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Texto lido dentro da apresentaçom da Leitura Continuada
do romance Scórpio, de Carvalho Calero, no Espaço Livro da Culturgal
o sábado 30 de novembro de 2019, às 11:30 horas.

 

Bom dia a todas e a todos,

Bem-vindos!!!

Muitas graças por estardes aqui.

Muitas graças também à Culturgal, por partilhar este Espaço Livro um dia grande. Grande porque há Culturgal, algo que só sucede três dias por ano. E grande também, penso eu, polo que hoje nos ocupa, aqui e agora.

Este espiche que me vou marcar com a vossa licença, permisso e paciência, nom ía ter título. Mas um amigo avisou-me uns minutos antes de começar, Oes, tu sabes que no programa (da Culturgal) do dia de hoje, na meia hora que te toca falar pom: “Scórpio. Agal.”?

Por umha arcana razom (e dou graças a quem a tiver) onde devia pôr “Apresentaçom da Leitura Continuada do Scórpio, de Ricardo Carvalho Calero”, simplemente pom: “Scórpio. Agal.”.

Umha de duas, ou alguém guardou o seu password no lugar errado ou tentava, aborrecido, fazer um haiku que condensasse o perfume, a essência, de esta meia hora, e ficou apenas no primeiro verso. Seja como for, é misterioso, tem força, é binário e se alguém, outro alguém evidentemente diferente do poeta lacónico e imprudente, consultou esse programa para vir hoje aquí, há de vir bem intrigado. A ver se som quem de despejar-lhe as dúvidas no que diz respeito deste evento, também binário, pois há uma ideia e há um convite.

Se vos digo:

“-Eu son,/ Balbino. Un rapaz de aldea. Coma quen dis, un ninguén.”

 

Vem-vos a todos um título à cabeça e um autor. Por ler ou ouvir ler alguém, para si e/ou para outros.Talvez também para nós.

Se vos digo:

“Ondas do mar de Vigo,/ se vistes meu amigo…”

Também sabedes de que autor estou a falar.

E se vos digo?:

“Nascia, com a manhá, a terra de Ávila.”

Mmm. Possivelmente algum ande algo perdido, arredor de si, sem saber quem escreveu.

Mas se conhecemos estes títulos, a estes autores,

“Bem sei que nom hay nada/ Novo en baixo d’o ceo,/ Qu’antes outros pensaron/ As cousas qu’ora eu penso.”

É porque, de algumha maneira, por muitas razons, som clássicos. Aquelas obras que continuamos a ler e a reconhecer passado o tempo e que partilhamos com gente de geraçons e idades bem diferentes das nossas. Obras que identificamos só com escutar a primeira frase, mesmo sem ter chegado a ler o final, ou mesmo sem ter chegado a ler.

Como sabedes este ano 2020, que está quase às portas, tem como protagonista do dia das Letras Galegas a D. Ricardo Carvalho Calero, por fim! (Penso em todas as vezes que saim dum Gadis com Carlos Casares sostendo a cabeça na mao, olhando para mim; ou com Lois Pereiro olhando para abaixo; ou com António Fraguas, que de perfil, e sobre o papel de estraza, parece o que é, um homem de outro tempo. Penso em todas essas vezes em que me dizia, “como tarda a de Ricardo! A ver se para o ano que vem havemus saco!  Imaginades? 60.000 sacos de papel castanho com umha foto dele e umha das suas sentenças: “O galego ou é galego-português ou…” O que um ano é ciência-ficçom pode ser realidade no ano seguinte).

Também neste ano de 2020 que vem, cumprem-se 110 anos do seu nascimento e 30 da sua morte.

Som motivos suficientes para honrar a sua memória, para homenagear a umha das personalidades mais destacadas da língua e da cultura da Galiza do século XX. Para dar-lhe alento à obra de este homem-instituiçom, como o qualificou Ernesto Vázquez Souza num dos seus artigos. Mas, como? Como podemos dar-lhe alento com as nossas palavras, dar-lhe vida e voz à sua obra?

A resposta é óbvia: lendo-o. Pois tal qual. Mas nom da maneira clássica, quer dizer, na casa, na biblioteca, na escola, em silêncio, a sós, e de nós para nós. Nooom! Lendo, sim, mas de aquela maneira que gostamos de fazer aos cousas que mais gostamos de fazer: acompanhados por outros: amar, jantar, cantar, viajar, os prazeres que nos damos na vida –e ler é um deles— partilhados, compartidos ainda o som mais.

O que queremos –e aquí vem a ideia—  é fazermos todos juntos umha leitura continuada do seu romance Scórpio, que já postos com as efemérides, faz 33 crísticos anos em 2020.

E fazê-la em Compostela, que depois de Ferrol é a cidade mais vinculada ao nosso caro autor. A ideia é iniciá-la no 16 de maio, que é sábado, víspera de autos, para entrar no dia das Letras Galegas lendo de alto, entre todos e para todos, o seu romance.

Isto da leitura continuada é algo que, por outra parte, e até onde eu pesquisei, nunca se fijo antes na nossa terra. Nom sei se sabedes o que é umha leitura continuada, suponho que si, ainda que por aqui nom se leve muito (todo chegará) noutros lugares do planeta é mui habitual homenagear ou celebrar umha escritora ou escritor lendo algumha das suas obras, entre todos, em voz alta, dous ou três minutos por barba, sem mais pausa da necessária para dar o relevo ao seguinte leitor, do início até ao ponto e final. A gente junta-se num teatro como nas maratonas do Cineuropa. No cenário coloca-se um atril com um microfone e um exemplar da obra para ler e as pessoas, previamente inscritas, vam passando polo atril, umha atrás da outra, para ler um trecho do romance. Algumha destas leituras públicas continuadas duram umhas poucas horas, outras polongam-se vários dias com as suas noites, dependendo do tamanho da obra e da quantidade de leitores.

E o Scórpio presta-se às mil maravilhas para fazer umha leitura continuada. Por ser um romance coral ou polifónico. Isto quer dizer que há muitas vozes a falar e nós a ouvir. O seu título serve de alcunha ao protagonista da obra, Rafael Martínez Pinheiro, alias Scórpio, personagem arredor da qual gira este romance histórico. Mas Rafael nom tem voz nele. Ao longo dos 136 capítulos que tem a obra, o resto das personagens vam tomando a palavra, para contar-nos a sua história, a história de Rafael e, de passo, a dos primeiros anos do século passado até que chega a Guerra Civil. Aurélia, Francisco, Mercedes, Sagitário, Cleo, Marinha, Nona, Chéli, Socorro, Amália, Merche, A Sra. do Decano de Direito, Salgueiro, Amparo, Rosa, Um estudante, Helena, Manolo, Luzita, Casado, Jesus, Barreiro, Francisco Franco Bahamonde, Um contramestre, Miguel, Tucho, Um jornalista, Largo Caballero, Romero, Flores, Rosário, Pascual, Um sargento e Maluquer. Todos eles, no silêncio da palavra escrita, vam narrando-nos como é a vida de Rafael desde que nasce até que a guerra o leva e como vai sendo a vida deles no entanto.

Assi que, se agora vos digo:

“Antónia deu onte a luz. Foi um parto normal. A parteira nom achou dificuldades para realizar o seu cometido. Nom houvo que chamar médico algum. Agora, a mae e o neno jazem na humilde cama. A criança é formosa, de bom peso, com umha abundante penugem loira na cabeça.”

Ainda que nom ouvírades nunca antes estas palavras, sabedes de que livro e de que autor estou a falar.

Agora vem o convite.

Claro, havia que fazer a prova. Nomeadamente se nunca se tinha feito antes. Ninguém sabe quanto se tarda em ler um livro em concreto, de princípio a fim, até que pega nele e começa a ler e nom para até acabá-lo. Em ler o Scórpio, sem fazer qualquer pausa, mas lendo a um ritmo normal, pausado, tardam-se doce horas. Do tirom. Minuto acima minuto abaixo. Figemos várias provas. Doze horas. Assi que, se fazedes as contas, e cada um lê dous ou três minutos, precisamos umha boa quantidade de leitores e leitoras. 350 para ser exactos. Assim que estades todos convidados a ler um par de minutos deste Scórpio, o 16 e o 17 de maio em Compostela, estades todos convidados para fazer parte desta selecta tripulaçom de 350 pioneiros. E em troca de um par de minutos do vosso tempo, lendo em público, de alto, para vós próprios e também para os outros, teredes umha história a muitas vozes, as vozes dos que lêm e as vozes dos que falam, dos que nos falam desde esse tempo sem tempo, desde esse lugar sem lugar que é, preto sobre branco, a literatura da qual estám feitos os clássicos.

Muitas graças.

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