou o desenvolvimento institucional da literatura galega desde inícios da década de 1980.

Umha das singularidades do prémio mais habitualmente reconhecidas foi a admissom de obras escritas em qualquer umha das ortografias propostas para o galego, até daquelas – vergonha – discriminadas de maneira explícita ou implícita numha maioria dos outros prémios do sistema literário. Mas, além de abrir umha hipótese de publicaçom para as pessoas de prática literária reintegracionista, o Carvalho Calero tivo ao longo da sua história outros valores que paga a pena destacar.

Umha das singularidades do prémio mais habitualmente reconhecidas foi a admissom de obras escritas em qualquer umha das ortografias propostas para o galego, até daquelas – vergonha – discriminadas de maneira explícita ou implícita numha maioria dos outros prémios do sistema literário.

Na modalidade de criaçom, optou por um género pouco frequente neste tipo de certames, a narrativa de ficçom de extensom média – ou novela –, precisamente num momento em que agentes e instituiçons centrais do sistema literário insistiam na necessidade de preencher o enésimo vazio: o do romance, ou narrativa extensa, do qual convinha contar o número de páginas. Umha revisom das pessoas galardoadas nestas três últimas décadas permite-nos completar umha lista muito jeitosa de vozes da narrativa galega contemporânea, entre as quais as de Xoán Ignacio Taibo, Manuel Lourenzo González, Xesús Manuel Marcos, Carlos Quiroga, Xosé Vázquez Pintor, Rosa Aneiros, Xosé Luís Martínez Pereiro, Paulino Pereiro, Paula San Vicente, Henrique Dacosta – vencedor em três anos diferentes – ou Cris Pavón, esta no último ano em que o prémio de criaçom foi outorgado (2014).

Já no que di respeito à modalidade de investigaçom, a continuidade no tempo do Carvalho Calero permitiu a publicaçom dum número significativo de trabalhos académicos – muitas vezes teses de licenciatura, de mestrado ou de doutoramento, mas nom só – que dificilmente veriam a luz por outro meio. A relaçom de pessoas premiadas é também relevante, com destaque para nomes como os de Teresa López, José-Martinho Montero Santalha, Laura Tato Fontaíña, Rexina Vega, Elvira Souto, Henrique Rabuñal, Xosé Manuel Sánchez Rei, Xoán Carlos Lagares, Antonia López García, Roberto Samartim, Raquel Bello, Miguel Louzao Outeiro, Xosé Manuel Maceira, Luís García Soto ou Carlos Caetano Biscainho-Fernandes, este em 2016, último ano em que o Carvalho Calero foi organizado. Nas duas modalidades, a publicaçom das obras pola editora Laiovento foi outro dos fatores que contribuírom para o prestígio do prémio, tarefa assumida em 2016 pola editora ferrolana Embora.

Em coerência com a periodicidade bianual estabelecida nos últimos anos, o certame devia ser convocado em 2018 – governo municipal de Ferrol en Común –, mas isso nom aconteceu. Também nom foi recuperado neste 2020, nem temos notícia de que o prémio tenha estado na agenda do Concelho de Ferrol ou do tecido associativo mais ativo na defesa do legado de Carvalho Calero.

Em coerência com a periodicidade bianual estabelecida nos últimos anos, o certame devia ser convocado em 2018 – governo municipal de Ferrol en Común –, mas isso nom aconteceu. Também nom foi recuperado neste 2020, nem temos notícia de que o prémio tenha estado na agenda do Concelho de Ferrol ou do tecido associativo mais ativo na defesa do legado de Carvalho Calero. Podemos pensar – sabemos, de facto – que a vertente do Carvalho investigador é das que mais dificilmente converge com o modelo de comemoraçom próprio do Dia das Letras Galegas. Mas pôr o foco no Carvalho crítico, historiador, teórico, gramático ou sociolinguista, deveria significar estudar e conhecer bem os seus trabalhos, revisa-los criticamente e com independência de critério – temos hoje boas condiçons para o fazer –, e abrir no espaço académico debates para pensar a língua, a literatura e a cultura galegas com as ferramentas próprias do nosso tempo. Para algumhas dessas cousas contribuiu, dum modo ou outro, este Prémio Carvalho Calero abandonado – por quem?, porquê? – sem mais explicaçom que um silêncio que tanto envergonha os responsáveis diretos como quem nom alçámos a voz para perguntar, para denunciar, para exigir.