O ensaio Areanegra na Casa Encantada, editado polo Concelho de Compostela e por Edicións Positivas, foi reconhecido com um acesit nos prémios da Semana do Livro de Compostela (SELIC) de 2022. O subtítulo descreve com precisom os conteúdos da obra: “A cadea humana na Costa da Morte e o papel fulcral dos centros sociais autoxestionados no tecido asociativo urbano e na organización das actividades de Areanegra”. A autora é Puri Cabido, professora no ensino secundário e militante feminista de longa data, que articula o livro a partir da sua experiência no coletivo Areanegra, que juntou docentes do primário e do secundário no âmbito do movimento Nunca Mais.
A autora é Puri Cabido, professora no ensino secundário e militante feminista de longa data, que articula o livro a partir da sua experiência no coletivo Areanegra, que juntou docentes do primário e do secundário no âmbito do movimento Nunca Mais.
A primeira parte do ensaio está dedicada à Casa Encantada, histórico centro social okupado que iniciou a sua andaina em 1991 numha antiga escola unitária no bairro do Sar, em Compostela. Durante mais de umha década acolheu entre as suas paredes a atividade de diferentes organizaçons, famílias e sensibilidades políticas. De PreSOS Galiza a Mulheres Nacionalistas Galegas, passando pola Marcha Mundial das Mulheres ou o coletivo antimilitarista ANOC, entre bastantes outras. Tal e como refere a autora, a Casa Encantada mantivo a sua atividade, num início, graças a um acordo com o Arcebispado de Compostela, proprietário do prédio. No ano 2000, o imóvel é vendido a umha construtora, que inicia a batalha legal para proceder ao despejo do coletivo. Apesar da resistência, a expulsom definitiva e a demoliçom da casa consumam-se em agosto de 2003.
Oito meses antes do despejo, o 1 de dezembro de 2002, tinha lugar nas ruas de Compostela a mais grande manifestaçom contra a gestom política do naufrágio do petroleiro Prestige e da posterior maré negra. Nesse mesmo dia, segundo o pontual relato de Puri Cabido, surgiu o coletivo Areanegra, integrado inicialmente por umha dezena de docentes que pretendia inserir a açom reivindicativa do movimento Nunca Mais no trabalho diário das aulas. A atividade do coletivo, centralizada na Casa Encantada e que contou com a decisiva ajuda do pessoal do laboratório de informática ali instalado, centram a segunda parte do ensaio. Graças ao compromisso das pessoas inicialmente envolvidas e de um número significativo de docentes e centros, a açom de Areanegra conseguiu estender-se um pouco por toda a Galiza.
A atividade do coletivo, centralizada na Casa Encantada e que contou com a decisiva ajuda do pessoal do laboratório de informática ali instalado, centram a segunda parte do ensaio.
Para além do desenvolvido nas aulas, o coletivo marcou-se como objetivo fazer um grande evento, participativo, que funcionasse como símbolo da sua luita. A cadeia humana já referida tivo lugar o 22 de janeiro de 2003 e juntou perto de 50.000 alunas e alunos de dezenas de institutos de toda a Galiza, deslocadas à Costa da Morte em 850 autocarros para, de mans dadas, estender-se por 40 quilómetros ao longo das zonas mais afetadas pola maré negra. Simultaneamente, fôrom organizados atos simbólicos nas suas escolas para o alunado de primário. O éxito da iniciativa encontrara, porém, numerosos entraves por parte da Conselharia da Educaçom da Junta da Galiza. O boicote, que fora ativado já muito cedo para evitar qualquer simbologia do Nunca Mais nos centros de ensino, chegou ao ponto de torpedar a participaçom das companhias de transporte no evento, polo que foi preciso recorrer a companhias de outros pontos da península ibérica.
A cadeia humana já referida tivo lugar o 22 de janeiro de 2003 e juntou perto de 50.000 alunas e alunos de dezenas de institutos de toda a Galiza, deslocadas à Costa da Morte em 850 autocarros para, de mans dadas, estender-se por 40 quilómetros ao longo das zonas mais afetadas pola maré negra.
A atividade pública de Areanegra continuou durante bastante tempo mais, oficialmente até 2006, ainda que de modo muito exíguo já desde 2004. No seu último período organizou iniciativas no âmbito escolar contra a invasom do Iraque, propostas de pedagogia inovadora e transformadora como “O camiño ao revés” ou posicionamentos públicos como a denúncia contra Jesús Ares, alcalde de Toques, condenado por abusos sexuais contra umha adolescente.
O livro de Puri Cabido tem um enorme valor, por oferecer umha interessante crónica de umha parte do movimento Nunca Mais que costuma ser secundarizado nas narrativas legadas. Trata-se de um ensaio de escrita direta e eficaz, longe de qualquer presunçom academicista. O facto de estar escrito a partir da experiência pessoal outorga-lhe, aliás, um sabor de autenticidade e honestidade realmente incomum.
Trata-se de um ensaio de escrita direta e eficaz, longe de qualquer presunçom academicista. O facto de estar escrito a partir da experiência pessoal outorga-lhe, aliás, um sabor de autenticidade e honestidade realmente incomum.
O ensaio, na sua brevidade, tem ainda o mérito de nos fazer pensar sobre outros assuntos de plena atualidade. Neste sentido, a reconstruçom da história da Casa Encantada translada-nos ao momento em que Compostela começava a ser dominada pela atual hegemonia jacobeia. A atividade de Areanegra leva-nos a refletir sobre as possibilidades de umha transformaçom social real a partir do ensino público e dos seus condicionantes institucionais. O próprio testemunho pessoal inclue umha reflexom de fundo sobre o que mudárom as experiências militantes nos últimos vinte anos, hoje em dia, talvez, muito mais limitadas em relaçom às margens que permitem os mundos académico e laboral.
[Este artigo foi publicado originariamente no galizalivre.com]