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Uso didático dos jornais na escola, no Dia Mundial da Liberdade de Imprensa (Filmes: ‘Cidadão Kane’ e ‘A primeira página’)

No seu dia, acertadamente, aquele governo galego tripartido, que infelizmente só durou dous anos, publicou uma ordem animando os docentes para realizar nos estabelecimentos educativos atividades ao redor das datas mais assinaladas e do ciclo anual das nossas festas populares. Também para dedicar uma semana completa à utilização dos jornais nas aulas. E eu, para celebrar a data do Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, quero aproveitar para animar os docentes de todos os níveis do ensino para que organizem atividades didáticas, tomando como principal recurso os jornais, revistas e diários. Sem perder a perspetiva de que a melhor atividade é ter nas aulas e nas escolas jornais escolares elaborados pelos próprios estudantes. Como muito bem faziam nas suas escolas os grandes pedagogos Decroly, Freinet, Tagore, Lodi, Korczak e Milani. Ou como a princípios do século vinte aqueles três professores da comarca de Ortigueira, graças aos quais ainda hoje se publica naquela formosa comarca La Voz de Ortigueira. E na atualidade, desde há muitos anos, no nosso vizinho Portugal. Onde os futuros docentes aprendem, na Escola Normal e nas Faculdades de Educação, a fazer o jornal, com professores especialistas em jornalismo. Para depois editar em todas as escolas primárias e secundárias do país jornais escolares redigidos pelos alunos. O caso de Portugal é paradigmático e um modelo que devíamos imitar. Porque é um dos países europeus em que mais jornais comarcais e regionais se publicam, ademais dos de âmbito estatal. A razão está em que os escolares todos participam na elaboração de jornais. Recurso magnífico para adquirir muitas e variadas aprendizagens, todas positivas. Fica logo claro que o diário feito na aula e na escola é a alternativa didática mais valiosa para formar a crianças e jovens. Diário que pode ser publicado, utilizando as técnicas mais modernas e atuais, mas que também pode ser falado ou revista oral, pode ser um diário de parede e mesmo podem os escolares escrever pequenos artigos e depoimentos para os jornais da sua cidade ou vila.

Os jornais, bem utilizados, são um estupendo recurso didático nas aulas. Pode utilizar-se o papel dos mesmos para trabalhos manuais e atividades artísticas. Pode elaborar-se pelos escolares um ficheiro de notícias. Pode desenhar-se o mapa da notícia e estudar geografia. O jornal traz temáticas variadas para poder trabalhar as diferentes áreas do ensino. As básicas, como língua e literatura, conhecimento do meio, matemática, ciências, artes e mesmo línguas estrangeiras. As transversais, como educar para a paz, a ecologia, a saúde, a democracia, os direitos humanos, a educação vial, a não sexista, a tolerância e educação para a cidadania. O jornal pode servir também para ser objeto de estudo. Pode ler-se o jornal com os alunos, como muito bem fazia Lorenzo Milani na sua escola de Barbiana. Podem identificar-se géneros jornalísticos. Podem desfazer-se e refazer-se notícias. Pode elaborar-se a primeira página dum jornal. Podem comparar-se as primeiras páginas de vários jornais publicados numa mesma data. Podem analisar-se as fotografias publicadas nos mesmos. Pode analisar-se a ficha técnica dum jornal e visitar uma empresa jornalística.

Deixamos para o final outra atividade importante, que todos os estabelecimentos de ensino deveriam fazer. É esta a visita aos locais do jornal da localidade. Que deve ser antes convenientemente preparada e desenhada. Assinalando por quê e para quê é que se visita, descobrindo antes o diário e o lugar onde se edita. Vendo depois como funciona, falando com os jornalistas, recolhendo dados nos cadernos, fazendo fotos e entrevistas, etc. Após a visita é conveniente levar a cabo atividades didáticas e escolares sobre a mesma. Fazendo debates, montando exposições das fotos tiradas e dos materiais recolhidos, e também das redações criadas pelos alunos. Ademais de publicar no jornal escolar as experiências da visita. Como já fazem alguns dos nossos estabelecimentos de ensino, quando efetuam visitas aos locais onde todos os dias se edita algum jornal da nossa Comunidade Galega. Escolas que aproveitamos para as felicitar por levar a cabo uma atividade tão didática e educativa.

DIA MUNDIAL DA LIBERDADE DE IMPRENSA Cartaz00O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa é comemorado no dia 3 de maio. A data celebra o direito de todos os profissionais da mídia de investigar e publicar informações de forma livre. Informação é poder, e por isso a tentativa de controlar os meios de comunicação sempre existiu e se chama censura. A Censura é o contrário da Liberdade de Imprensa, e é comum nos regimes ditatoriais não democráticos. Mas a luita pela liberdade de imprensa é constante, porque mesmo nos regimes democráticos a censura pode aparecer, de variadas maneiras. Historicamente foram cometidos muitos crimes contra a liberdade de imprensa, principalmente durante a Ditadura Militar no Brasil e na ditadura franquista ou na de Salazar em Portugal. O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa foi criado pela UNESCO (Organização das Nações Unidas para a Educação, Ciência e Cultura) no ano de 1993. A data foi criada para alertar sobre as impunidades cometidas contra centenas de jornalistas que são torturados ou assassinados como consequência de perseguições por informações apuradas e publicadas por estes profissionais.

Para apoiar os comentários deste depoimento, escolhi dous interessantes filmes, relacionados com o mundo do jornalismo, por considerá-los paradigmáticos neste tema: Cidadão Kane, realizado por Orson Welles em 1941, e considerado como uma das maiores obras-mestras da sétima arte, e A primeira página, da autoria de Billy Wilder, rodado em 1974.

FICHAS TÉCNICAS DOS DOUS FILMES:

  1. Título original: Citizen Kane (Cidadão Kane).
  • CIDADÃO KANE Capa DVDDiretor: Orson Welles (EUA, 1941, 119 min., preto e branco).
  • Roteiro: Orson welles e Herman J. Mankiewicz. Produtoras: RKO e Mercury Theatre Productions.
  • Música: Bernard Herrmann. Fotografia: Gregg Toland.
  • Atores: Orson Welles, Joseph Cotten, Everett Sloane, George Coulouris, Dorothy Comingore, Ray Collins, Paul Stewart, Agnes Moorehead, Ruth Warrick, Erskine Sanford, Alan Ladd e Willian Alland.
  • Argumento: Baseado na vida do magnate das comunicações William Randolph Hearst, conhecemos a história de Charles Foster Kane, o homem que construiu um império a partir do nada, mas que vivia uma vida pessoal extremamente ruim. Dirigido por Orson Welles, o longa conta a ascensão de um mito da imprensa americana. De garoto pobre no interior a magnate de um império do jornalismo e da publicidade mundial. Inspirado na vida do milionário W. R. Hearst. Vencedor do Óscar de Melhor Roteiro, é considerado um dos filmes mais importantes da história.
  1. Título original: The Front Page (A primeira página).
  • A PRIMEIRA PAGINA Capa DVDDiretor: Billy Wilder (EUA, 1974, 105 min., cor).
  • Roteiro: Billy Wilder e I.A.L. Diamond, segundo a obra homónima de Ben Hecht e Charles MacArthur.
  • Música: Billy May. Fotografia: Jordan Cronenweth. Produtora: Universal Pictures.
  • Atores: Jack Lemmon, Walter Matthau, Susan Sarandon, Vincent Gardenia, David Wayne, Allen Garfield, Austin Pendleton, Charles Durning, Herb Edelman, Martin Gabel, Harold Gould, Cliff Osmond, Dick O’Neill, Jon Korkes, Lou Frizzell, Paul Benedict, Doro Merande, Noam Pitlik, Joshua Shelley, Allen Jenkins, John Furlong, Biff Elliot, Barbara Davis, Carol Burnett e Leonard Bremen.
  • Argumento: Wilder situa este filme no Chicago dos anos 20, aí pelo 6 de julho de 1929. É um filme de jornalistas, mundo que Wilder conhecia bem, pois tinha estado trabalhando num jornal durante um tempo. Mostra-nos estes profissionais da informação como seres sem escrúpulos e leoninos. O filme também fala da pena de morte e da corrução do poder. Embora se trate de uma comédia, A primeira página, é bem mais dilacerante e crítica, mostrando-nos em tom de comédia um retrato do poder mediático e da corrução no mundo da política. Estamos perante um relato sobre o mundo jornalístico e sobre a obsessão pela busca da notícia por parte do diretor dum jornal que é capaz inclusive de sabotar até à extenuação o casamento de seu melhor repórter para impedir que deixe o seu posto e a notícia. Esta magnífica comédia é hilariante desde o começo, onde o jornalista comunica ao seu chefe, que deixa o jornal porque se vai casar, e ele sabe por experiência, que o casamento e o seu trabalho não são compatíveis, porque está divorciado. Um divertidíssimo e reflexivo filme que descreve o mundo do jornalismo como nenhuma outra e que vista hoje o seu tema é do mais atual.

Nota: Ambos os filmes podem ser visto no Youtube.

PEQUENOS COMENTÁRIOS DOS FILMES:

CIDADÃO KANE Foto1Lançado em 1941, Cidadão Kane alia drama e suspense para narrar a trajetória de Charles Foster Kane, um garoto que atravessa uma infância miserável, mas depois se converte num dos empresários mais afortunados do Planeta. A história é contada retrospetivamente, depois da morte de Kane, quando um repórter fica intrigado com o termo Rosebud, pronunciado por ele momentos antes do seu falecimento. Com a sua curiosidade despertada, o jornalista Thompson segue as trilhas percorridas por Kane, entrevista as figuras que o acompanharam ao longo do tempo, e depara-se com um ser mergulhado na solidão, sempre compelido a cumprir os desígnios de outrem. Aparentemente nenhuma pessoa está realmente preocupada em descobrir e realizar os seus desejos. Diante deste contexto, o empresário procura compulsivamente resgatar uma infância não vivida através da conquista dos outros e de bens materiais. A biografia do poderoso Kane vai sendo tecida por diversos pontos de vista, pois cada entrevistado tem uma visão distinta desta figura enigmática; o filme atua como um misterioso quebra-cabeça que vai gradualmente revelando o seu conteúdo. A trajetória ascendente do empresário tem início quando ele recebe uma vultosa soma de dinheiro e vai ser educado por um banqueiro, Walter Parks Thatcher.

CIDADÃO KANE Foto0Ao escolher a empresa que irá gerir, inexplicavelmente ele opta pela menos promissora, um jornal padronizado e sem nenhuma influência, como um desafio a ser vencido. Desprezando as regras do mercado, ele oferece salários atraentes e descobre o caminho do sensacionalismo lucrativo, criando também uma imagem populista diante da massa de oprimidos. Apesar de tudo, ele termina os seus dias completamente sozinho, em meio ao luxo e ao poder que construiu.

Cidadão Kane tornou-se uma obra marcante especialmente por conta de seus renovados métodos narrativos, pelo subversivo enquadramento da câmara e pela cenografia inovadora, que revela originalmente o teto dos ambientes reconstituídos para o filme. Os críticos especializados a consideram, até hoje, a maior obra-prima da história do cinema, com os seus recorrentes flashbacks, o seu uso correto das nuances sombrias, as suas alongadas cenas desprovidas de cortes, as suas distorções imagéticas, a intensa dramaticidade gerada por estas técnicas e as luzes nada usuais, sem esquecer das falas justapostas e dos closes contidos. Este filme foi amplamente premiado, conquistando o Óscar de Melhor Roteiro e o prémio de Melhor Filme da Associação de Críticos de Nova York. Welles jamais conseguiu obter o mesmo sucesso com outras produções, nem mesmo contratos com estúdios consagrados de Hollywood.

A PRIMEIRA PAGINA Foto6A primeira página é um filme que nos faz ver que a imprensa não sempre é veraz e objetiva. Não procura a verdade, mas a maior exclusiva, o que mais agrade ao público e a venda de jornais à base de mentiras, falsas notícias e novidades conseguidas de maneira ilegal. No filme os jornalistas passam a tarde jogando às cartas e bebendo álcool, enquanto só um ou dous procuram e pesquisam. Quando um dos jornalistas que sim trabalha chega à redação do seu jornal para informar do que tem visto, os demais que o escutam se aproveitam dele e chamam aos seus respetivos jornais dando uma versão distorcida do que tem dito o primeiro jornalista. É um exagero da realidade, mas não tão exagerado como se pensa. Parece, segundo este filme, que a imprensa está feita à base de mentiras e falcatruadas.

No filme aparece a história de que Earn Williams é acusado de assassinar um polícia, pelo que é condenado à morte e aguarda no cárcere até que chegue o seu último dia. Paralelamente a esta história, Hildy Johnson, jornalista do Chicago Examiner vai contrair casamento com a jovem pianista Peggy Grant. O casal planeia mudar-se para a Filadélfia, contrariamente ao que quer o diretor do Examiner, Walter Burns, que fará tudo o possível para separar Hildy e Peggy. Burns quer que Hildy faça uma reportagem sobre o enforcamento de William, mas este nega-se. Earn consegue escapar do cárcere durante o seu exame médico e encontra-se casualmente com Hildy na sala de redação. Hildy está disposto a ajudar Eram em troca de uma entrevista exclusiva. Finalmente Earn é indultado e declarado inocente, Hildy converte-se no diretor do Examiner e Walter Burns aposenta-se. É um filme digno de ser visto e um clássico da comédia.

IDEIAS PARA FAZER UM JORNAL ESCOLAR:

Produzir um jornal escolar, mural ou impresso, é mais do que transmitir informações. É, na verdade, uma excelente atividade em grupo, que pede poder de síntese, liderança, conhecimento prévio da realidade, isto é, a verificação dos problemas, dos acontecimentos, da cultura, das preferências e das necessidades da escola. Para o educador é uma das maneiras de trabalhar produção textual e leitura. Para o aluno, eis um exercício diferente e atrativo de cidadania. O Diário na Escola elaborou algumas dicas para você professor elaborar o seu jornal escolar:   – É preciso definir um local para expor o jornal, se ele for mural. Se optar pelo impresso verifique como será a impressão. Em ambos os casos é preciso definir, logo no início, o tamanho e as seções (editorias). -Escolher assuntos (pautas) e a periodicidade do veículo, lembrando-se que é preciso tempo hábil para elaborar um jornal de qualidade.   -Distribuir as tarefas, ficando o professor responsável por coordenar o trabalho.   – É necessário produzir textos e ilustrações como desenhos e fotografias.   – É importante fazer a correção ortográfica e, também, que os alunos assinem textos e ilustrações.   – O interesse sobre o jornal só acontece se os fatos tiverem uma relação direta com a vida da comunidade escolar.

Seguem algumas sugestões de pautas:

  • Dicas de programas de TV, música, cinema e livros.
  • Relato de experiências sobre alguma aula.
  • Crónicas, charges e artigos de opinião sobre temas polémicos.
  • Entrevistas com alunos, diretor, coordenador ou pais.
  • Últimos acontecimentos como olimpíadas escolares, festas do bairro ou na escola.

TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR:

Servindo-se da técnica do Cinema-fórum, analisar e debater sobre a forma (linguagem cinematográfica: planos, contraplanos, panorâmicas, movimentos de câmara, jogo com o tempo e o espaço, truques cinematográficos, etc.) e o fundo dos dous filmes anteriormente citados, e, especialmente, Cidadão Kane.

Professores e alunos juntamo-nos para conceber e publicar o Jornal Escolar do nosso estabelecimento educativo, decidindo entre todos a denominação do mesmo. Para elaborá-lo podemos olhar outros modelos de jornais escolares de outras escolas e estabelecimentos, galegos e de países da lusofonia. Entre todos acordamos as seções que vai ter e escolhemos os/as responsáveis das mesmas.

Organizamos um Livro-fórum sobre o livro de Freinet O Jornal Escolar, do que existe edição na nossa língua, comprometendo-nos a lê-lo e depois de lido organizamos o oportuno debate-papo. Do mesmo podemos tirar muitas ideias para poder elaborar o jornal escolar da nossa escola, ou mesmo da nossa aula.

 

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