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Justiça e direitos humanos no filme ’12 Homens sem Piedade’

Após a 2ª Grande Guerra Mundial, com as atrocidades cometidas pelo Nazismo de Hitler, fez-se necessário um movimento que visasse reconstruir os direitos humanos, então, dilacerados pela destruição e subjugação da pessoa humana, que culminou no extermínio de mais de 11 milhões de pessoas. Diante desse contexto histórico é que a Organização da Nações Unidas, em assembleia geral realizada em 10 de dezembro de 1948, aprovou a Declaração Universal dos Direitos Humanos, como marco de reconstrução dos Direitos Humanos em busca do processo de universalização desses direitos, com o objetivo de evitar que esses acontecimentos ocorressem novamente. Ao longo de seus 30 artigos, a DUDH trata de direitos civis, políticos, sociais, económicos e culturais, com a ideia de garantir um mínimo de dignidade para os seres humanos. Apesar de tecnicamente não ter um “poder vinculante”, que obriga a seu cumprimento, como no caso de um tratado internacional, pois trata-se de uma Declaração, é o documento mais importante já adotado pela Assembleia Geral das Nações Unidas, e sua história o faz mais que um instrumento que simplesmente oferece normas orientadoras.

A DUDH é uma fonte do direito internacional consuetudinário, ou seja, refere-se a uma prática recorrente (de costumes, daí a expressão consuetudinário) entre os Estados ou Países, que se origina de uma convicção de obrigação legal por parte dos membros atuantes. Um direito é um título, uma norma de conteúdo declaratório, de prerrogativas. Os Direitos Humanos são títulos legais que toda pessoa possui como ser humano, daí sua caraterística de Universalidade, pois, a todos pertencem, ricos, pobres, homens, mulheres, negros, brancos, pardos, etc., sem que haja qualquer tipo de discriminação. Além da universalidade, outra característica importante dos direitos humanos é a Historicidadeo que quer dizer que são conquistados ao longo dos tempos, principalmente com as revoluções. Entre as revoluções, talvez a mais importante para os direitos humanos é a Revolução Francesa de 1789, que defendeu os direitos à liberdade, à igualdade e à fraternidade. Tanto, que em seu artigo primeiro a DUDH está trás a bandeira defendida pela revolução gala: Art. 1º : Todas as pessoas nascem Livres e Iguais em dignidade e direitos. São dotadas de razão e consciência e devem agir em relação umas às outras com espírito de Fraternidade.

Direitos Humanos são os direitos que o cidadão opõe contra o arbítrio do Estado, em nome de sua dignidade. São direitos essenciais, inerentes à pessoa humana e devem ser defendidos e garantidos pelo Estado. Sem esses direitos os homens seriam como cousas. A ideia é garantir um mínimo de Dignidade às pessoas.

Em dous depoimentos, apoiando-me em dous formosos filmes, quero sensibilizar os docentes de todos os níveis educativos, para que, ao redor da data de 10 de dezembro, Dia Internacional dos Direitos Humanos, organizem nas suas aulas com os seus estudantes, atividades educativo-didáticas, lúdicas e artísticas, sobre um tema tão importante como é o do respeito pelos Direitos Humanos em todo o Planeta Terra. Para o primeiro capítulo escolhi um famoso e extraordinário filme realizado pelo americano Sidney Lumet em 1956, intitulado 12 Homens sem piedade. No mesmo se amostra o difícil que é administrar justiça, por culpa dos preconceitos que todos temos. No seguinte depoimento, a publicar na mesma data em que se comemora a Declaração dos DDHH, comentarei um lindo filme argentino realizado por Marcelo Pinheiro em 2002 sob o título de Kamchatka, no qual se conta a história e lembranças de uma criança durante a ditadura argentina da década de 1970, na qual a sua família é obrigada a esconder-se para não ser presa.

FICHA TÉCNICA DO FILME:

  • 12 homens sp Capa DVD 1Título original: Twelve angry men (12 homens sem piedade / 12 homens e uma sentença / 12 homens em fúria).
  • Diretor: Sidney Lumet (EUA, 1956, 92 min., preto e branco).
  • Roteiro: Reginald Rose, segundo a sua obra do mesmo título para TV.
  • Fotografia: Boris Kaufman. Música: Kenyon Hopkins.
  • Produtores: Henry Fonda e Reginald Rose. Produtora: United Artists.
  • Nota: O filme pode ser visto na sua íntegra entrando em https://www.youtube.com/watch?v=mzPll63y2b0
  • Atores:Henry Fonda(Davis, jurado nº 8), Martin Balsam(jurado nº 1), John Fiedler(nº 2), Lee J. Cobb(nº 3), E.G. Marshall(nº 4), Jack Klugman(nº 5), Ed Binns(nº 6), Jack Warden(nº 7), Joseph Sweeney(McCardle, jurado nº 9), Ed Begley(nº 10), George Voskovec(nº 11), Robert Webber(nº 12), John Savoca(jovem acusado), Rudy Bond(juiz), James Kelly(guarda) e Billy Nelson(oficial da Corte).
  • Argumento: Doze jurados encerrados num quarto devem decidir se um moço é culpado ou não do assassinato de seu pai, sob pena de morte. Onze têm plena certeza que ele é culpado, enquanto um não acredita em sua inocência, mas também não o acha culpado. Decidido a analisar novamente os factos do caso, o jurado número 8 não deve enfrentar apenas as dificuldades de interpretação dos factos para achar a inocência do réu, mas também a má vontade e os rancores dos outros jurados, com vontade de irem embora logo para suas casas. Ao longo de todo o filme, pela sua persistência, este jurado, interpretado de forma magistral por Henry Fonda, vai convencendo o resto dos membro do júri de que a sua postura é certa.
  • Prémios: Óscar 1957 (EUA): Indicado nas categorias de Melhor Diretor, Melhor Filme e Melhor Roteiro Adaptado.BAFTA 1958 (Reino Unido): Venceu na categoria de Melhor Ator Estrangeiro (Henry Fonda).Indicado na categoria de Melhor Filme.Festival de Berlim 1957 (Alemanha): Recebeu o prémio OCIC eo Urso de Ouro.Prémio Edgar 1958 (Edgar Allan Poe Awards, EUA): Venceu na categoria de Melhor Filme.Globo de Ouro 1958 (EUA): Recebeu indicação nas categoria de Melhor Filme (drama), Melhor Ator – Drama (Henry Fonda), Melhor Diretor de Cinema e Melhor Ator Coadjuvante (Lee J. Cobb). Prémio Bodil 1960 (Dinamarca): Venceu na categoria de Melhor Filme Americano.
  • Nota: Sob a direção de Gustavo Pérez Puig, em 1973, TVE realizou para a série Estúdio 1, esta mesma obra, com uma magnífica interpretação, e uma duração de 112 minutos. Dita obra pode ser vista entrando em: http://www.rtve.es/alacarta/videos/estudio-1/estudio-1-doce-hombres-sin-piedad/8

A DIFICULDADE DE TOMAR DECISÕES SOBRE AS PESSOAS:

Numa tarde de verão, doze homens se fecham em uma sala abafada do Tribunal de Manhattan, para discutirem e deliberarem se um adolescente porto-riquenho deve ou não ser condenado à cadeira elétrica, acusado de ter assassinado o próprio pai com um canivete. Antes, o juiz esclareceu os critérios a serem adotados, principalmente no caso de haver dúvidas, quando o voto deverá ser de ‘inocente’. Por outro lado, deixa claro que apenas uma votação unânime pode dar o veredicto. Nenhum dos jurados é conhecido pelo nome e sim pelo número da cadeira que ocupa na sala do júri. O Primeiro Jurado apresenta duas alternativas: na 1ª, eles discutiriam primeiramente os factos para, em seguida, votarem; na 2ª, eles promoveriam uma votação preliminar para verificarem quem está de que lado. Esta última é a escolhida e a votação se faz com um simples levantar das mãos. O resultado é de 11 votos a favor da condenação, contra apenas 1 voto a favor da absolvição.Alguns jurados se escondem sob uma máscara de ressentimento, como o nº 3, um homem rude, temperamental e vingativo, com problemas com seus próprios filhos, o que o tornam hostil em relação aos jovens de uma maneira geral; outros, sob a máscara do preconceito, como o nº 10, um homem reacionário e racista, prejudicando sua capacidade de votar com isenção; o jurado nº 7, preocupado apenas com um jogo que vai acontecer mais tarde, vota com a maioria como forma do julgamento terminar mais cedo. Cabe, assim, ao jurado nº 8, único que votou contra a condenação, convencer os outros onze de que não há total clareza na tese da culpabilidade do réu.

O jurado nº 12 sugere que cada um dos que são a favor da condenação, procure convencer o jurado nº 8 de que ele está errado, tendo, para isso, um a dous minutos. Assim, à medida em que vai sendo questionado, o jurado nº 8 vai contra-argumentando de forma segura. A certa altura, ele propõe uma votação secreta entre os 11 favoráveis à execução do rapaz, afirmando que, se o resultado for unânime (11 x 0), ele mudará de opinião. Entretanto, ocorrendo um único voto a favor do réu, eles continuarão a discutir o assunto. O grupo concorda e o resultado da votação secreta é 10 x 1, o que mostra que um deles mudou de lado. Surpreendentemente, o jurado mais velho, de nº 9, admite ter mudado seu voto em respeito à independência de pensamento demonstrada pelo nº 8. Após uma pequena pausa, a discussão continua com o reexame do caso e, pouco a pouco, o jurado nº 8 vai conquistando novos aliados até a situação se inverter, com o placar de 11 x 1, onde o jurado nº 3 é o único a permanecer a favor da condenação do réu. Este é, então, pressionado a defender sua posição. Ele pede para que todos acreditem no que foi testemunhado na Corte, sob juramento, mas, ao abrir sua carteira de documentos, depara-se com uma foto sua em companhia do filho. Ao olhar para ela, lágrimas começam a cair face ao sentimento de culpa que lhe invade, em virtude do seu próprio mal relacionamento familiar. Arrasado e soluçando, ele diz: ‘Inocente, inocente’. A porta é aberta e os jurados lentamente saem após alcançarem a decisão unânime a favor da absolvição do réu.

QUANDO EXISTE UMA DÚVIDA RAZOÁVEL:

12 homens sp foto 3O filme de Lumet decorre todo ele, agás algumas pequenas cenas, numa sala de julgamentos e num serviço, no quarto do jurado. É um decorado austero e bastante claustrofóbico. Um quarto fechado, sem decoração, fechada a sua porta à chave e com janelas praticamente inacessíveis. Como se isso fosse pouco, estamos num dos dias mais calorosos e sufocantes do ano em Manhattan. A sensação de opressão e claustrofobia aperta e oprime doze homens em fúria e sem piedade. Para não dar a sensação de estar perante teatro filmado, o diretor, de forma muito acertada, com um sólido roteiro, envolve o espetador no caso e na trama, que 12 cidadãos estão a discutir, sem que se torne difícil seguir a pista das questões que se estão a tratar. E além disso, e ao mesmo tempo, vai saindo à luz a personalidade de cada um dos membros do jurado. Basta contemplar a cena em que cada um dos membros deve, durante dous minutos, tentar convencer o jurado número 8 (interpretado por Fonda), do errado da sua opinião. Nela define-se perfeitamente a forma de ser de cada um dos membros do jurado e a sua posição moral com respeito ao caso que debatem. É este um dos aspetos de maior interesse do filme: de que maneira os acontecimentos da vida de cada uma das personagens ou os seus preconceitos, influem na hora de julgar as pessoas. O filme questiona a capacidade de um jurado para ser objetivo, quando tem que proferir sentença. Somos capazes de avaliar objetivamente, sem nos basearmos em nenhum juízo moral anterior, tal como se supõe que deveria fazer um jurado? A fita de Lumet vai muito mais longe, já que chega a perguntar-se sobre quem é que somos nós para julgar as ações dos demais. Quer dizer, o que se debate em todo o filme é o próprio conceito de Justiça e se realmente as pessoas somos capazes de ser justas e equânimes, ou pelo contrário, não podemos evitar os nossos preconceitos, tal como acontece aos jurados 3 e 10, ou talvez, como acontece aos doze, como nos acontece a todos? Na verdade, somos nós, humanos, realmente imparciais e “objetivos” nos nossos juízos?

12 homens sp foto 01O diretor deixa que as suas personagens falem à vontade, e que seja assim o espetador quem tire a sua própria conclusão. A partir das tentativas de averiguar as chaves do assassinato, as personagens vão trazendo à luz os seus problemas pessoais, o seu estado anímico, as suas caraterísticas, virtudes e defeitos. Em definitivo, uma radiografia deles próprios. Não se nos comunicam os nomes dos membros do jurado, que tão só são chamados pelo seu número correspondente, e se mantém assim o anonimato. Podem chamar-se de qualquer maneira, são pessoas normais e correntes, como o podem ser os próprios espetadores. Desta maneira o público pode envolver-se melhor, fazendo-o partícipe do que acontece, das dúvidas ou não do jurado e de cada membro em particular, porque são igual que cada espetador. Só ao final, como uma graciosa concessão, podemos conhecer os nomes das duas únicas pessoas do jurado que trataram de ser mais objetivas, de analisar passo a passo cada um dos dados e pistas que se iam dando ao longo do processo, tratando de esquecer os seus preconceitos. Embora só pronunciem os seus nomes entre eles, pois o resto dos jurados não o hão de saber. Mas, são estas duas pessoas as únicas justas e que se diferenciam do resto? Um elemento principal do filme reside na influência que exercem umas pessoas sobre outras. Algum dos membros do jurado influi poderosamente sobre outros na hora de decidir. Além disso, o realizador mostra-nos que todos os factos e todos os dados podem ser virados de pernas para o ar, de tal forma que se nos faça ver esses mesmos factos e dados doutra perspetiva, e assim mudar a nossa opinião. É possível e é muito fácil torcer os factos. O que é verdade e o que é mentira? E quase tudo é dúvida, a “dúvida razoável” que mencionam os doze homens sem piedade. E é esta dúvida que leva a que a opinião seja facilmente moldável, como acontece aos membros do júri. Há uma linha muito fina entre o que é verdadeiro e falso. No princípio todas as personagens, menos o jurado 8 (Henry Fonda), acham que o acusado é culpado. Embora, ao final da longa-metragem, todos achem que o processado é inocente. Ainda assim, o papel do jurado 8 adverte que pode estar enganado nas suas deduções, portanto o acusado pode ser verdadeiramente um assassino. Todo o filme termina por ser uma feroz crítica contra o valor dos júris, estão capacitados os seus membros para julgarem objetivamente outras pessoas? Além disso, não existem já indivíduos que estudaram para tomarem conta dos processos? O filme critica o facto de os cidadãos normais e correntes, que não estudaram leis, serem os que profiram uma sentença, embora também não se pronuncie a favor da justiça dos “profissionais”. Há uma cena que reflete muito bem isto que assinalamos, e é aquela em que o membro 2 diz: “acredito que é culpado, assim o pensei desde um princípio, ninguém o tem demonstrado”. Quer dizer, não parece capaz de julgar por si próprio, limita-se ao que vêm dado. O filme também se pergunta se a pessoa que julga seria capaz de suportar o facto de poder ter castigado alguém a uma pena irreversível, como por exemplo a pena de morte. Além disso, e se afinal era inocente?, como se perguntou em algum momento Fonda no papel do jurado 8, para fazer com que os demais refletissem. O roteiro do filme é tão bom, e a realização ainda melhor, que o espetador não acha difícil compreender toda a trama e o que na pequena sala se está a debater. E depois de o ver com seriedade nos apresenta mil e um dilemas morais.

TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR:

Utilizando a técnica do Cinema-fórum, podemos analisar o filme do realizador Lumet, do ponto de vista formal (linguagem fílmica, planos, planos-contra plano, movimentos de câmara, etc.) e de fundo (mensagem que tenta transmitir e atitudes que manifestam as diferentes personagens do mesmo). E o muito difícil que é julgar outras pessoas de forma objetiva, esquecendo-nos dos nossos preconceitos. Como o roteiro é o mesmo, podemos ver o filme de Lumet de 1956, ou no seu lugar a peça teatral de Estudio 1 de TVE, realizada por Pérez Puig em 1973, com atores espanhóis.

Organizar nos estabelecimentos de ensino uma amostra-exposição sobre a Declaração Universal dos Direitos Humanos. A mesma deve incluir textos, legendas, aforismos e poemas dos alunos, desenhos, cartazes, autocolantes e fotografias, ademais de retalhos de revistas e jornais. Poderia incluir um mapa-múndi, destacando os países que mais respeitam os direitos (poucos) e os que mais atentam contra eles (infelizmente muitos).

Tomando como base os artigos 7 ao 11 da Declaração Universal, e usando técnicas variadas de dinâmica de grupos, debater o conteúdo dos mesmos em assembleia valorativa de estudantes e professores, convenientemente organizada. Os mencionados artigos estão muito em relação com o roteiro do filme de Lumet. Poderia organizar-se com os estudantes um jogo dramático representando as personagens do filme que comentamos. A Declaração Universal dos DDHH pode ser consultada entrando aqui.

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