A Lei nº 1/2014, do 24 de março, para o aproveitamento da língua portuguesa e vínculos com a lusofonia, conhecida popularmente como Lei Valentim Paz-Andrade, foi aprovada por unanimidade no Parlamento da Galiza há agora uma década. Falamos com um dos promotores da Iniciativa Legislativa Popular que levou este texto a Lei, Alexandre Banhos, para avaliar o percurso dos primeiros dez anos desta.
Neste ano completárom-se 10 anos da aprovaçom da Lei Paz Andrade, qual é a tua avaliaçom sobre a sua aplicaçom durante esta década de vigência?
No ano de 2011, penso que foi José Ramom Pichel quem falou de fazermos uma iniciativa legal de reconhecimento do português.
Naquela altura já não existiam os fóruns da Agal, que foram uma verdadeira escola de formação, mas ainda se debatia muito nos fóruns da yahoo.com.br, hoje em dia desaparecidos e infelizmente perdidas as conversas, e também havia muito debate em artigos e sugestões publicadas no PGL.
Bem logo, um bom leque de pessoas encorajamos essa iniciativa e começamos a trabalhar nela. João Evans Pim, esse cérebro e pessoa maravilhosa com a sua parceira máquina Iolanda Mato, foi quem realizou, o primeiro rascunho, e nos próprios fóruns foi tomando forma o texto definitivo com emendas e sugestões bem interessantes, para a iniciativa. De jeito inteligente e antes de levá-la ao parlamento, discutiu-se a sua viabilidade com distintos cargos da Junta da Galiza.
O Parlamento aceitou a trâmite a iniciativa, em junho de 2012. E mais uma vez Evans Pim, elaborou umas folhas de recolhida de assinaturas, para conseguirmos as 15000 assinaturas necessárias. Eu estava nas reuniões de planeamento do trabalho, e comentei que essas assinaturas num mês deveriam estar recolhidas. Decidiu-se enviar uma ou duas folhas de assinaturas, cada folha podia incluir umas 75 assinaturas, a uns perto de 200 vultos destacados do reintegracionismo. E a uma pluralidade de organizações para se somarem à iniciativa.
A ideia minha, era de em não mais de dous ou três meses termos o trabalho feito. Eu comecei a agir e em menos de um mês tinha umas 700 assinaturas recolhidas. (trabalhei duro o dia da pátria de 2012), e quando para o natal de 2012 se olhou o trabalho, as tais assinaturas que se pediram aos vultos e organizações não chegaram. O Parlamento dera-nos data para apresentarmos as assinaturas, e quando a data vencia, estávamos perto das 8000. Houve que pedir nova data. Que nos foi dada.
Constituímos grupos de trabalho de recolha de assinaturas, grupos nos que não participava muito pessoal, porém entusiastas e trabalhadores, e com ações sistemáticas, em setembro de 2013 apresentaram-se algo mais de 17500 assinaturas, que no Parlamento foram submetidas a comprovação e umas duas mil foram banidas. Dos vultos e organizações não chegou muita cousa, e não poucos esqueceram o pedido, e outros até estavam esquisitos com o facto de que as folhas de assinaturas recolhiam nomes e sobrenomes, o que consideravam um brasileirismo que dificultava a recolha. A minha experiência de intensa recolhida, e que o pessoal de isso não fez problema
Aceite a iniciativa e acreditadas as assinaturas, no Parlamento se fez uma muito ativa campanha com os grupos políticos e especialmente com o PP, com o que se negociou com muito pormenor ponto por ponto o texto definitivo, destacando nessa negociação Xosé Morell, Ângelo Cristóvão, e João Evans.
Foi um apartado muito importante da negociação o conseguirmos que os outros grupos aceitassem o negociado, e que não saísse nada do assunto na imprensa, como nos esclareceram os interlocutores do PP, se algo disto aparece na imprensa em Madrid e há debate social, a iniciativa estaria impossibilitada de ir avante, receberíamos a ordem perentória de acabar com o assunto da “direção fascista (e botou um riso) do partido” (expressão que gastou um alto responsável do PP, para surpresa dos interlocutores). No mês de outubro de 2013 o texto já ficou perfilado na sua forma definitiva.
O dia 11 de março de 2014 aprova-se a Iniciativa Valentim Paz Andrade por unanimidade. Foi um dia bem emocionante, destacando o discurso tão positivo que proferiu o Presidente do Parlamento, Sr. Santalices.
Doze dias depois de aprovada ponho-me em contacto com o DOG para saber quando ia ser publicada a Lei 1/2014, e são informado que dessa lei não tem recebido nenhuma comunicação. Vou ao Parlamento, descobrim que não fora feito o trâmite da sua comunicação, o que não falava muito bem da vontade do seu cumprimento. Trato com os responsáveis do Parlamento para que se mova, e o dia 23 é enviada para ser assinada pelo Presidente Feijóo. Sendo publicada no DOG o dia 8 de abril, quase um mês após a sua aprovação, é dizer com uma demora que é bem esquisita na Galiza no âmbito da publicação das leis.
Que acertos e que erros podes identificar olhando para atrás, desde hoje?
A Lei tem um grande relevo na imprensa portuguesa e valeu para o Presidente Feijóo, a máxima condecoração portuguesa.
Em que se traduziu a aprovação da lei, por parte deste governo? Pois muito pouca cousa, e isso insistindo com as autoridades políticas para ser levado a cabo.
Os dous primeiros anos ficaram em branco. O das televisões portuguesas na Galiza traduziron-no num convénio de colaboração com a RTP, que nem tem periodicidade nem critério. Além de alguma série o seu conteúdo principal são programas de música de charanga, como este do dia 7 deste mês, onde a TVG deturpa o galego e achega um bom carregamento de espanholada.
O mais interessante foi a incorporação do português ao ensino, dum jeito muito cativo, e com poucas vagas convocadas.
Muitas das poucas cousas que se deram, deveram-se a vontade portuguesa de caminhar por aí, e um Feijóo tão premiado e reconhecido em Portugal, como defensor da galeguidade e da lusofonia, que tinha que fazer gestos.
A Lei é absolutamente desconhecida da administração galega, deu pouco de sim, poderia vir a dar no futuro, porém a atitude galegofoba do governo, o seu envolvimento pleno no programa centralizador e impositor do modelo madrileno-castelhano “de defesa da igualdade de todos os espanhóis” que significa falando claro, o que é madrileno é o que nos faz iguais a todos os demais, e por tanto somos contra a discriminação da proteção da diferença, que só existe no mundo woke e LGTBIQ+, etc, etc.
Que vias achas que é mais conveniente apanhar, de agora em diante para otimizar o seu desenvolvimento?
Primeiro apoiar as escolas Semente, levando-as a todos os cantos.
Segundo, em todos os lugares onde o nacionalismo e o não nacionalismo tiver responsabilidade de governo, exigir a implementação da lei e do seu espírito.
Teceiro: Exigir o avanço do português no ensino, que devia ser fulcral, ajusta-se à Carta europeia das línguas e ao impulsionamento europeu de conhecer a língua do teu vizinho.