Diogo anda nos 40 anos. Nasceu e mora em Chantada, no centro geográfico da Galiza. Tem formação académica da Universidade da Corunha (na Galiza) e da Universidade do Minho (em Portugal), mas não possui um trabalho estável. Embora no seu currículo conste a sua experiência laboral no âmbito da comunicação, a ciência política e a sociologia, a crise económica foi mais forte e levou consigo o bem-estar do Diogo.
Conheci este galego num foro da internet: O Mundo Fala Galego. Após o inicial intercâmbio de mensagens no próprio grupo, comuniquei pessoalmente com ele para obter informação a respeito da Galiza, essa terra em que está o berço do nosso idioma.
Precisamente a respeito do idioma, foi a minha primeira pergunta. Diretamente, sem voltas, quis saber qual é a sua língua habitual e a resposta foi complexa: “Falo galego de um jeito habitual só desde os 26 anos. Embora o galego fosse a língua falada na casa por avós e pais, tardei em ser falante de galego. Na infância e na adolescência a minha família mudava de língua para falar comigo.
Durante a migração meus pais intensificaram o uso do castelhano. Substituíam o galego pelo castelhano e outro tanto passava com os jovens da minha idade.
Na escola falava-se o espanhol. Mesmo os docentes tinham esse hábito de mudar de língua para falar com os alunos, o mesmo que faziam as pessoas adultas nas ruas e nos comércios“.
Entendo, pois, que nestes últimos 15 anos é utente habitual dos dois idiomas, mas que o nosso tem uma certa preferência: “Salvo que tiver constância de que a outra pessoa não seja galega, respondo em galego, mesmo quando perguntado em castelhano. Faço a mudança só em caso necessário“.
Se na expressão oral alterna dois idiomas, na expressão escrita a diversidade é ainda maior. O castelhano tem só uma norma, com ligeiras diferenças entre a Europa e a América, mas a situação do português na Galiza é a de convívio entre dous sistemas de escrita: o tradicional, galego-português e o da Academia Galega, mais próximo do espanhol. Assim o explica Diogo: “Se escrevo em galego da RAG, a minha difusão será local fechada à fronteira politico-administrativa da Galiza. Para ser reconhecido e lido em Portugal, Timor-Leste, Brasil, etc, escrevo e falo no galego internacional“. Sou eu quem insiste para saber com qual se identifica mais e a resposta é contundente: “Gosto de escrever nas duas formas e também para ser lido e escutado noutros ambientes, a escolha do castelhano facilita uma possivel carreira como escritor e formador de opinião publica“.
Como muitos outros jovens da sua idade, Diogo abraçou o reintegracionismo através das reflexões linguisticas de Carvalho Calero e do labor divulgativo da AGAL: “Num momento da minha vida passou-me com o reintegracionismo um pouco como com os paradigmas cientificos. Primeiro esse paradigma parece uma loucura, que não tem sentido. Algo que está fora da toda racionalidade. Pouco a pouco fui entendendo a sua lógica discursiva e depois com o passar do tempo, fui me convencendo que o que não tinha sentido, fora de toda lógica acabou como sendo o mais sensato.
O meu caminhar para o reintegracionismo não se pode explicar por um unico só motivo, mas por um acúmulo de experiências ao longo da vida.
A minha experiência foi no 4° curso de Sociologia, na Universidade do Minho, em Braga (Portugal)“.
A estada formativa em Portugal foi determinante para consolidar essa visão mais universalista da cultura própria e Diogo retornou à Galiza sendo mais galego do que era no momento da saída e mais estrangeiro no seu país: “Depois desta experiência em Braga, vieram outras experiências com a leitura de Carvalho Calero, com o conhecimento de pessoas já comprometidas desde os anos 70 com a normalização linguistica, voltados evidentemente para os países galaicófonos e pouco a pouco com leituras, com materiais sobre sócio-linguística, com debates, com experiências, pouco a pouco fui caindo na conta de que o sistema linguístico cultural que nos convém, dum ponto de vista um tanto pragmático, como mais utópico, é a reintegração global holística, no sentido antropológico na comunidade galaicófona. Isso em todos os campos: científico, da comunicação e da produção cultural”.
Passamos, então, da língua para a sociologia e mesmo para a intervenção política. O Diogo reconhece que estes são os seus âmbitos de preferência: “Para mim a concepção do reintegracionismo tem um fundamento filosófico, político e uma intensão pragmática, transformadora que consiste em fazer todo o possível politicamente e pela comunicação para lograr e construir uma agenda midiática-informativa-cultural voltada para os países galaicófonos.
Considero que a língua é fulcral, mas pensando a meio e longo prazo, gostaria de que a Galiza tivesse como referência comunicativa, informativa, linguística e cultural os lugares galaicófonos, sem fazer uma analogia com as hispanidades linguisticas e culturais. Deste modo, defendo uma estratégia e afirmação da galeguidade que não seja uma negação das hispanidades. Nesta altura é a unica estratégia possível para descolonização integral do imaginário social da Galiza“.
Neste ano a Associação Galega da Língua (a AGAL, com quase 40 anos de atividade) lançou a ideia do binormativismo, o que implica que a administração política reconheça aquilo que o Diogo faz por simples operatividade: “Vejo o galego como uma língua que fala nos 5 continentes e que tem mais de 250 milhões de falantes. É uma língua viva que pode ter formas diversas. Penso que é possível uma estratégia bifurcada…editar no galego local, no galego internacional (como faz a AGAL) e também em castelhano. Não há contradição, podemos abrir todas as portas“.
Blogue do Diogo Tabuada: http://elalgebradelmiedo.com/category/galeguia/