Novos tempos e novos debates para o Galego

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Por José Manuel Outeiro

Desde o mesmo momento em que se passa a conceber o Galego como a forma em que na Galiza falamos umha língua que, com outros acentos e outras características, é falada também por milhões de pessoas noutros países, e internacionalmente conhecida como Português, e desde o momento em que se opta por reforçar essa consciência no nosso país, colocamo-nos também muitas outras questões que derivam directamente da defesa, e mais ainda da prática, dessa unidade lingüística.

Todas estas questões estám condicionadas pola realidade lingüística galega, isto é, pola discriminaçom lingüística e a degradaçom moral e social derivada desta discriminaçom colectiva e pola assunçom da hierarquizaçom, a desigualdade e a injustiça em amplos sectores sociais, com freqüência, e paradoxalmente, aqueles mais afectados.

Já existia plena consciência desse condicionamento, sem dúvida, nos inícios da organizaçom do movimento reintegracionista moderno, como testemunham os próprios estatutos fundacionais da AGAL, em que esta nom só se punha como objectivo a reintegraçom lingüística, mas também contribuir à normalizaçom social da língua própria da Galiza; pois nom se trata de reintegrar-nos individualmente nesse ámbito internacional aqueles que temos consciência da unidade lingüística galego-portuguesa, senom de, ao passo que o Galego for avançando na normalizaçom dos seus usos sociais, conseguir que se alargue igualmente a consciência de que este é a forma peculiar galega de falar a mesma língua que partilhamos com outros países como o Brasil ou Portugal, o que, pola sua vez, reforçará o processo de normalizaçom.

Por esta relaçom de interdependência entre a normalizaçom do Galego e a reintegraçom da Galiza ao seu ámbito lingüístico internacional, já que sem o Galego mal pode a Galiza relacionar-se com Portugal ou co Brasil como países de língua comum, é fulcral que o reintegracionismo se empenhe no processo normalizador como tarefa principal e urgente, mesmo quando isto suponha no curto prazo o aumento de presença social de opções normativas que nom compartamos, pois esta é a forma de mostrar a cada vez mais sectores sociais que ambos os objectivos, normalizaçom e reintegraçom, tal como fixou a AGAL desde os seus inícios, som compatíveis e complementários. E é também a melhor forma de que o reintegracionismo ganhe maior presença social, nomeadamente onde mais interessa: estando sempre presentes, ou melhor ainda sendo protagonista principal, na defesa do Galego, de jeito que podamos superar a marginalizaçom a que fomos submetidos durante o fraguismo, a qual infelizmente às vezes parecemos ter assimilado como característica identitária irrenunciável.

Sem dúvida, se conseguirmos avançar nos nossos objectivos, agora que algum dos obstáculos políticos que antes impediam esse avanço vam desaparecendo, também a própria Galiza iria assumindo e projectando umha imagem internacional de país lusófono. De feito, isto já está a acontecer, ainda que de forma episódica e portanto mui insuficiente, e nom poucas vezes à margem do próprio reintegracionismo organizado.

Com umha evoluçom positiva do trabalho do reintegracionismo, inevitavelmente reabrirám-se, nom só entre nós, mas na sociedade, os debates sobre as opções ortográficas, e normativas em geral, mais adequadas para representar o Galego-Português da Galiza. Mas sabemos que na sociedade, e particularmente em sectores empenhados na normalizaçom, existe um certo fastio a respeito destes debates, que muitas vezes conduzírom a enfrentamentos e divisões que desgastárom as forças em prol da língua, polo que som vistos de jeito mui negativo.

Seria pois conveniente que o reintegracionismo comece já a aproveitar as ocasiões que se apresentem para oferecer novos debates sobre opções normativas e lingüísticas para o Galego, e sobre as propostas para avançar na normalizaçom, tentando fazê-lo de forma útil à sociedade, e superando as dinámicas de enfrentamento e conflito, tanto internos como com outros sectores a favor da língua, que se dérom no passado, pois se queremos abrir-nos caminho e avançar, cumpre também pôr a atençom em combater os preconceitos que no-lo impidem.

Devemos igualmente fazer um esforço pedagógico em todas as nossas actuações, esforçando-nos em mostrar as nossas propostas de forma facilmente entendível e coerente, nomeadamente naqueles aspectos que mais benefício trariam à sociedade.

Se convocamos o povo galego para que abrace o reintegracionismo, afirmando que temos como própria umha língua que, apesar das diferenças, é a mesma que falam portugueses e brasileiros, do mesmo jeito que portugueses e brasileiros contribuem à língua comum coas suas expressões, léxico, e outras características próprias, também os galegos devemos contribuir coas nossas. E se desde o reintegracionismo afirmamos que as diferenças que o povo nota entre a língua de Galiza e a de Portugal e o Brasil nom implicam que sejam línguas diferentes, nom devemos evitar a representaçom daquelas diferenças que corresponda representar, no mesmo nível e de forma similar a como o fam nos outros países que tenhem como língua própria a mesma nossa, apesar das suas diferentes características nacionais ou locais.

A reivindicaçom do contributo galego à língua comum, sobretodo no que tem a ver coa necessidade de incorporar e reconhecer o léxico patrimonial galego como parte da língua comum, está sendo referida ultimamente nas ocasiões em que o reintegracionismo consegue interlocuçom com representantes de outras nações da nossa comunidade lingüística. Mas paradoxalmente, entre nós cada vez existe umha tendência maior a umha unificaçom lexical e expressiva que nalgumha medida oculta esse património galego para o qual agora pedimos atençom por parte dos nossos correspondentes internacionais.

Tanto pola necessidade dum reconhecimento interior, na própria Galiza, para o que devemos contribuir com maior empenho à normalizaçom e à autoestima lingüística no contexto conflitivo que vivemos, como para o reconhecimento exterior que agora também pedimos, deveremos valorizar e exibir, com orgulho e na medida oportuna, nom só o património comum, mas também o nosso património exclusivo, ou só parcialmente compartido, as características, léxico e expressões nossas com que vamos enriquecer e agrandar a nossa língua internacional, convidando, por um lado, a sociedade galega a participar da perspectiva reintegracionista que lhes propomos, sem renunciar ao nosso património e portanto sem nada que perder e muito que ganhar, e por outro à comunidade lingüística internacional de que fazemos parte a admitir-nos no seu seio tal como somos.