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RAM MOHON RAY, O VOLTAIRE INDIANO

 

De 15 a 27 de novembro costuma celebrar-se em muitos lugares e países a denominada «Semana pela Tolerância». Tema que, dada a triste situação em que se encontra o mundo atual, teria que ser de obrigada comemoração nos estabelecimentos de ensino de todos os níveis, organizando atividades educativo-didáticas, artísticas e lúdicas adequadas e convenientemente programadas e desenhadas. Dentro da série que estou a dedicar aos grandes vultos da humanidade, que todos os nossos estudantes devem conhecer, acho que a figura mais idónea para tema de tanta importância é sem dúvida o indiano-bengali Ram Mohon Ray, também conhecido como Rajá Rammohun Roy (o apelativo de «Rajá», que significa rei, foi-lhe atribuído pelos britânicos, que gostaram sempre muito de outorgar discricionalmente títulos nobiliários). Neste meu depoimento uso os nomes e apelido tal como devem pronunciar-se no idioma Bangla (Bengali), e corresponde com o número 20 da série que iniciei com Sócrates. Tenho a esperança de que o meu depoimento ajude a dar a conhecer em Ocidente, e especialmente no mundo lusófono, uma pessoa tão extraordinária, como, infelizmente, tão desconhecida, agás em Bengala e outras partes da Índia.

Uma das figuras mais importantes da Índia era bengali. Na Índia todo o mundo conhece, mais ou menos, os nomes de Gandhi, Tagore, Vivekanando… É como na Galiza, onde todo o pessoal tem ouvido falar de Castelão, Risco, Otero… embora tenhamos esquecido Ben-Cho-Shey, Biqueira, Vilar Ponte ou Cuevilhas. E na Índia, Ram Mohon Ray foi um vulto fundamental, importantíssimo. O meu filho David Paz, mestre e jornalista, com acerto, opina que foi o Voltaire indiano. Ray tinha nascido em 22 de Maio de 1772 na localidade de Radhanogor, situada no distrito bengali de Hugli. Com 61 anos, morreu em Stapleton-Bristol (Reino Unido), em 27 de Setembro de 1833. Em frente à catedral desta cidade britânica, onde está soterrado, tem uma estátua grandiosa. Como a sua aldeia natal está relativamente perto de Santiniketon, aproveitando que todas as quartas-feiras na «morada da paz» tagoreana são sempre feriadas, em lugar de todos os domingos, alugámos um táxi e acompanhado do meu estudante de galego-português e castelhano, Toton Kundu, fomos ver um dos mais formosos lugares da Bengala Indiana. Fomos a Radhanogor e Khanakul, onde fica o museu e biblioteca dedicados a Ray. E onde também fica, já em ruínas, a sua casa familiar, rodeada de um jardim muito lindo, cheio de flores, e de um rio com barcas. Um verdadeiro paraíso, muito bem cuidado. Tirámos fotos e contámos com a inestimável colaboração de um guia que tem ali a morada, chamado Nitobroto Mukhopadai. Este guia, de apelido nobre e brâmane, escreveu uma monografia sobre esta personagem. Mas, por que é que foi tão importante Ram Mohon Ray? Era uma pessoa tão excecional e tão inteligente que chegou a dominar dez idiomas de forma completa: o bangla, o hindi, o sânscrito, o árabe, o hebreu, o inglês, o urdu, o latim, o grego e o francês. Isso permitiu-lhe ler muitos livros sagrados das diferentes religiões, ademais das diferentes filosofias e livros científicos e sociais, e levar a feliz termo a integração ou síntese dos aspetos positivos dos movimentos sociais e religiosos: o cristianismo, o budismo, o hinduísmo, o islã, o jainismo, o sikhismo e inclusive os princípios de igualdade, fraternidade e liberdade da revolução francesa.

Com a ajuda do seu amigo Dworkonath, avô de Robindronath Tagore, criou uma sociorreligião chamada «Brahmo-Somalh» (escrevo seu nome como deve pronunciar-se em Bangla), contrária a todos os aspetos negativos da vida indiana: as castas, os rituais absurdos, a idolatria, a queima das viúvas vivas na pira funerária do esposo (costume infame chamada «Sati»), as desigualdades sociais, a falta de educação da mulher e a sua dependência total do marido… Todo realmente revolucionário naquele contexto histórico. E mesmo na atualidade. Por isso, Ray foi um grande reformador e teve grande importância para mudar muitas cousas neste grande país. O pai de Tagore, Devendronath, continuou a sua obra e o filho recebeu de Ray muita influência, tal como o grande vate reconheceu sempre. O pai de Tagore e ele mesmo chegaram a ser presidente e secretário, respetivamente, do mencionado movimento sociorreligioso.

Ray foi também o primeiro jornalista da Índia e, como tal, o primeiro defensor da liberdade de imprensa; o primeiro defensor da educação moderna; o primeiro que, como um profeta, ideou um projeto de liga das nações do mundo; o primeiro defensor dos labregos e trabalhadores e dos seus direitos na sua terra, cousa que defendeu com verdadeiro ardor no parlamento britânico; o construtor da Índia moderna e um verdadeiro pai deste imenso e formoso país de cultura milenária. Recomendamos aos nossos leitores que leiam o que sobre este Voltaire indiano aparece em muitas páginas da Internet sobre a sua figura e importância. Embora existam poucas escritas na nossa língua ou em castelhano.

FICHAS TÉCNICAS DO FILME E DO DOCUMENTÁRIO:

1. Filme: Raja Rammohon.ram-mohon-ray-filme-1965-capa-dvd

Diretor: Bijoy Bosu (Bengala-Índia, 1965, 140 min., preto e branco).

Fotografia: Ojoy Mitro. Música: Robin Chottopadhyay.

Nota: Podem ver-se 2 fragmentos do filme em versão Bangla entrando nas ligações:

https://www.youtube.com/watch?v=8T6lxjHO5PE

http://hdwon.asia/video/raja-rammohan–bengali-full-movie-chhaya-debi/8T6lxjHO5PE.html

Atores: Bosonto Chowdhury, Chhaya Debi, Basobi Nondi, Banani Chowdhury, Chonda Debi, Rajlaxmi Chowdhury, Roma Das, Uttra Das, Bani Chottopadhyay, Ratna Ghosal, Gita Gupto, Asit Baran, Torun Kumar, Komol Mitro e Shailen Mukhopadhyay.ram-mohon-ray-foto-filme-1965-1

Argumento: O filme apresenta de forma cinematográfica a vida e obra de Ram Mohon Ray, as suas reivindicações, as suas luitas contra a queima das viúvas vivas, as castas, a intolerância, a idolatria e as irracionais atuações dos defensores da ortodoxia hinduísta, ademais da criação por ele e seus amigos e seguidores da sociorreligião denominada Brahmo-Somalh, até as suas reivindicações no Reino Unido e a sua morte em Bristol, por um ataque de meningite a 27 de setembro de 1933. No filme aparecem também entrevistas a pessoas que opinam sobre Ram Mohon Ray, e em concreto: Sondhya Mukhopadhyay, Manobendro Mukhopadhyay, Nirmolendu Chowdhury, Mintu Dasgupto e o Dr. Gobindo Gopal.

2. Documentário: Rajá Ram Mohan Roy.

Realizadores: P. C. Sharma e Prokash Chondro Sharma (Índia, 1984, 20 min., preto e branco).ram-mohon-ray-foto-documentario-1984-1

Produtora: Films Division do Governo indiano. Falado em inglês. Existe edição em DVD.

Ligação: https://mail.google.com/mail/u/0/?tab=wm#sent/15f4e7518959fc59?projector=1

Argumento: Pequena biografia de Ram Mohon Ray.

Nota: Existem outros documentários sobre R. M. Ray, a sua vida e obras. Ver entrando na ligação:

 http://hdvidzpro.me/video/raja-ram-mohan-roy-movie

LUITANDO DESDE JOVEM CONTRA A INTOLERÂNCIA:

Ram Mohon Ray (1772-1833) foi um dos principais intelectuais na Índia do século XIX, como antes comentámos. Foi o líder dum movimento de reforma social e religiosa conhecido como «Brahmo-Somalh». A sua influência fez-se notar nos campos da educação pública e da administração. Entre outras cousas é célebre por ter propugnado a abolição do sistema hinduísta das castas e as «sati» (tradicional e infame imolação das viúvas nas piras funerárias dos seus maridos falecidos), o que o converte num dos principais reformadores da Índia. Hoje em dia as castas, embora não se contemplem na Constituição indiana, por terem sido fomentadas pelo seu particular interesse pelos britânicos, continuam a funcionar plenamente (é muito difícil derrubar um sistema de mais de três mil anos). No entanto a «sati», agás possivelmente em lugares muito remotos da Índia, e de forma secreta, já não existe. Ainda que as viúvas, que agora não se queimam vivas com o esposo morto, se pertencem a grupos hinduístas ortodoxos, têm que vestir-se de branco, quase não podem relacionar-se com homens, não podem voltar a casar-se e não podem comer nem carne, nem peixe, nem ovos, nem cebolas, nem alhos.

Ray nasceu na localidade bengali de Radhanogor, do distrito de Hugli, em 1772, dentro de uma família de casta bramânica, que é a primeira das castas, a dos letrados. Era descendente de um reformador religioso bengali do século XVI chamado Narottama Thakur, nascido em 1466 (não se conhece o ano em que faleceu). Os seus pais decidiram dar-lhe uma educação que o preparara para a administração pública, pelo que quando jovem aprendeu árabe e persa (que naquela altura era a língua oficial nos sultanatos muçulmanos da Índia). Ao aprender árabe pôde ler O Corão, com o qual pela primeira vez se familiarizou com o monoteísmo. Esta ia ser uma das mais profundas influências intelectuais ao longo da sua vida.

A sua família materna mandou-o a Benares, a cidade sagrada hinduísta mais importante, para que estudasse sânscrito, assim como o Vedanta sutra e os Uponishads. Ao voltar ao seu lar paterno, à idade de 16 anos, entrou em conflito com os seus pais por motivo de ter abandoado as antigas tradições religiosas da sua família. Mais tarde há de escrever que à idade de dezasseis anos tinha escrito um manuscrito em que havia questionado a validez da idolatria dos hindus, pelo que as relações com a sua família deterioraram-se, o qual o determinou a viajar por conta própria e a afastar-se da sua família uns anos. Parece que nas suas viagens chegou a conhecer o Tibete. Regressou ao seu lar aos dezanove anos de idade, em 1791, depois do qual se dedicou a administrar as propriedades de seu pai, que era um «zamindar» (latifundiário).

Aos 24 anos, em 1796, aprendeu a falar em inglês e em 1797 mudou-se para a cidade de Calcutá (hoje de nome oficial Kolkata), que era naquela altura o centro do poder da Companhia Britânica das Índias Orientais na Índia. Ali converteu-se em prestamista primeiro e depois passou a ser funcionário da companhia, trabalhando como tradutor.

Em 1804 publicou o seu livro Presente para os monoteístas («Tuhfat ul Muhwahhidin»), um tratado em persa em que criticava a irracionalidade das religiões existentes por estarem baseadas no engano, a intolerância e outros meios de opressão social. Porém, advogava pela crença numa divindade e pela moralidade universal de não fazer dano ao próximo. Em 1805 passou ao serviço dum oficial da Companhia Britânica citada antes chamado John Digby, o qual o ajudou a aperfeiçoar o seu inglês e a melhorar os seus conhecimentos sobre a civilização ocidental. Trabalhou para Digby na cidade de Ragpur até 1815, ano em que regressou a Calcutá. Para então, os seus anos de serviço à Companhia e as suas atividades como prestamista o tinham convertido num homem bastante rico e com dinheiro.

Ao seu regresso a Calcutá formou a «Sociedade de Amigos» («Atmiya Sabha»), em que se discutia livremente sobre teologia e se sustentavam debates-papo sobre a abolição do sistema de castas, da «sati», a poligamia e as restrições dietéticas. Em 1819, debateu o culto dos ídolos hinduístas contra um brâmane de Madras (hoje de nove oficial Chennai), chamado Subramanya Shastri. O resultado do debate foi-lhe favorável, embora isto lhe ganhasse a hostilidade dos seus opositores, os quais o forçaram a disgregar a sua associação antes mencionada, dos amigos.

Por estes anos viu-se ademais envolvido em conflitos com o seu sobrinho Govinda Prosad Ray, que queria confiscar as propriedades de Ram Mohon Ray, alegando apostasia. Comentava-se que detrás destes reclamos estava a própria mãe de Ray.

A sua forte oposição à prática da «sati» remonta-se à morte do seu irmão maior Jogomohon em 1812, depois do qual a sua viúva foi obrigada a queimar-se viva na pira funerária, com o seu esposo. Este facto comoveu Ray, pelo que em 1818 escreveu um tratado em Bangla e inglês opondo-se a esta prática bárbara e tratou de forçar os britânicos a que a ilegalizassem. Escreveu um segundo tratado sobre a matéria em 1820 no qual advogava pelos direitos das mulheres à educação. Em 1815 publicou o seu livro A essência da doutrina vedanta («Vedanta sara»), um ensaio em Bangla que no seguinte ano traduziu para o inglês. Entre 1816 e 1819 escreveu tratados em Bangla sobre os Uponishads e também fez traduções para o inglês. Os seus adversários hindus o acusavam de ser um ateu e um destrutor da religião. Viu-se obrigado a contratar guarda-costas, pois os seus inimigos hinduístas tentaram assassiná-lo no seu momento.

Escreveu ademais tratados em que defendia uma visão racional do Cristianismo. Afirmava que as ensinanças de Jesus lhe pareciam as mais adequadas para conseguir a harmonia entre os seres humanos. Nas suas obras sobre o Cristianismo, porém, ignorava os milagres que se atribuíam a Jesus no Novo Testamento, para não fazê-lo parecer como um «avatar» aos olhos dos hinduístas.

Em 1822 estabeleceu uma escola Anglo-Índia em língua inglesa com um currículo de estilo ocidental em que se incluíam as ciências. Em 1828 criou, como já se comentou antes, o grupo «Brahmo-Somalh», que foi uma organização sociorreligiosa dentro da qual os hindus de casta alta podiam praticar o monoteísmo e o universalismo dentro da sua própria cultura, pois o movimento baseava-se no estudo dos textos hinduístas como os Uponishads.

Em 1829 conseguiu influenciar o lord William Bentrinck, governador-geral da Índia, para que eliminasse a prática da «sati». No entanto, deve assinalar-se que esta medida levantou uma grande oposição entre os setores mais conservadores, ortodoxos e fundamentalistas da sociedade indiana, que enviaram uma representação ao Parlamento britânico para protestar por esta medida. Em resposta a esta representação Ram Mohon Ray viajou ao Reino Unido em 1830 para defender a medida do governador-geral. Estando na Inglaterra foi visitado por vultos tão importantes da vida daquele país como Robert Owen (fundador do socialismo inglês) e Jeremy Bentham.

Nas suas gestões na longínqua metrópole britânica, Ray contraiu meningite, falecendo na cidade de Bristol em 1833, aos 61 anos de idade.

TAGORE ADMIRAVA A RAM MOHON RAY:

Num depoimento escrito por Robindronath Tagore em 1908, sob o título de «Oriente e Ocidente», amostra a admiração que sente, entre outros, por Ram Mohon Ray, ao dizer-nos: «Assim é como alguns dos homens mais nobres da Índia assumiram a tarefa de aproximar Oriente e Ocidente. Eis o exemplo de Ram Mohon Ray. No seu tempo foi o único que levantou a voz em favor da incorporação da Índia ao mundo, sob a singela base da humanidade. Nenhuma cega crença, nenhum hábito ancestral obscureceram a sua visão. Com grande generosidade de coração e desperta inteligência aceitava o Ocidente sem renunciar ao Oriente, e fez surgir a nova Bengala sem mais ajuda. Sem desfalecer fez frente à persecução que padeceu na procura da Verdade a fim de conseguir que nos fossem reconhecidos os direitos inalienáveis do homem e de fazer-nos compreender que também nós fazemos parte dos herdeiros do mundo. Foi o primeiro em sentir e proclamar que Buda, Cristo e Maomé viveram para todos os homens e que cada um tem parte na disciplina dos nossos antigos sábios; que quem queira que tenha apartado obstáculos na senda da sabedoria ou arrancado a energia humana do estancamento nos pertence, e por este vínculo único alcança a todos a mesma glória.

Ram Mohon Ray tendeu uma ponte entre a Índia e a Europa, por onde passam hoje todas as nossas atividades criadoras. Nem os preconceitos nem o orgulho podiam fazer-lhe desconhecer a meta da evolução que, se não alcançada no passado, vê progredir o avanço para a sua realização no futuro».

O «BRAHMO-SOMALH» COMO SÍNTESE DOS ASPETOS POSITIVOS DAS DIFERENTES RELIGIÕES:

O «Brahmo-Somalh» é um movimento social e religioso fundado por Ram Mohon Ray e seus amigos e seguidores no século XIX, durante a chamada renascença de Bengala, e, em concreto, iniciou-se com data de 20 de agosto de 1828 num local de Calcutá no caminho de Chitpore, hoje rua de Robindro Sarani, muito perto da universidade principal da cidade, onde ainda está um lindo prédio que acolhe o templo de culto dos chamados «brahmos», com bibliotecas, imprensa e escolas para meninas, mulheres solteiras e mulheres viúvas, com o fim de que aprendam algum ofício para poder viver autonomamente. No mesmo local organizam-se periodicamente as duas festividades anuais da sociedade, «Bhadrotsab» e «Maghotsab», e diversos seminários e palestras relacionados sempre com a sociedade, os seus membros, a sua filosofia e os antigos e importantes membros da mesma. Este templo foi inaugurado oficialmente, depois de ter culminado a sua construção, em 23 de janeiro de 1830. Já comentámos ao início do depoimento que ademais de ter Ray como colaborador principal ao avô de Robindronath, Dworkonath, depois do seu falecimento em 1833, mantiveram a sua organização com vida, entre outros, o pai de Robindronath Devendronath (como presidente) e o próprio Tagore como secretário. A sociedade funcionou especialmente em Calcutá (Kolkata) e também em Daca, capital do Bangladesh, onde ainda se mantém um pequeno local brahmo. A esta sociedade pertenceram as personalidades mais importantes e de maior categoria de Bengala (ocidental e oriental): escritores, advogados, notários, médicos, juízes, cientistas, professores, cineastas, etc. Em concreto devemos citar a toda a família de Tagore, que era muito ampla e de grandes intelectuais, ao escritor Sukumar Ray e o seu filho, grande cineasta, Sotiolhit Ray e toda a sua família, ao também excelente escritor Bonkim Chondro Chottopadhyay, ao nosso amigo Sinarayan Ray, falecido em 2008 em Santiniketon, que chegou a ser durante um tempo diretor da Biblioteca-Museu de Tagore desta localidade e, ademais, Protap Chunder Molhumdar, Giris Chondro e Aghore Nath Gupto, que dentro da sociedade brahmo se tinham encarregado respetivamente de estudar e integrar as religiões cristã, islâmica e budista.

O prestigioso físico Joyant Narlikar escreveu o seguinte sobre o movimento sociorreligioso de Ray: «Ray entendia que o conhecimento de Ocidente não podia ser ignorado. Ele admirava as tradições filosóficas liberais da Índia e fundou o «Brahmo-Somalh» para popularizar essas ideias. Dado que a religião desempenhava um papel fundamental na sua época, tentou uma reforma da religião do seu tempo. A sua crítica sobre a religião existente, as suas práticas e o rígido sistema de castas inspirou-lhe o desejo de fazer uma religião consistente mudando o mundo da sua época».

O certo é que, como dominava tantos idiomas, depois de ter lido os livros sagrados das mais importantes religiões, teve a feliz ideia de criar ele uma sociorreligião (para a Índia daquela altura realmente revolucionária) integrando nela de forma sintética os princípios fundamentais e mais valiosos e positivos – por ele considerados – das diferentes religiões: hinduísmo, budismo, cristianismo, islamismo, jainismo, etc.. Considerou que a esta síntese devia agregar-se-lhe também os princípios da revolução francesa tão dignos como eram a «igualdade, liberdade e fraternidade». Eis o resultado: uma sociorreligião denominada «Brahmo-Somalh», que no seu desenvolvimento e vida teve algumas vicissitudes, por outro lado lógicas, e algumas divisões entre os seus membros. Mais ou menos, a denominação da sociedade significa literalmente «sociedade dos devotos do Deus verdadeiro». De alguma forma «Brahmo» significa quem adora o espírito supremo do Universo, e «Somalh» significa «comunidade da gente unida».

A influência desta sociorreligião em Robindronath Tagore foi enorme (também muitos princípios do budismo e do cristianismo), que não se pode compreender bem e a fundo toda a obra tagoreana, se não se conhecem os princípios do «Brahmo-Somalh» que estão detrás da maioria dos seus escritos, especialmente contos e romances, em que as mulheres são as mais importantes protagonistas, a defesa da paz e da igualdade, da fraternidade entre todos, da irmanação entre todos os seres do mundo, do amor pela natureza e as crianças, e tudo o que isto encerra, do amor pela alegria e por tudo o que tem vida. Influência que se deixou sentir também nas suas criações, especialmente educativas, como a sua escola nova de Santiniketon («Morada da Paz»), onde desde o primeiro momento se praticou a coeducação, ensinando por igual rapazes e meninas, a quinta pedagógica de «Sriniketon» («Morada da abundância») promovendo o avanço social das classes mais marginalizadas, e a sua Universidade Internacional de Visva-Bharoti («Sabedoria Universal»), para desenvolver o entendimento entre todos os cidadãos do mundo, do Oriente e do Ocidente, praticando o respeito por todas as culturas, todas as etnias, todas as línguas, todas as religiões…, organizando ao longo do ano as festas religiosas – e outras – mais importantes dos diferentes credos, para conseguir nos estudantes o apreço e respeito por todos, a paz e a não violência. De todas as maneiras convém esclarecer que ainda hoje no amplo campus da escola-universidade de Tagore não se podem celebrar as festividades dos deuses e deusas hindus, que decorrem com grande idolatria, tema que os brahmos nunca aceitaram, embora a respeitassem em outros lugares, mas não nos seus espaços próprios. Este é um exemplo claro da influência que esta sociorreligião, a que ele mesmo pertencia, teve em toda a obra e vida de Tagore. E há que acrescentar que Tagore, como grande pacifista que era, foi o presidente dos comités a favor da paz que tinham as suas sedes em Genebra, na Suíça.

Resenho a seguir – não de forma exaustiva – os princípios básicos do «Brahmo-Somalh»:

– Importância básica da mulher na vida, e da sua educação.

– Igualdade total entre o homem e a mulher, eliminando a sua marginalização social.

– Igualdade social entre todos os cidadãos, eliminando o sistema hinduísta das castas.

– A favor da paz e da harmonia positiva entre todos os cidadãos do mundo.

– Respeito total por todas as culturas, todas as etnias, todas línguas e todas as religiões.

– A favor da educação pública sustentada pelo Estado, em que se pratique a coeducação, e em que se contemple um currículo integral e harmónico em que tenham cabida as ciências, as artes e as letras.

– A favor da liberdade de imprensa.

– Contra todo o tipo de superstições e especialmente contra a prática da idolatria.

– Respeito total pelas pessoas que praticam outro credo, se realmente cumprem o que dizem seus livros sagrados, sem manipulações. Aplicando o facto de que «para ser respeitado há que respeitar».

– Por uma religião universal que contemple o monoteísmo.

– A favor da vida, da natureza e do amor e bom entendimento entre todos os seres humanos.

– Em contra das guerras, da violência e, hoje diríamos, do terrorismo.

– Por um entendimento positivo entre todas as nações do mundo (uma espécie de Liga das Nações).

– A favor de uma democracia autêntica.

TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR:

tagore-capa-livro-inquietacao-de-rtServindo-se da técnica do Cinema-fórum, analisar e debater sobre a forma e o fundo do filme e o documentário resenhados antes.

Organizamos nos nossos estabelecimentos de ensino uma amostra-exposição monográfica dedicada a Ram Mohon Ray, o seu pensamento, a sua vida e a sua obra. Na mesma, ademais de trabalhos variados dos escolares, incluiremos desenhos, fotos, murais, frases, textos, lendas, livros e monografias. A amostra deve contemplar também um espaço dedicado à sociorreligião do «Brahmo-Somalh» criada por Ray e seus seguidores e amigos.

Depois de ler todos, estudantes e docentes, o famoso romance escrito por Tagore, sob o título de Gora, no qual aparecem ao longo do livro as relações que se estabelecem entre os seus protagonistas, uns hindus e outros brahmos. A obra foi escrita em 1910 e existe edição na nossa língua com o título de Inquietação, publicada pela Minerva de Lisboa, no ano 1947, em tradução de Alexandre Fonseca. Depois de ler todos a obra, desenvolvemos um Livro-fórum sobre a mesma. Paralelamente podemos organizar no nosso estabelecimento de ensino um debate-papo ou tertúlia, em que participem os alunos e os docentes, sobre a importância de Ram Mohon Ray e a sociorreligião por ele criada, tirando as correspondentes conclusões.

 

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