Por que ler a literatura brasileira? 5 escritores para conhecer o Brasil

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A literatura em língua portuguesa, idioma de 250 milhões de falantes no mundo, é um importante patrimônio cultural de valor universal. Deste total de falantes, o Brasil representa uma grande parcela populacional (215 milhões).


Não é de se espantar, portanto, que o peso do Brasil na produção literária da lusofonia seja expressivo, destacando-se pelos seus escritores de obras de ficção, não ficção, prosa e poesia ao longo da história.


O contato com a literatura brasileira, nesse sentido, possui grande importância como veículo de valorização e divulgação da língua portuguesa internacionalmente, sendo de grande valor para a interação entre a Galiza e a lusofonia.


Além disso, o estudo da literatura brasileira é também um importante meio para se inserir na cultura brasileira, aprofundando o entendimento de sua sociedade e de seu imaginário coletivo. O contato com a literatura brasileira, por fim, possibilita a comparação de traços de similaridades e diferenças com o imaginário cultural de outros povos, como os galegos. O Brasil é um país marcado por sua grande diversidade étnica e cultural, e esse traço pode ser encontrado em sua literatura.


Com o objetivo de inserir o leitor não familiarizado no tema, este artigo apresenta a seguir uma lista de principais obras e escritores para compreender o Brasil e introduzir-se na cultura e sociedade brasileiras.


Deve-se ressaltar que a lista de indicações a seguir não é exaustiva e cobre apenas alguns dos principais autores.

Os Sertões (1902) – Euclides da Cunha

A obra “Os Sertões”, escrita pelo jornalista e engenheiro Euclides da Cunha (1866-1909), é um marco na literatura e historiografia brasileiras. A obra pertence ao gênero de não ficção e combina reportagem jornalística, narrativa histórica e poética.

O filólogo português Manuel Rodrigues Lapa considera “Os Sertões” como o correspondente análogo aos Lusíadas da literatura brasileira, constituindo uma “epopeia negativa” do povo do sertão nordestino. Narra os eventos ligados à Guerra de Canudos (1896-97), conflito ocorrido no interior nordestino entre o movimento social milenarista cristão liderado por Antônio Conselheiro e as forças militares da recém-proclamada República brasileira.

A obra oferece um retrato profundo da sociedade sertaneja e dos conflitos que levaram à guerra de Canudos, mostrando a complexidade do Brasil profundo e as tensões entre sistemas sociais. Escrita em estilo descritivo e naturalista, segundo a mentalidade positivista do início do século XX, é, porém, dotada de grande riqueza lírica e poética. Um dos marcos da literatura brasileira e fundamental para a compreensão do povo brasileiro.

Dom Casmurro (1899) – Machado de Assis

A obra de realismo psicológico Dom Casmurro foi publicada pelo escritor carioca Machado de Assis (1839-1908). Traduzida para diversas línguas, é considerada um importante legado para a prosa realista brasileira e uma das maiores da língua portuguesa.


Publicada em 1899, a obra é escrita em primeira pessoa e ambientada no Rio de Janeiro do século XIX, narrada pelo protagonista Bentinho, que conta sua história de vida, centrada em seu relacionamento com Capitu. A obra explora temas como ciúme, traição e memórias fragmentadas, especialmente no que diz respeito à suspeita de adultério por parte de Capitu. A narrativa de Bentinho é ambígua, o que gera diferentes interpretações sobre os eventos descritos.


A relevância de Dom Casmurro abrange não apenas a literatura brasileira, mas também a literatura universal, ao tratar de uma temática atemporal, com interessantes análises sobre a psicologia humana e os costumes da sociedade. Um estudo imprescindível da sociedade e da psicologia humanas.

Triste Fim de Policarpo Quaresma (1915) – Lima Barreto

Lima Barreto (1881-1922) foi um dos precursores da literatura brasileira moderna. Definida como “militante” pelo próprio autor, sua obra está quase inteiramente voltada para a investigação das desigualdades sociais e da hipocrisia e falsidade humanas. Suas obras frequentemente adotam a ironia, o humor e o sarcasmo.


Triste Fim de Policarpo Quaresma é a obra mais célebre do escritor. Destaca-se pelo personagem quixotesco Policarpo Quaresma, um idealista imbuído de ideais nacionalistas e positivistas de progresso e ciência, confrontado pela realidade do mundo social republicano brasileiro do final do século XIX.


A obra é um confronto do sonho republicano com a mesquinhez e corrupção da classe política e das elites sociais brasileiras dos anos posteriores à proclamação da República.


Segundo o crítico Osman Lins, Policarpo Quaresma é um romance sobre o “desajuste entre o imaginário e o real, entre a idealização e a verdade, entre a ideia que o personagem-título faz do seu país e o que seu país realmente é”. A obra também procura ridicularizar o apego da sociedade aos títulos e às instituições políticas da época, sua burocracia e sua inoperância.

Itinerário de Pasárgada (1954)  de Manuel Bandeira

Nascido no Recife, o poeta Manuel Bandeira (1886-1968) foi uma figura-chave do modernismo brasileiro e considerado por alguns críticos literários, como Otto Maria Carpeaux, o maior poeta brasileiro


Sua poesia lírica de matiz melancólica trata de temas como a angústia existencial, a morte, a memória, o erotismo, o lirismo das coisas simples e a fragilidade da vida. Sua capacidade de tratar de temas universais com simplicidade e profundidade é um dos traços distintivos de sua obra. Ao mesmo tempo lírica e inovadora, sua produção é crucial no panorama da literatura brasileira.


Itinerário de Pasárgada (1954) é um importante relato autobiográfico sobre sua formação literária e humanista. No memorial em prosa, o autor narra sua relação íntima com a poesia e remonta à infância no Recife, à formação escolar no Rio de Janeiro, à estadia na Suíça e à amizade com os modernistas. O escritor reflete sobre o fazer poético e o papel da literatura, comentando a própria obra e comparando-a com a de escritores e artistas de outras expressões.

A República dos Sonhos (1984) – Nélida Piñon

Escritora brasileira de família galega, Nélida Piñon (1937-2022) possui uma extensa e premiada obra. Considerado um importante romance da literatura brasileira, A República dos Sonhos aborda a perspectiva do imigrante na literatura brasileira, sendo uma obra de grande interesse para a comunidade galega. Narra a saga de uma família de imigrantes galegos no Rio de Janeiro. O romance de mais de 700 páginas cobre todo o período da história brasileira do século XX, abordando as transformações históricas e sociais do país sob uma perspectiva pessoal e familiar.


A presença feminina marcante nos livros de Nélida reflete a importância e o vanguardismo de sua própria presença no meio literário, tendo sido a primeira mulher consagrada como membro da Academia Brasileira de Letras.

Referências

Carpeaux, Otto Maria (1951) “Pequena Bibliografia Crítica da Literatura Brasileira”. Ministério da Educação e Saúde.

Enciclopédia Itaú Cultural. Disponível em: http://enciclopedia.itaucultural.org.br. <Acesso em: 2024>

Lapa, Rodrigues. (1979) “Antonio Sergio e o problema da língua literaria”. Estudos Galegos Portugueses. Lisboa: Sá da Costa Editora