DA IDENTIDADE À NORMA :
Língua, singularidade, consenso, antilusismo, reintegracionismo, jornalismo: de Galicia Confidencial a Sermos Galiza, Santiago de Compostela, Laiovento, 2007
Os autores:
Nicolás Xamardo, galego que desde há muitos anos desenvolve sua vida privada e profissional em Euskadi. Licenciado em Filologia Románica pola Universidade de Compostela, em Linguística Geral pola de París VIII, e doutor em Filologia pola de Valhadolid. Professor titular do departamento de jornalismo da Faculdade de C.S. e Comunicação do País Basco. Discípulo de Lacan, Altthusser, Badiou e Derrida na Escola Normal Superior de París.
Vítor Vaqueiro, licenciado em Ciências Químicas pola Universidade de Compostela: após uns anos de exercício da docência no ensino médio decide dedicar-se à fotografía arredor de que desenvolveu e impulsionou numerosas atividades. Em 2003 obteve prémio extraordinário de doutoramento na Faculdade de Ciências da Comunicação da Universidade de Compostela, pola tese “A obra fotográfica dos Pacheco”
Para os autores a existência de duas representações gráficas das falas galegas, que se apresentam como normativas em confronto sobre a nosa lingua, uma “oficial, quer dizer, com o apoio dos aparatos do estado espanhol” representada polo ILG e a RAG e outra reintegracionista (exprimida na norma Agal ou na integração galega no Acordo Ortográfico). Isso levanta, nos autores, a necessidade de oferecer-nos as razões do seu compromisso com esta segunda opção.
Cumpre salientar que não nos confrontamos com um ensaio de corte filológico; arrisco a dizer que o foco é sociolingüístico e/ou político-lingüístico. A exposição é maciça, rigorosa e muito didática. A racionalidade do discurso e o seu fio condutor lógico, combinam com uma leitura muito cómoda e amena do texto.
O magistério e a originalidade da obra consiste, precisamente, em conciliar os dous focos, o sociolinguístico e o político, através da noção de identidade, conceito duma enorme complexidade de que os autores têm consciência.
Passamos, logo, a percorrer brevemente a trilha por onde estes nos conduzem.
Logo desde o começo vão mostrando, explícita ou implicitamente, uma série de categorias, conceptualizações, situações e mesmo dilemas que se inter-relacionam para construírem e desenvolver uma lógica argumentativa que nos vai acompanhar durante toda a leitura.
Deste jeito abrolham, de início, conceitos relevantes no dispositivo identitário como os de invariança ou os de assimilação. Dão-se referências ao nacionalismo banal assim como à capacidade adaptativa das diferenças. Referem-se também ao potencial emancipatório do nacionalismo cívico ou político. Aparece, pela mão de Badiou, o acontecimento coma mecanismo corrector dos componentes conservadores da identidade. Mostra-se também como a identidade é muito singular, e como isso está ligado à decisão e à invenção.
À medida que avançamos na leitura constata-se a questão da lingua galega coma um dos fatores fulcrais da nossa identidade, e a não neutralidade e sim planificação num modelo que estataliza e submete as falas galegas à dependência da língua que nos é imposta, o castelhano. Reflete-se, a seguir, sobre a intencionalidade política subjacente no fato de a língua ser adjetivada como “minoritária ”, tanto no âmbito interior como na posição e projeção externa, para concluirem na vinculação que há, entre a opção normativa e a identidade.
É muito interesante, de uma perspetiva histórica, a secção: “A quebra do consenso e a formulação explícita do antilusismo” que para os autores abrange desde a fundação da Editorial Galaxia até a publicação das “Normas ortográficas do idioma galego”, contrastivo com os caminhos que estavam a pegar as falas galegas justo antes da sanguinária guerra terrorista impulsionada polos nacionalistas “castelhanos”, e o seu triunfo.
O antilusismo, é a subordinação a um padrão ortográfico castelhano (espanholizante).
Continuam analisando a criação do ILG, no mesmo ano que Ricardo Carvalho Calero é nomeado catedrático, e a decisão ideológica-política do nomeamento do seu primeiro diretor, o professor Costantino González García, pessoa alheia ao país e absoluto desconhcedor do galego e suas falas, e o ostracismo a que foi submetido o professor Carvalho Calero primeiro catedrático de galego-português (esse era o nome da língua seguindo a tradição galeguista, que ele reclamou na criação da cátedra). Faz-se abordagem, também, do trânsito de diversos intelectuais para as posturas isolacionistas até chegarem às perspectivas contemporâneas discrepantes.
Achamos, também, uma contestação do relato que sustenta a noção de “normativa oficial ou galego normativo”, como monopólio normativo, e que já fora invalidado como discriminatório por sentença do TSJG em cujo Acórdão estabeleceu que a normatividade só pode ter efeitos dentro da Administração. Resulta também rechamante, e objeto de reflexão, o superior peso de que desfruta o português na Estremadura do que na Galiza.
Cumpre salientar, ao mesmo tempo, o ilustrativo da análise que realizam os autores do confronto entre as opções Galicia vs Galiza como nome do país, e tudo o que isso envolve.
A última parte da obra, inclui um trabalho de pesquisa sobre a realidade, quer dizer, um caso prático em que analisam quatro jornais on line: Galicia Confidencial, Galicia Hoxe, Praza Pública e Sermos Galiza. Nele examinam e correlacionam quantitativamente a qualidade do idioma usado nesses meios a fim de poderem estabelecer alguma possível correlação entre a dita qualidade e a posição sobre o padrão lingüístico empregue, constatando uma significativa diferença de grau entre as publicações.
Finalizam questionando a fórmula de primeiro normalizar para depois aperfeiçoar, concluindo com um final, quando menos, preocupante.
É um livro que, com certeza, não vai deixar indiferente nenhum leitor.
Leia.