A Através editora publica dentro da sua coleção “Através das letras” a obra que recolhe fragmentos das traduções realizadas por Haroldo dos Santos entre 1961 e 1999: quase 40 anos de criação, transcrição e tradução resumidos nestas 128 páginas que oferecem uma crestomatia diferente e plural.
A brasileira Xandra R. Grey, professora na Universidade Federal de Santa Catarina, e o galego Igor Lugris, investigador do Instituto Gallaecia de Altos Estudos Culturais, foram as encarregadas de terminar o projeto começado polo próprio Haroldo em 2006, e que ficou inconcluso devido ao seu falecimento.
O livro abre-se com duas citações fulcrais, uma de Bernardo Atxaga e outra de Lavinia Itzá, as duas indicando (sendo coerente com o conjunto da obra), o nome das pessoas responsáveis da tradução:
“Dirán que son un autor acabado, incapaz de escribir un libro por min mesmo, e que por iso recorro á obra allea; porén, a verdade derradeira é outra”.
Bernardo Atxaga, Soinujolearen Semea, O fillo do acordeonista (2003) (Traduzido por Ramón Nicolás Rodríguez, na edição galega de Xerais, Vigo, Brasil, 2004).
“Não há, porém conceito de plágio; foi estabelecido que todas as obras são autoria de uma só pessoa, atemporal e anônima”.
Lavinia Itzá, One writes, Uma pessoa escreve (1971) (Traduzido por Angélica Freitas, para Editora 34, São Paulo, Brasil, 2005)
Tal e como recolhem ambos os autores na contracapa, é preciso achegar-se a esta obra livres de precauções, preconceitos e prevenções. É este um texto que mostra que a Ciência da Literatura, a Literaturwissenschaft, não é sempre assim tão científica, e que a Literatura nem sempre é assim tão literária. O que se nos oferece é uma edição que inclui uma Introdução, onde realizam uma breve análise do trabalho desenvolto por Haroldo, assim como uma Nota biográfica, com os dados mais importantes do nosso autor, para completar e contextualizar o trabalho de Haroldo dos Santos.
Temos ante nós uma obra literária, onde se amalgamam e entremeam as obras de múltiplos autores e autoras, e que, entre outras cousas, pretende debater sobre o conceito de autoria (mesmo a partir das citações iniciais do volume) e de criação, recriação, plágio, fontes literárias… jogando, entre outras cousas, com conceitos como a polifonia, a intertextualidade ou as isotopias.
Temos ante nós uma obra literária, onde se amalgamam e entremeam as obras de múltiplos autores e autoras, e que, entre outras cousas, pretende debater sobre o conceito de autoria (mesmo a partir das citações iniciais do volume) e de criação, recriação, plágio, fontes literárias… jogando, entre outras cousas, com conceitos como a polifonia, a intertextualidade ou as isotopias.
Com nomes e apelidos reconhecíveis (Cortázar, Woolf, Bolaño, Michel, Sartre, Mistral, Burnout…), e outros que serão uma verdadeira descoberta (Reyes Heredia, Gaurem, Grünen Danz, Trilore, Marinelli, Descotte…), Haroldo tece com a sua antologia de traduções uma única voz que, como toda obra literária, pretende provocar-nos: até onde é que podemos transcender os limites? Até onde é que aceitamos ou que se torna possível abolir os géneros e apagar as suas fronteiras? Há uma definição possível para toda a literatura possível?
Os dous responsáveis da obra fazem um apelo a leitoras e leitores na sua Introdução, reproduzindo as palavras que o mesmo Haroldo utilizou para apresentar a sua obra “Linguagens selvagens”, de 1986: “Não se predica a transgressão, pratica-se: como forma imprescindível da linguagem, como fundo necessário do pensamento. Fugir da imposição da escrita; deixar para trás a opressão da norma. Provisoriamente definitivo, definitivamente provisório, começar o final finalizando o começo que nos persegue. A questão será ficar conforme com aquilo que já sabemos, ou aceitar o abismo do desafio de sermos aquilo que não conhecemos?”