No ano em que celebramos os 40 anos do Estatuto que oficializou o galego, poderá parecer presunçoso unir-se à festa lembrando que a Associaçom Galega da Língua nascia praticamente ao mesmo tempo, entre maio e dezembro de 1981. No fim de contas, ninguém pode negar que, quatro décadas depois, o galego escrito comum guarda mais parecenças com a língua em que está redigido o Estatuto de Autonomia do que com a usada nos Estatutos da AGAL. Permita-se-me, ainda assim, delinear um vaidoso paralelo, por estarmos a só nove dias do evento em que a AGAL homenageará o seu grupo fundador, comemorando aquele 19 de dezembro em que a nossa entidade e a Autonomia realizavam cadansuas sessões constituintes nos compostelanos Centro Dom Bosco e Paço de Fonseca respetivamente.
O Estatuto protagonizou uma das épocas de maior progresso institucional da nossa história, que a língua também acompanhou graças à posterior Lei de Normalización Lingüística, ao início das emissões da CRTVG ou à aterragem do galego nas administrações públicas e no ensino. Com a nossa Lei fundamental, o galego penetrava na realidade de muita gente. Por sua vez, a AGAL significou o passo mais decidido dado por uma parte do galeguismo no sentido de adotar uma ortografia convergente com o português. Tratou-se de uma decisom revolucionária para a melhoria do status do galego, que passava assim de língua regional a internacional.
A AGAL significou o passo mais decidido dado por uma parte do galeguismo no sentido de adotar uma ortografia convergente com o português. Tratou-se de uma decisom revolucionária para a melhoria do status do galego, que passava assim de língua regional a internacional.
É verdade que para a maioria das pessoas interessadas no assunto, o galego promulgado pola Autonomia era o realista e o da AGAL apenas o sonhado, mas também o é que, apesar dos obstáculos administrativos que ainda interferem numa escolha que devia ser pessoal, o galego nunca parou de incorporar utentes pola via reintegrada, que lhes fornecia autonomia e amplas possibilidades comunicativas, reforçadas nas últimas décadas com a abertura das fronteiras e o advento da Internet. Com esta prática, demonstrava-se por fim que o português permitia representar as nossas falas, algo que nom era óbvio antes de 1981 e que por si só já lhes reserva um futuro promissor.
Eis o grande contributo da fundaçom da AGAL à história da língua.
Com esta prática, demonstrava-se por fim que o português permitia representar as nossas falas, algo que nom era óbvio antes de 1981 e que por si só já lhes reserva um futuro promissor. Eis o grande contributo da fundaçom da AGAL à história da língua.
Com ela, o lusismo deixou de ser o anseio de todo um século (Biqueira, Castelao, Guerra) ou ainda as indispensáveis formulações da década anterior (Lapa, Martinho, Carvalho), para converter-se no cultivo ininterrupto de um galego inteiramente coordenado com o espaço lusófono. Numa etapa em que o populismo linguístico imperante fomentava a desconexom, este passo prático contribuiu a manter o vínculo das nossas falas com o seu passado e com o seu futuro, com a língua histórica galego-portuguesa:
Por um lado, ajudou a consolidar um modelo mais genuíno e estável de língua entre os seus utilizadores conscientes, moderando o uso de castelhanismos propagados com cada acontecimento noticioso ou evitando que se consolidassem muitos diferencialismos hiperenxebristas.
Numa etapa em que o populismo linguístico imperante fomentava a desconexom, este passo prático contribuiu a manter o vínculo das nossas falas com o seu passado e com o seu futuro, com a língua histórica galego-portuguesa: Por um lado, ajudou a consolidar um modelo mais genuíno e estável de língua entre os seus utilizadores conscientes, moderando o uso de castelhanismos propagados com cada acontecimento noticioso ou evitando que se consolidassem muitos diferencialismos hiperenxebristas.
Por outro lado, facilitou o emprego do galego a tempo inteiro. Contra o conformismo de um uso só cultural ou político, o reintegracionismo permitiu aos seus utentes usufruírem a língua também nos âmbitos comercial, científico ou no lazer tecnológico, onde o utópico era a presença de um galego desvinculado do português.
Nesta fatigante viragem de século que está a atravessar a língua, o impulso institucional que o Estatuto deu ao galego após séculos de decaimento, apesar de bem real, mal conseguiu aliviar a teimosa apatia social que abafa o idioma, de maneira que hoje seguramente poucos realistas quereriam acordar para sempre do sonho reintegracionista. E se afinal o sonho acabasse por ser mais realista do que a própria realidade? E se a fórmula para devolver interesse polo galego a quem já o perdeu fosse oficializar uma segunda forma de viver o galego, internacional ou português de seu nome?
o impulso institucional que o Estatuto deu ao galego após séculos de decaimento, apesar de bem real, mal conseguiu aliviar a teimosa apatia social que abafa o idioma, de maneira que hoje seguramente poucos realistas quereriam acordar para sempre do sonho reintegracionista. E se afinal o sonho acabasse por ser mais realista do que a própria realidade?
Chegará o dia, e muito deveremos entom aos 94 sonhadores e sonhadoras que a AGAL reuniu em 1981, muitos deles escritores e escritoras que arriscavam a sua própria centralidade no sistema cultural galego.
[Este artigo foi publicado originariamente no Nós Diario]