Neste ano 2021 há 40 anos desde que o galego passou a ser cosiderada língua co-oficial na Galiza, passando a ter um estatus legal que permitiria sair dos espaços informais e íntimos aos que fora relagada pola ditadura franquista. Para analisar este período, iremos realizar ao longo de todo o ano, umha série de entrevistas a diferentes agentes sociais para darem-nos a sua avaliaçom a respeito do processo, e também abrir possíveis novas vias de intervençom de cara o futuro.
Desta volta entrevistamos o presidente da AGAL, Eduardo Maragoto.
Qual foi a melhor iniciativa nestes quarenta anos para melhorar o status do galego?
Houvo muitas iniciativas que contribuírom positivamente para o status do galego, algumas decorrentes da própria aprovaçom do Estatuto de Autonomia que celebramos este ano, onde o galego é reconhecido como língua cooficial e própria. A Lei de Normalizaçom Linguística (que entre muitíssimas outras cousas dá carácter oficial às formas galegas dos topónimos), a criaçom da CRTVG e a incorporaçom do galego ao ensino tivérom um impacto enorme. Nenhuma dessas iniciativas conseguiu dar ao galego o prestígio que necessita para frear o seu declínio interno e externo, mas nom quero imaginar em que situaçom estaríamos se nenhuma dessas iniciativas tivesse avançado. Em geral, no reintegracionismo pensamos que se podia ter tirado maior proveito àquele momento, nomeadamente no ensino, onde a introduçom de uma norma convergente com o português teria permitido converter o galego numa potente ferramenta de comunicaçom, mas isso nom quer dizer que nom tenhamos muito que celebrar com os 40 anos de oficializaçom do galego.
Por outro lado, houvo outras iniciativas menos institucionais que ainda que por enquanto tivessem escasso impacto no conjunto da sociedade, penso que o chegarám a ter no futuro: Por um lado, desculpa a vaidade de ser eu a dizer isto, a criaçom da AGAL em 1981, cuja legalizaçom foi em outubro desse ano, mas em cuja fundaçom se começou a trabalhar já em maio, quer dizer, um mês depois da entrada em vigor do Estatuto de Autonomia. Ela representa o passo mais decidido dado por uma parte nada desprezível do mundo cultural galego para a adoçom de uma norma convergente com o português. Trata-se de uma decisom revolucionária para a melhoria do status do galego, que para muitos e muitas utilizadoras passou de língua regional a internacional; de língua doméstica a ferramenta de trabalho. Trinta e dous anos mais tarde, em 2013, a aprovaçom da Lei Paz Andrade representou o primeiro êxito institucional das pessoas partidárias de dar passos nesse sentido, dar passos para a internacionalizaçom do galego.
A criaçom da AGAL representa o passo mais decidido dado por uma parte nada desprezível do mundo cultural galego para a adoçom de uma norma convergente com o português. Trata-se de uma decisom revolucionária para a melhoria do status do galego, que para muitos e muitas utilizadoras passou de língua regional a internacional; de língua doméstica a ferramenta de trabalho.
Se pudesses recuar no tempo, que mudarias para que a situação na atualidade fosse melhor?
Que che poderia dizer sobre isso um presidente da AGAL? Obviamente, se eu fosse conselheiro de Educaçom nos primeiros anos 80, o galego seria incorporado ao ensino como mais uma variedade do que no mundo é conhecido por língua portuguesa, com as nossas particularidades galegas, mas sem deixar de desfrutar de nenhuma das vantagens que hoje em dia tem uma língua interestatal. Em 1982, a aliança entre a RAG-ILG e o 1º governo galego, liderado pola antiga Aliança Popular, traduziu-se numa decisom pola qual a sociedade galega nom tem tirado proveito dessa vantagem, o que a meu ver tem repercutido negativamente tanto na saúde do galego como no conjunto da sociedade. Podendo ser um dos países mais avançados do mundo linguístico galego-português, vimos esmorecer a nossa língua regional sem utilidade em relaçom ao castelhano.
Em 1982, a aliança entre a RAG-ILG e o 1º governo galego, liderado pola antiga Aliança Popular, traduziu-se numa decisom que tem repercutido negativamente tanto na saúde do galego como no conjunto da sociedade.
Que haveria que mudar a partir de agora para tentar minimizar e reverter a perda de falantes?
Podemos mudar muitas cousas no sentido de facilitar que as pessoas que desejarem desenvolver toda ou parte da sua vida pessoal ou profissional em galego o podam fazer com segurança e até poda ser-lhes útil:
Por um lado, o galego nom pode continuar resignado a ser uma língua prescindível na Galiza. Deve ser preparado para ser uma língua de comunicaçom com outras sociedades, principalmente Portugal e o Brasil, de maneira a poder ser interessante para o conjunto dos galegos e galegas e nom apenas para o galeguismo. Esta medida rebaixaria muito a pressom sobre as pessoas galego-falantes, pois a utilidade da língua nom seria posta em questom a cada passo. Tampouco a correçom seria constantemente avaliada criticamente, como o está a ser na atualidade, em que mesmo entre galego-falantes basta usar um termo diferente ao castelhano, para que pareça que o fazemos para incomodar o nosso interlocutor. As pessoas entenderiam mais facilmente que o galego tem as suas palavras, úteis para comunicar entre nós mas também para comunicar com o resto do nosso espaço lingüístico.
O galego deve ser preparado para ser uma língua de comunicaçom com outras sociedades, principalmente Portugal e o Brasil, de maneira a poder ser interessante para o conjunto dos galegos e galegas e nom apenas para o galeguismo.
Por outro lado, uma vez que a transmissom intergeracional nom está a funcionar na maioria dos núcleos urbanos, devem ser garantidos espaços onde as crianças que têm como língua familiar o galego, podam interagir e brincar na língua familiar com normalidade. Um desses espaço é o ensino. Quer seja nas escolas Semente quer seja noutros estabelecimentos de ensino que apliquem a imersom, essas crianças têm direito a crescer sem que os seus usos linguísticos sejam postos em questom nem sejam obrigadas a abandonar a língua da casa.
Com estas duas medidas a funcionar já poderíamos pensar em levar a cabo outras políticas de promoçom do idioma que, sem aquelas, costumam cair em saco roto. Ora, elas poderiam reverter diretamente a perda de falantes, quer dizer, de pessoas com o galego como língua de instalaçom principal (materna ou posterior)?
Nas circunstâncias políticas atuais, aplicando as políticas que mencionei, pode, efetivamente, desacelerar-se a perda e melhorar os índices de uso em determinados âmbitos, mas, em termos globais, considerando a sociedade no seu conjunto, recuperar falantes é extremamente difícil, até porque depende de factores sociopolíticos que nom estám sob o nosso controlo, como a própria pertença da Galiza a um Estado com outra língua oficial. Equivaleria a dizer que é possível restar falantes ao castelhano na nossa sociedade, e repara que bem perto de nós se encontram algumas das comunidades políticas que mais investem na normalizaçom da língua própria do mundo (País Basco, Catalunha) e mesmo assim, ainda que a língua própria poda avançar em conhecimento, é o castelhano que continua a ganhar falantes nas ruas. Em definitivo, a nossa prioridade nom tem que ser recuperar falantes ansiosamente, como se isto fosse uma guerra que obviamente teríamos perdida à partida, mas ganhar utentes de qualidade, à margem de qual seja a sua língua inicial ou principal.
Pensas que seria possível que a nossa língua tivesse duas normas oficiais, uma similar à atual e outra ligada com as suas variedades internacionais?
Penso, sim. E diria mais: nom é possível nenhum outro desfecho para este problema.
A nossa língua já tem duas normas consolidadas, dous padrões com um uso estável na sociedade. A norma oficial é obviamente a maioritária, a ensinada nas escolas e seguida pola Administraçom; porém, ao nom ser partilhada com o mundo lusófono, tem muitas dificuldades para justificar a sua própria existência e até para proteger a autenticidade do galego. A outra norma é minoritária socialmente, precisamente por nom contar com nenhum estatuto legal, mas tem uma considerável presença e prestígio entre os setores da sociedade mais ativos em prol do galego, que em vez de irem abandonando o seu uso, fôrom recorrendo a ela cada vez mais. É óbvio que nestas circunstâncias esta tendência nom vai alcançar a maioria da populaçom, a que usa o galego escrito de forma esporádica, mas vai continuar a alastrar entre quem está preocupado pola crescente castelhanizaçom do galego.
Agora falta que ambos os modelos obtenham oficialidade, situaçom que cedo ou tarde chegará, só que temos que procurar uma soluçom que satisfaga todas as pessoas envolvidas neste debate e também o conjunto da sociedade. Existe um passo prévio, que é consolidar a ideia de que o galego está numa situaçom delicada e nom pode dar-se ao luxo de desprezar o contributo reintegracionista (ou o que é o mesmo, o contributo do português) para a sua normalizaçom. Para nós parece simples de entender, mas para a maioria das pessoas nom o é, porque o galego é vivido, socialmente, como subalterno ao espanhol.
Na resposta anterior assinalei como medida a tomar a preparaçom do galego para ampliar as suas funções comunicativas, abrindo-se ao mundo. Ora bem, isso nom tem que significar a rutura com a tradiçom filológica que deseja consolidar o galego como língua independente do português. Por sua vez, a oficialidade do galego como língua independente do português também nom deve pôr empecilhos a uma modalidade do galego (o nosso português) apta para a comunicaçom com outros países lusófonos, apta para a comunicaçom internacional. Ambas as tradições existem e com elas devemos trabalhar. O reintegracionismo tem vocaçom de serviço à sociedade e portanto deve procurar soluções para o que existe, nom agir como se nom existisse, ou como se estivesse em meio de uma guerra entre bandos irreconciliáveis, esforçando-se por encontrar a todas as posturas um lugar no processo de normalizaçom lingüística, mesmo àquelas que tanto esforço têm feito por excluir-nos desse processo.
O reintegracionismo tem vocaçom de serviço à sociedade e portanto deve procurar soluções para o que existe, nom agir como se nom existisse, ou como se estivesse em meio de uma guerra entre bandos irreconciliáveis, esforçando-se por encontrar a todas as posturas um lugar no processo de normalizaçom lingüística, mesmo àquelas que tanto esforço têm feito por excluir-nos desse processo.
Uma língua menorizada falada num território sem estado tem desafios tam complexos que nom podemos reduzir a sua defesa a uma única linha estratégica, até porque sabemos que nem o galego reintegrado nem o isolado som fórmulas mágicas para a normalizaçom linguística (tampouco o é o alemám na Alsácia nem o corso na Córsega, para que me entendas). Em definitivo, hoje em dia o galego funciona com dous corações, um mais internacionalista e outro mais particularista. Nom devemos ser nós a provocar que um deixe de bater. Esse papel sentenciador só o poderá ter a sociedade no seu conjunto.