No mês de julho assistim na livraria corunhesa Berbiriana a apresentaçom do primeiro ensaio de Lorena López López (Páramo 1983), publicado pola Através. Após este encontro guiado polo coordenador editorial do volume, Daniel Amarelo, nom pudem evitar levar o livro comigo: conhecia a solvência de Lorena (Souto) como poeta, mas nunca me aproximara do seu trabalho académico, e a conversa que se produziu no evento convenceu-me de que a passagem a ensaio dum trabalho que já foi tese de doutoramento fora bem sucedida.

Baixo o título Ainda invisíveis? Narradoras e margens na literatura galega contemporânea (2022), Lorena López explora a produtividade do conceito de margem nas obras de quatro narradoras contemporâneas: Margarita Ledo Andión, Patricia A. Janeiro, Cris Pavón e Teresa Moure (esta última na sua trajetória pós-2013), quatro mulheres alcunhadas de “feministas killjoy” no prólogo da professora Helena González. Antes de se debruçar nesta análise, López reflexiona na introduçom sobre a pergunta que norteia o seu trabalho: é ainda útil falarmos em invisibilidade, após as mudanças no tratamento editorial à narrativa feminina no presente século? A autora aclara que o seu objetivo é identificar novas formas de invisibilizaçom, ligadas a um conceito de margem “dinâmico, constantemente tensionado” (p. 18), mais próximo portanto do que ela denomina “pontos cegos”. Em relaçom a isto, a autora apresenta as coordenadas teóricas do ensaio, fundamentalmente as teorias sistémicas e de campo, mas também as teorias feministas e pós-coloniais. Para concluir a introduçom, López coloca a questom da “encruzilhada” entre género e naçom que as autoras experimentam, com consequências identitárias, estéticas e autorais de vário tipo.
É ainda útil falarmos em invisibilidade, após as mudanças no tratamento editorial à narrativa feminina no presente século? A autora aclara que o seu objetivo é identificar novas formas de invisibilizaçom, ligadas a um conceito de margem “dinâmico, constantemente tensionado” (p. 18), mais próximo portanto do que ela denomina “pontos cegos”.
A primeira autora convocada é Margarita Ledo Andión. A invisibilizaçom da sua prosa reside, segundo López, nas poucas possibilidades de a acomodar ao discurso normalizador dos primeiros anos da Autonomia (e nem só, acrescentaríamos), especialmente por dous fatores: a desconstruçom das masculinidades nacionais que a institucionalidade emergente pretendeu sacralizar (caso de Otero Pedrayo em Trasalba) e a estética rupturista, fílmica e “ex-céntrica”, ligada ao feminismo da segunda vaga que Andión praticou durante toda a sua trajetória narrativa.
O seguinte capítulo lida com a novela A perspectiva desde a porta de Patricia A. Janeiro. Este texto nom venceu o prémio Xerais 2007 por reservas morais dum dos membros do júri sobre o tema tratado: o independentismo e a luita armada na Galiza. López explora a permeabilidade do sistema cultural a determinadas narrativas de conflito (a Guerra Civil espanhola versus o independentismo contemporâneo) e compara a fortuna crítica doutros romances que se ocupárom deste assunto tratando-o, porém, como um recurso político esgotado, enquanto Janeiro mostra um processo aberto, com os seus próprios conflitos internos, como a conciliaçom da luita com a maternidade.
A quarta seçom do ensaio reflete sobre a produçom de Cris Pavón e a sua escrita de ficçom científica “dura” e de temática gótica, com referências aos tabus do lesbianismo e a menstruaçom. A dificuldade do centro do sistema para digerir estes discursos residiria no cultivo orgulhoso e adulto de géneros minoritários e geralmente deostados, dumha perspetiva que desafia as fronteiras entre o humano e a máquina, dumha parte, e, doutra parte, entre o humano e o monstruoso. Contodo, novos projetos editoriais (tais como Urco) aceitárom o repto de publicar estes romances.
Em quinto lugar, López ocupa-se da narrativa publicada por Teresa Moure após a sua viragem reintegracionista em 2013. A autora argumenta que Moure encontrou nesta decisom umha oportunidade para se reapropriar da sua imagem autoral, permitindo-se tratar temas mais controversos, enquanto diversifica e complica o seu perfil (e com ele o perfil reintegracionista) desde o feminismo e o jogo com a metaficçom.
Para concluir, Lorena López coloca algumhas questons abertas, nomeadamente quais os imaginários promovidos e qual o seu efeito sobre narradoras atuais e futuras, mas também o rol da crítica na hora de analisar a literatura escrita por mulheres. Neste sentido, surpreende que, a seguir dum tam potente exercício crítico ao longo de toda a obra, nom seja maior a contundência da secçom final. Em qualquer caso, Lorena López abre multitude de caminhos polos quais transitar(mos) em futuros trabalhos.
[Este artigo foi publicado originariamente no Novas da Galiza]