Na noite do dia 5 de dezembro, a Sala Itaú Cultural, em São Paulo, tornou-se palco de uma das mais prestigiadas celebrações da literatura de língua portuguesa: a cerimônia de premiação do Prêmio Oceanos 2024.
Entre quase três mil obras inscritas de diversas partes do mundo lusófono, dois títulos se destacaram: Caminhando com os mortos, de Micheliny Verunschk, vencedor na categoria de prosa, e Uma colheita de silêncios, de Nuno Júdice, premiado na categoria de poesia.
Dois livros, duas vozes únicas
Micheliny Verunschk, pernambucana de 1972, segue expandindo as fronteiras da literatura brasileira. Caminhando com os mortos, publicado pela Companhia das Letras, é o segundo livro de sua Tetralogia do Mato, que teve início com o aclamado O som do rugido da onça, vencedor do Prêmio Jabuti de Romance Literário em 2022.
Em sua nova obra, Verunschk explora as consequências devastadoras do fundamentalismo religioso – preconceito, violência e misoginia –, ao mesmo tempo em que encontra no “mato” um fio de esperança.
Sua escrita visceral e poética ilumina questões que ecoam na sociedade contemporânea, reafirmando sua posição como uma das mais relevantes vozes da literatura brasileira atual.
Por outro lado, Uma colheita de silêncios, de Nuno Júdice, lançado pela Dom Quixote em Portugal, é uma obra profundamente melancólica e reflexiva, marcada pela saudade e pela celebração da memória.
O poeta, falecido este ano, construiu uma carreira notável como ensaísta, ficcionista e professor universitário, com dezenas de títulos publicados.
Sua poesia, reconhecida mundialmente, encontra em Uma colheita de silêncios uma síntese magistral da experiência humana diante da passagem do tempo.
Uma noite de celebração e música
A cerimônia, com direção artística de Romulo Fróes e executiva de Ana Cunha e Marise Hansen, destacou a interseção entre literatura e música.
Fróes, junto com Luiza Brina e Rodrigo Campos, transformou trechos dos dez livros finalistas em canções, mostrando como a literatura pode ganhar novas formas ao ser entoada e acompanhada de melodia.
Selma Caetano, coordenadora do prêmio, destacou essa relação intrínseca entre poesia e música, profundamente enraizada na cultura brasileira. “A poesia cantada resgata suas origens e potencializa sua capacidade de tocar a sensibilidade humana”, afirmou.
Uma ação coletiva pelo incentivo à leitura
O evento reuniu representantes de importantes instituições literárias, como o Instituto Camões, o Museu da Língua Portuguesa e a União Brasileira de Escritores (UBE).
Durante a cerimônia, Selma Caetano e os mestres de cerimônia enfatizaram a importância de unir forças para combater o problema da falta de hábito de leitura no Brasil, destacado em recente pesquisa.
“A presença de todos aqui é um passo importante para transformar o Brasil em um país de leitores”, destacou Selma.
Homenagem aos finalistas
Além dos vencedores, as outras oito pessoas finalistas foram calorosamente celebradas.
Autores de diferentes países, como Germano Almeida (Cabo Verde), Álvaro Taruma (Moçambique) e Hélia Correia (Portugal), demonstraram o alcance e a diversidade da literatura de língua portuguesa.
O legado do Oceanos
Realizado com o apoio da Lei Rouanet e patrocinado pelo Banco Itaú, o Prêmio Oceanos reflete o crescente vigor da literatura lusófona.
A cada ano, o prêmio atrai mais inscrições de países como Brasil, Portugal, Moçambique e Cabo Verde, reforçando seu papel como uma plataforma internacional de destaque.
Em 2024 foram inscritos 2619 livros de autores residentes em 28 países – 1204 são poesias, 836 são romances, 389 são contos, 156 são crônicas e 34 são dramaturgias.
Eles foram publicados por 459 editoras de seis países: Angola, Brasil, Cabo Verde, Itália, Moçambique e Portugal.
Na categoria prosa, as obras finalistas estavam : Caminhando com os mortos, de Micheliny Verunschk; Certas raízes, de Hélia Correia; Meu irmão, eu mesmo, de João Silvério Trevisan; Os infortúnios de um governador nos trópicos, de Germano Almeida e Outono de carne estranha, de Airton Souza.
Na categoria poesia, concorreram: Criação do fogo, de Alvaro Taruma; Limalha, de Rodrigo Lobo Damasceno; Perder o pio a emendar a morte; de José Luiz Tavares; Uma colheita de silêncios, de Nuno Júdice e Uma volta pela lagoa, de Juliana Krapp.
Com curadoria de nomes como Matilde Santos (Cabo Verde) e Isabel Lucas (Portugal), o Oceanos reafirma a riqueza da literatura em língua portuguesa, reconhecendo não apenas os talentos consagrados, mas também incentivando novos autores a florescerem em um cenário global.
Ao premiar Micheliny Verunschk e Nuno Júdice, o Oceanos 2024 reafirma o poder da literatura em conectar mundos e promover reflexões universais.