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ZENÓBIA CAMPRUBÍ, EXCELENTE TRADUTORA DE OBRAS DE TAGORE

Dentro da série que lhe estou a dedicar aos grandes vultos da humanidade, que os escolares dos diferentes níveis devem conhecer, e que iniciei com Sócrates, com o número 82 da mesma, desta vez quero dedicar o meu depoimento a uma mulher excecional, nascida na Catalunha, que foi esposa de Juan Ramón Jiménez, a quem ajudou em todo o momento, e muito especialmente no seu interessante trabalho poético ao longo do tempo. Foi também uma grande feminista, republicana e, possivelmente, a melhor tradutora que houve no mundo de obras de Tagore (mais de 27) para outro idioma a partir do inglês, que dominava perfeitamente, para o castelhano. Conhecida como Zenóbia Camprubí Aymar (1887-1956), foi uma grande intelectual, com uma grande sensibilidade, foi escritora, ensaísta, tradutora, editora, filantropa, professora, feminista e trabalhadora social. Está considerada como uma das primeiras grandes feministas do nosso país, membro destacado do chamado Lyceum Club Femenino, criado no seu dia em Madrid, junto com Victória Kent, a partir do qual reivindicou constantemente uma maior presença da mulher em todos os âmbitos da sociedade. Entre as suas muitas iniciativas de tipo humanitário, destacaram várias campanhas a favor das crianças espanholas vítimas da guerra civil, realizadas da sua residência de Nova Iorque. Deve assinalar-se também o seu interessante labor na difusão da literatura, língua e cultura castelhana, especialmente nos ambientes literários dos EUA, no seu posto de professora da Universidade de Maryland. Os seus Diários possuem um grande valor, porque foi uma das poucas mulheres que deixou um diário escrito da vida e da literatura da primeira metade do século XX.

ALGUNS DADOS BIOGRÁFICOS:

zenobia-camprubi-foto-0De nome completo Zenóbia Salustiana Edith Camprubí Aymar, nasceu em Malgrat de Mar a 31 de agosto de 1887, e faleceu em S. Juan de Puerto Rico em 28 de outubro de 1956. Contraiu matrimónio em Nova Iorque em 2 de março de 1916 com o grande poeta Juan Ramón Jiménez, prémio Nobel de Literatura em 1956, para quem foi uma ajuda fundamental, companheira inseparável e decisiva colaboradora em todos os seus projetos literários, vivendo com ele quarenta anos da sua vida, e a quem cuidou com esmero, ajudou na edição da sua obra e velou pela sua apática atitude vital, apaziguando os seus tristes sentimentos. De uma abastada família catalã-porto-riquenha, culta e rica, era filha de Raimundo Camprubí Escudero e Isabel Aymar Lucca. Seu avô materno, Augusto Aymar, era um importante comerciante norte-americano e a sua avó pertencia a uma família procedente da Córsega, instalada em Porto Rico. Tanto a sua mãe como a sua avó estudaram nos melhores colégios dos EUA e mantinham muitos laços familiares no país americano. Seu pai era engenheiro de caminhos, canais e portos, e pertencia a uma família de militares da Catalunha, embora tenha nascido em Pamplona. Os seus pais, Raimundo e Isabel, casaram-se em 1879 em Porto Rico, aonde tinha sido enviado o pai para dirigir a construção de uma estrada entre Ponce e Coamo. O casal teve quatro filhos: José, Raimundo, Zenóbia e Augusto.

Durante os dous primeiros anos da vida de Zenóbia, ao chegar o verão, a família Camprubí deslocava-se à “Quinta” de Malgrat, para desfrutar do clima agradável mediterrânico no estio. No inverno de 1890 nasceu em Barcelona, Augusto, o seu irmão mais pequeno, sendo este o último ano em passar a família as suas férias em Malgrat, tema em que influiu a mudança de destinos de seu pai por necessidades de trabalho. Quando Zenóbia contava com nove anos viajou pela primeira vez aos EUA com o seu irmão mais velho José e sua mãe. O motivo foi para que seu irmão pudesse ingressar numa escola secundária e preparar o ingresso posterior em Harvard-Cambridge, ademais de arranjar os temas da herança, pois a avó falecera em 1895. Um ano mais tarde, por problemas de saúde de Zenóbia, a família tem que voltar e residir em Sarriá. Bairro em que conhece Maria Muntadas de Capará, que vai ser uma grande amiga. Em 1900, de forma cooperativa entre ambas, fundam uma sociedade que denominam “As abelhas industriosas”. Com treze anos e com esta ação já demonstra o seu grande espírito empreendedor, a sua inquedança e a sua organização. Em 1901 seu pai é destinado a Tarragona como chefe de obras públicas, e ela deve acompanhar a mãe e seu irmão Augusto até a Suíça, para ser tratado este de uma rara doença. Neste mesmo ano, no mês de março, publica na revista juvenil de Nova Iorque St. Nicholas, um conto curto sob o título de Uma escapada milagrosa (A Narrow Escape). Também dá à luz o seu trabalho autobiográfico Malgrat, inspirado na sua estadia nesta localidade da costa. Viaja de novo à Suíça e seu pai é destinado a Valência. Nesta cidade comenta que foi quando a sua infância foi mais triste e aborrecida. Porém, escreve e publica vários trabalhos literários (entre eles, O desvão que conheci). Aqui tem que encarregar-se do funcionamento do lar pois a sua mãe por uma temporada vai para Barcelona, onde mora com a sua família política. Zenóbia consegue um prémio literário, com insígnia de ouro da revista St. Nicholas Illustrated Magazine for Boys and Girls, pelo seu depoimento intitulado “Quando a minha avó assistia à escola”.

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Em 1905, devido à separação matrimonial de sua mãe, partem ambas para viver aos EUA. Estabelecem-se em Newburgh (cidade de N. Iorque), onde moram numerosos familiares e amigos da família. A viagem inicia-se com uma visita ao Canadá em setembro, acompanhada do seu tio materno José, e o seu irmão Raimundo, esperando-os no Quebeque a sua tia Lillian. Durante estes anos, a vida que leva nos EUA é totalmente diferente à espanhola. Em Washington, Boston e Nova Iorque mexe-se de forma livre, assistindo a bailes, reuniões, almoços, chás e todo o tipo de acontecimentos sociais. Entretanto continua a ler e estudar latim, literatura, música, história europeia e americana, escrevendo, assistindo a atos culturais, preparando-se para o futuro e cuidando a sua formação. Começa a ser cortejada por Henry Shattuck, advogado amigo da família. Em 1908 matricula-se no Teacher´s College da Universidade de Columbia (N. Iorque), para cursar estudos de literatura inglesa e composição, e é também admitida na Escola de Pedagogia desta universidade. Depois de uma reconciliação matrimonial da sua mãe Isabel regressam ambas em 1909 a Espanha, acompanhadas da prima Hanna. Zenóbia era conhecida com a alcunha de “a americanita”, pois foi em Colúmbia onde iniciou os seus estudos superiores, onde assistiu a atividades culturais e clubes feministas, entrando em contacto com o feminismo estado-unidense, viajando livre e só, lendo os clássicos ingleses e castelhanos e seguindo cursos de literatura. O seu pai desempenhava o cargo de engenheiro-chefe do porto em La Rábida-Palos de la Frontera (Huelva), e, por isto passam a morar nesta localidade do sul. Numa dependência da casa, Zenóbia cria e improvisa uma escola para dar aulas a dezanove crianças dos arredores. Em 1910 o pai é destinado a Madrid e passam a morar no prédio número 18 do Passeio da Castelhana. De volta de uma viagem relâmpago à Suíça em março de 1911, Zenóbia e sua mãe passam por Barcelona e visitam Malgrat. Era a primeira vez que voltava à casa natal, que lhe pareceu triste e escura. Em outubro tem lugar a sua terceira viagem aos EUA, com motivo do nascimento da primeira filha de seu irmão José, chamada Inés. Ali surge a ideia de exportar artesanato, bordados e livros norte-americanos. Em 1912 volta a Madrid nos primeiros meses do ano, e continua a publicar artigos em revistas americanas. Aproveita tudo o que Madrid lhe oferece e involucra-se em projetos culturais e intelectuais. Relaciona-se fundamentalmente com estado-unidenses, já não gostava nada de não poder andar só com liberdade, até que conheceu Susan Huntington, que dirigia o Instituto Internacional de Senhoritas, onde moravam estrangeiros que assistiam aos cursos de verão que se organizavam no mesmo e na Residência de Estudantes.

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Logo mais a seguir, comentaremos o seu conhecimento e relacionamento com o poeta Jiménez, a época do seu exílio e o seu legado e obra literária. Ademais do seu fantástico labor de tradutora, especialmente da obra de Tagore, do inglês para o castelhano, com mais de 27 livros editados em Espanha e na Argentina, e alguns dos que existe o manuscrito da tradução, embora, hoje em dia, ainda não tenham sido publicados.

FICHAS TÉCNICAS DOS DOCUMENTÁRIOS:

1. Biografia de Zenóbia Camprubí.

Duração: 5 minutos.

2. Zenóbia Camprubí: Biografia (por Cláudia).

Duração: 5 minutos.

3. Zenóbia Camprubí (série “Mulheres na História”).

Duração: 3 minutos. Produtora: EMA RTV (Ano 2007).

4. Uma aproximação a Zenóbia Camprubí Aymar.

Duração: 36 minutos. Realiza: Alma Alanís.

5. Juan Ramón Jiménez: Vida, obra e morte dum Nobel de Literatura.

Duração: 17 minutos. Ano: 2013.

6. Biografia de Juan Ramón Jiménez (vários vídeos)

Duração: 9 minutos.

Ver em: https://sites.google.com/site/poemademoguer/home/biografia

7.-Desmontando a JRJ.

Duração: 12 minutos. Realizam: Estudantes de quarto ano do IES S. José.

Ver em: https://sites.google.com/site/poemademoguer/home/biografia

VIDA COM JIMÉNEZ ANTES DO EXÍLIO:

O dia 9 de julho de 1913 Zenóbia rompe as suas relações com o americano Henry Shattuck, que queria casar com ela. Por carta comunica-lhe que podem continuar a ser amigos, embora ela não tivesse interesse no casamento. Em Madrid assistia a muitos atos e conferências, acompanhada do casal americano dos Byne, que organizava festas, e numa delas escuitou falar de um estranho e esquisito poeta que morava na Residência de Estudantes da ILE, que se queixava do barulho, embora colasse o ouvido à parede quando ouvia o riso de Zenóbia, que ainda não conhecia. Precisamente foi numa palestra pronunciada pelo pedagogo Cossío onde a conheceu pela primeira vez, dentro de uns cursos organizados pela Junta de Ampliação de Estudos e Investigações, celebrados em Madrid na Residência mencionada, onde ele trabalhava. Em 1914 Zenóbia traduz uns poemas da Lua crescente de Tagore, incluindo um poema-limiar de Jiménez. Em junho visita Ávila e Segóvia, e em finais de ano há alguns problemas no relacionamento entre ambos. Ao não poder entregar a tradução do livro tagoreano antes citado para ser publicado, a modo de compensação publica-se uma edição para crianças do Platero e eu.

Com Gabriela Mistral e outras escritoras e artistas na Residencia de Estudantes
Com Gabriela Mistral e outras escritoras e artistas na Residencia de Estudantes

Em dezembro deste mesmo ano, com a sua mãe embarca desde Cádis para Nova Iorque, pois a sua progenitora queria evitar as relações com o poeta, de quem não gostava, e para conhecer a segunda filha do seu irmão mais velho José, chamada Leontine (familiarmente, “Beba”). Porém, no dia 12 de fevereiro de 1916 Jiménez chega a Nova Iorque à procura de Zenóbia, e casam na igreja católica de St. Stephen da cidade no dia 2 de março. Na sua lua de mel percorrem os EUA: Boston, Filadélfia, Baltimore, Washington… Em 7 de junho embarcam no paquebote “Montevideo”, acompanhados da mãe de Zenóbia, com destino a Espanha. Desembarcam em Cádis e partem para Sevilha, onde passam um par de dias, pondo rumo a La Palma del Condado, onde são esperados pelos familiares dele, desejosos de conhecer por fim a esposa. Em 1 de junho chegam a Madrid. Em 1917 Zenóbia traduz quatro obras de Tagore a que o poeta lhe pôs ao início outros tantos poemas seus. Em 1918 Zenóbia funda em Madrid, em cooperação com Katherine Bourland, Maria de Maeztu e Rafael Ortega e Gasset, a denominada “La Enfermera a Domicílio”, associação que tem como objetivo cuidar da saúde das crianças e adultos doentes de famílias operárias, procurando-lhes alimentos e medicamentos e levando-os a dispensários e à consulta de médicos prestigiosos que os atendiam de graça. Ademais, pôs-se à frente de pequenos negócios que compensaram os problemas económicos do casal, calmou o ânimo do esposo, animou a sua escrita e sorteou problemas tão importantes como abandonar Espanha dignamente depois do golpe fascista de Franco e a guerra civil.

Adaptada para o teatro e traduzida por Zenóbia, a 6 de abril de 1920 teve lugar a estreia de O carteiro do rei de Tagore. Houve três funções da mesma em dias seguidos com certo sucesso. Nesta altura fez uma sociedade com Inés Muñoz para continuar com a exportação de trabalhos de artesanato, bordados, cerâmica e livros a América, seguindo o modelo iniciado antes com o seu irmão José. No mês de outubro, junto com Maria Goyri de Menéndez Pidal e Maria de Maeztu, funda o “Comitê para a Concessão de Bolsas a Mulheres Espanholas no Estrangeiro”, em que desempenha o cargo de secretária desde a sua fundação, e até 1936. Aparece então a ideia nova de criar outro negócio: subarrendar andares a que ela colocaria os móveis, aproveitando que muitos americanos, e seus familiares, lhe solicitavam a procura de locais adequados e ao seu gosto para poder morar em Madrid, o que na altura não era fácil. Nesta época muda-se de domicílio com seu esposo para a rua Lista número 8. Em 1921 apresenta-se no Ateneu de Madrid, na versão de Zenóbia, a peça teatral de John M. Synge Ginetes cara o mar, e traduz uns quantos contos de Tagore. Em 1922 realiza uma breve viagem à Catalunha e às Baleares com a sua amiga Inés Muñoz. Em Barcelona visita o seu tio paterno e os amigos da infância.

Com 78 anos, o dia 15 de março de 1924 falece em Madrid o seu pai. Convidados por Garcia Lorca e a sua família, em finais de junho e princípios de julho, Zenóbia e Juan Ramón passam umas férias em Granada, embora não fosse esta a primeira vez que ela ia à cidade da Alhambra. Em agosto passam uns dias em Moguer, e em outubro viajam de novo à Andaluzia, passando por Málaga, Córdova, Sevilha e Moguer. Em 1926 funda-se em Madrid o “Lyceum Club Femenino Espanhol”, uma das primeiras associações de mulheres criada no nosso país. Zenóbia vai ser a sua secretária, e Maria de Maeztu a presidenta. Desenvolveu um importante labor social influindo de maneira notável no panorama cultural da época. No verão o casal viaja pela península, percorrendo o noroeste: Sória, Logronho, Pamplona, Donóstia, Bilbau, Santander, Astúrias, Compostela, Vigo e Leão. Em 1928 funda em Madrid o estabelecimento chamado Arte Popular Espanhola, para a venda de artesanato do país, e decora o hotel Parador Nacional da Serra de Gredos (que foi o primeiro parador nacional). Em 18 de agosto do ano antes citado falece a mãe de Zenóbia. Em julho de 1929, o casal viaja a Salamanca, onde visitam Unamuno. Em Samora encontram-se com o irmão mais velho de Zenóbia, José, e a sua família, que vêm visitar as exposições de Barcelona e Sevilha e também Moguer. Em agosto o casal viaja ao sul da França, visitando Hondarribia, Irun, Hendaia, Biarritz, Baiona, Pau e Tarbes, e instalam-se em Lourdes. Em meados de agosto de 1930, a cunhada de Zenóbia, Ethel, e a sua sobrinha, Leontine, acompanhadas do casal, viajam a Vigo, para apanhar um barco para Nova Iorque. Desde Vigo, Zenóbia e Juan Ramón viajam a Barcelona para visitar alguns dos amigos dela.

Em 1931 descobre-se um tumor a Zenóbia, mas decide não operar-se, recebendo tratamento para evitar o seu crescimento. Tal tratamento é com Raios X de forma intensa para solucionar os problemas de saúde e evitar a intervenção. A escultora Marga Gil Roësset esculpe um busto de Zenóbia, e enquanto realiza o trabalho apaixona-se por Juan Ramón, e suicida-se por amor num pequeno hotel das Rozas em 8 de julho deste ano. Deixa cartas e um diário ao casal. Em 1935 dedica-se Zenóbia a decorar o hotel Paradero de Ifach em Calpe (Alacant) e de maneira gradual deixa de subarrendar andares que ela decorava, ao não ser já o tema rentável.

GRANDE TRADUTORA DA OBRA DE TAGORE:

Dous anos antes de se casar, nos tempos em que Zenóbia e Jiménez se conhecem em Madrid e iniciam um especial noivado, em 1914, cai nas mãos dela uma edição de A lua crescente (The Crescent Moon) de Tagore em inglês, pela editora de Londres e Nova Iorque Macmillan. Gosta tanto dos poemas, dedicados à mãe e a sua criança pelo poeta bengali, que decide traduzir alguns para o castelhano. O esposo também gosta e decidem publicar o livro em 1915, que recolhe um grande sucesso ao ponto de ter que fazer várias edições do mesmo. De alguma maneira, Tagore ajudou em grande medida ao relacionamento amoroso inicial de ambos, que se manteve durante o resto da sua vida, por mais de 40 anos da mesma. Zenóbia era quem sabia inglês e quem realizou a tradução de mais de 27 livros tagoreanos, alguns dos quais ainda não foram editados e se conservam os manuscritos das traduções realizadas por ela no Arquivo Histórico Nacional de Madrid, que eu no seu dia consultei, com permissão da família de ambos. Juan Ramón o que fazia era depois do texto traduzido pela sua esposa, dar ao mesmo o seu “toque” poético. Infelizmente, – é provável que no único erro que Tagore cometeu na sua vida –, em abril de 1921, o poeta indiano suspendeu com o envio de um curto telegrama da Suíça, a sua viagem a Espanha que estava prevista em firme, e muito bem preparada durante tempo por Jiménez, com todo o tipo de pormenores (representações teatrais, recitais poéticos, excursões, etc.). O casal ficou tão zangado, o que é muito compreensível, que desde esse momento deixaram de traduzir e publicar mais obras tagoreanas, embora tivesse um contrato com a editora britânica para poder passar para o castelhano tudo o que em inglês se fosse publicando pela londrina Macmillan. Estou certo de que, se Tagore tivesse viajado ao nosso país, teríamos publicados em castelhano, traduzidos por Zenóbia, todos os livros que se fossem publicando de Tagore no Reino Unido e nos EUA, até o ano 1956. Mesmo tampouco entendo o quão frias eram as cartas de resposta a Zenóbia enviadas por Tagore, de que tenho cópias, ao contrário das que enviava Zenóbia, que eram maravilhosas.

Ainda hoje em dia, existindo o manuscrito da tradução, está sem publicar a interessante biografia que sobre Tagore escrevera Ernest Rhys, e se publicara em 1915. A seguir resenho todas as traduções de livros de Tagore que realizou Zenóbia, colocando entre parêntese o ano da primeira edição, o título em castelhano e na nossa língua, e o título original, no seu caso, em bengali (Bangla):

-A lua nova ou crescente (La luna nueva)-Shishu (1915). Poemas.

-O carteiro do rei (El cartero del rey)-Dakghor (1917). Teatro.

-Pássaros perdidos (Pájaros perdidos)-Stray Birds (1917). Aforismos.

-O jardineiro (El jardinero)-Mali (1917). Poemas de amor.

-O asceta (El asceta)-Sonyosi (1918). Teatro.

-O rei e a rainha (El rey y la reina)-Raja o Rani (1918). Teatro.

-Ciclo da primavera (Ciclo de la primavera)-Falguni (1918). Teatro.

-A colheita (La cosecha)-Fruit Gathering (1918). Poemas.

-Oferenda lírica (Ofrenda lírica)-Guitanjoli (1918). Poemas.

-Malini (Malini)-Malini (1918). Teatro.

-Chitra (Chitra)-Chitrangoda (1919). Teatro.

-Prenda de amante (Regalo de amante)–Lover´s Gift (1919). Poemas.

-Morada da Paz (Morada de Paz)-Shantiniketan (1919). Ensaio pedagógico.

-O rei do salão escuro (El rey del salón oscuro)-Raja (1919). Teatro.

-Sacrifício (sacrificio)-Bisorlhon (1919). Teatro.

-Trânsito (Tránsito)-Crossing (1920). Poemas.

-Mashi e outros contos (Mashi y otros cuentos)-Golpo (1920). Contos.

-A irmã mais velha e outros contos (La hermana mayor y otros cuentos)-Golpo (1921). Contos.

-As pedras famintas e outros contos (Las piedras hambrientas y otros cuentos)-Golpo (1922). Contos.

-A fugitiva (La fujitiva)-The fugitive (1922). Poemas.

-Jardinzinhos do Natal e Ano Novo (Jardinillos de Navidad y Año Nuevo)-Antologia de poemas (1933).

-Memórias ou Lembranças (Recuerdos)-Lhibomsmriti (1961). Autobiografia.

-O naufrágio (El naufragio)-Noukadubi (1964). Romance.

-Vislumbres da Bengala (Entrevisiones de Bengala)-Glimpses of Bengal (1965). Cartas.

-Poemas de Kabir (poemas de Kabir)-Poems of Kabir (1965). Poemas.

-O senso da vida (El sentido de la vida)-Sadhona (1968). Livro filosófico.

-Nacionalismo (Nacionalismo)-Nationalism (1968). Livro sociopolítico.

Todas as edições foram realizadas em Madrid e as reedições dos anos trinta, durante a República, foram em grande parte escolhidas por António Machado para distribuir nas escolas e com as Missões Pedagógicas nas bibliotecas ambulantes das mesmas, levando todas o carimbo oficial do Padroado de Missões. Quando Zenóbia e Jiménez partiram para o exílio americano, levaram com eles os direitos das edições, sendo publicados em numerosas edições e reedições (em alguns títulos mais de 15 edições) na editorial Losada de Buenos Aires, na sua coleção literária de clássicos e contemporâneos. Nos anos oitenta e noventa, a família de Zenóbia e Jiménez, cobrando logicamente os direitos, permitiu outra vez a sua edição no nosso país nas editoras Plaza-Janés e Alianza Editorial, em que também se continuaram levando a cabo mais reedições das obras de Tagore.

VIDA COM JIMÉNEZ DURANTE O EXÍLIO:

Ao início da guerra, nos primeiros dias, Zenóbia e Juan Ramón colaboram com a proteção de menores no cuidado e alojamento de crianças órfãs de guerra, acolhendo 12 meninos de 4 a 8 anos num rés do chão da rua Velázquez, número 69. Em 22 de agosto de 1936 tomam o caminho do exílio, saindo pela fronteira da Jonquera catalã. Quatro dias depois embarcam em Cherburgo no transatlântico “Aquitânia” com destino a Nova Iorque, e o casal inicia um périplo em que vão percorrer Cuba, EUA, Buenos Aires e Porto Rico, onde Zenóbia trabalhou como professora. Em 29 de outubro dá uma palestra em Porto Rico, sob o título de “A mulher espanhola na vida do seu país”. Em 1937 e 1938 o casal encontra-se em Cuba, morando no hotel Vedado da capital cubana. Ali o casal desenvolve uma série de atividades culturais e sociais, e participam em algum ato político de apoio à República. Continua ademais a sua preocupação pelas crianças órfãs, angariando fundos através de subscrições em La Prensa de Nova Iorque e outros meios, para mandá-los a Espanha. Zenóbia trabalhou como voluntária em cárceres de mulheres e doava roupa para que quando as pressas saíssem tivessem algo que vestir-se. Em janeiro de 1930 deslocam-se para Nova Iorque, e depois instalam-se em Coral Gables de Miami (na Florida). Ao finalizar a guerra, o andar madrileno do casal, que fora respeitado durante a contenda, foi saqueado, desaparecendo livros, documentos e outros objetos pessoais. Em janeiro de 1940, Jiménez dá palestras formais na Universidade de Miami, fazendo a versão simultânea para o inglês a sua esposa. Em 1942 falece de um enfarte o seu irmão mais velho e mais querido, José. Em 1943 o casal muda-se para Washington, e em janeiro de 1944 Zenóbia é reclamada pela Universidade de Maryland para dar aulas de língua castelhana, e depois do grande sucesso que teve, foi contratada pelo departamento de História e Cultura europeias, passando em 1945 a ser contratada com vaga permanente. Ambos os dous deslocam-se para viver a Riverdale, onde dous anos mais tarde compram uma casa, em que também Juan Ramón vai dar explicações particulares. Em 1948 o casal viaja pela Argentina e pelo Uruguai, que se alarga a mais de três meses, chegando o poeta a dar 12 conferências. A acolhida e recebimento nestes dous países foi extraordinária, calorosa e multitudinária, que mesmo surpreendeu gratamente ambos. Nos meses de novembro e dezembro de 1950 viajam a Porto Rico, onde ele se encontra melhor por causa da sua crise nervosa. Em 1951 Zenóbia é operada de cancro em Boston, e em 1954 voltam a morar em Porto Rico, pois ele não suportava viver nos EUA. Zenóbia acompanha o seu esposo, apesar de ter lá uma boa vida intelectual e ter mais facilidades médicas e melhor tratamento, se tivesse que voltar a operar-se, o que finalmente aconteceu. Em Porto Rico Zenóbia assina um contrato com a universidade para traduzir folhetos de divulgação científica, durante um ano. E começa a dar aulas na universidade de Río Piedras. Em finais deste ano é operada de novo dum cancro no hospital geral de Massachusetts-Boston.

Nos inícios de 1953, o seu irmão Augusto, doente também de cancro, passa uma temporada com o casal em Porto Rico, antes de voltar para os EUA, onde falece em finais de março. Zenóbia termina o tratamento médico e determinam a sua cura. Neste ano trabalha sem descanso, ajudando o esposo datilografando todo o seu trabalho numa época de muita produção literária. Em 1954 Zenóbia deixa de trabalhar na universidade por prescrição médica, apesar de lhe ter sido dada alta. A revista Américas publica o seu trabalho autobiográfico intitulado Juan Ramón e eu. A universidade de Porto Rico, em 1955, cede uma sala ao casal, que vai denominar-se “Sala Zenóbia-Juan Ramón Jiménez”. Ao mesmo tempo cria-se em Moguer a casa de Cultura Zenóbia-Juan Ramón. Infelizmente, em 1956 aparece de novo o problema do cancro de Zenóbia, iniciando em abril o tratamento com Raios X, que lhe provocam graves queimaduras. No mês de junho volta a Boston, com a intenção de ser operada de novo, mas os doutores desaconselham a intervenção, dando-lhe poucos meses de vida. Zenóbia falece em 28 de outubro de 1956, na clínica Mimiya de Santurce-Porto Rico, três dias depois de que seu esposo fosse proclamado pela Academia sueca Prémio Nobel de Literatura do ano 1956. O seu esposo sobreviveu a Zenóbia, com grande tristura, durante os dous seguintes anos. Embora tenha recebido com alegria o povo de Moguer a concessão do prémio a Jiménez, em 29 de outubro a corporação municipal decidiu suspender os atos oficiais, celebrar um solene funeral, que teve lugar em 5 de novembro, e declarar Zenóbia filha adotiva da cidade natal de seu esposo, e dedicar-lhe a rua das Flores com o seu nome. Em 1958, dous anos depois de falecer, os restos de Zenóbia e seu esposo foram trasladados para ser depositados no cemitério “Jesus” de Moguer.

Por não poder viajar no dia 10 de dezembro de 1956 Jiménez a Estocolmo, para recolher o prémio, o seu discurso foi lido pelo reitor da universidade de Porto Rico, professor Jaime Benítez. As palavras mais formosas e profundas do seu discurso, acertadamente e com justiça, foram dedicadas à sua esposa Zenóbia, que realmente amou em todo o momento. Porque sabia bem que ela também lhe dedicou a sua vida com amor profundo, e sabendo manter também a sua independência como mulher e feminista que era.

LEMBRANÇAS LITERÁRIAS:

Além das pequenas obras e artigos citados ao longo do texto anterior, e as traduções das obras tagoreanas resenhadas, e outras traduções de autores como Shakespeare, Edgar Alan Poe e John M. Singe, Zenóbia escreveu e publicou os seguintes livros: Juan Ramón y yo (1954), Diario I. Cuba (1937-1939), Diario II. Estados Unidos (1939-1950) e Diario III. Puerto Rico (1951-1956). Monumento de amor: Cartas (1959), Vivir con Juan Ramón (1986), Poemas y cartas de amor (1986) e Cuadernos de Zenobia y Juan Ramón (1987). A fundação José Manuel Lara publicou o seu Diario de juventud, que apresenta a sua vida de 1905 a 1911. A Residência de Estudantes de Madrid publicou o livro Monumento de amor (J. R. Jiménez-Zenóbia Camprubí) e outros dous livros: Cartas a Juan Guerrero (1917-1956) e Zenóbia Camprubí-Graciela Palau de Nemes: Epistolario. Pela sua parte, Alianza Editorial editou um estuche com os seus três Diários. E a Universidade de Huelva o livro Zenóbia Camprubí y Olga Bauer. Epistolario (1932-1956). A maior especialista da vida e obra de Zenóbia é Emília Cortés Ibáñez. Em Moguer funciona a Fundação Zenóbia-Juan Ramón Jiménez, e existe uma casa-museu a eles dedicada.

TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR:

Vemos os documentários citados antes, e depois desenvolvemos um Cinema-fórum, para analisar a forma (linguagem fílmica) e o fundo (conteúdos e mensagem) dos mesmos, assim como os seus conteúdos.

Organizamos nos nossos estabelecimentos de ensino uma amostra-exposição monográfica dedicada a Zenóbia Camprubí, a sua obra, as suas ideias, o seu pensamento e as suas propostas sociais. Na mesma, ademais de trabalhos variados dos escolares, incluiremos desenhos, fotos, murais, frases, textos, lendas, livros e monografias.

Podemos organizar no nosso estabelecimento de ensino um Debate-papo. No mesmo é bom que participem estudantes e docentes, e realizar a leitura de algum dos seus livros em que fala da sua vida e relacionamento com Jiménez. O tema central podia ser sobre como Zenóbia, sendo uma importante feminista, progressista e republicana, soube, com grande inteligência e sensibilidade, manter a sua independência, amar o seu esposo e ajudá-lo tão bem para desenvolver a sua criatividade literária e poética, apesar dos problemas psicológicos e depressivos que tinha o poeta, repetidos muitas vezes. A tal ponto que, sem Zenóbia, Jiménez não teria chegado a ser o grande literato em língua castelhana que foi na realidade.

 

 

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