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JOHN BREMER E A SUA ESCOLA SEM MUROS

Na segunda semana de setembro iniciaram-se as aulas nos estabelecimentos de ensino infantil e primário, e na seguinte as de secundário e ensino universitário. Estamos pois em épocas em que o tema educativo se encontra de atualidade. É este um momento ideal para refletir sobre a urgente necessidade de mudar os modelos educativos, de pensar noutra forma de levar a educação, de estabelecer um pacto social e educativo, de dar prioridade à educação das nossas crianças e adolescentes, de dar lugar às inovações educativas. Porque levamos décadas cometendo muitos erros na forma de como desenvolvemos a educação no nosso país. Por isto, é importante agora mesmo dar a conhecer outras alternativas pedagógicas, em muitos casos modelares, e tratar de levá-las à prática no nosso ensino.

john-bremer-fotoPara melhorar a escola e fazer que seja muito mais atrativa e motivadora para alunos e alunas, de todos os níveis educativos. Para a minha série iniciada com Sócrates, dedicada a grandes personalidades do mundo que merecem ser estudadas pelos seus contributos em diferentes campos da cultura e da educação, e também para que as conheçam os escolares, acho que o educador e filósofo socrático John Bremer (1927-2015), merece nesta altura ser lembrado pelas suas iniciativas educativas enormemente inovadoras, e muito em especial o seu pedagógico “Programa Parkway” criado por ele em 1968 na cidade americana de Filadélfia, e iniciado em fevereiro de 1969. Uma escola aberta, sem muros ou paredes, em que o ensino se dá dentro da comunidade, aproveitando tudo o que oferece esta para desenvolver as diferentes aprendizagens entre os escolares. De forma que, com este inovador plano educativo, se prolonga a educação ao longo de toda a vida, sem limitá-la aos muros ou paredes de uma escola, e se faz uma formosa reestruturação global do ensino que se desenvolve. Em princípio, com este modelo tão atrativo, é fomentada nos indivíduos e escolares a faculdade de aprender em múltiplas circunstâncias e em condições diversas, a tempo parcial, a domicílio, por diversos meios, fora das estruturas existentes. No projeto de Bremer, e noutros que, tomando o seu modelo, se desenvolveram noutros lugares e países, se considera acertadamente que uma fábrica, uma garagem, um museu, uma igreja, um jardim, uma ponte, uma estação do comboio, uma padaria, um laboratório de produtos farmacêuticos, uma biblioteca, uma emissora de rádio, os escritórios de um jornal, um castelo, uma fábrica industrial, um porto de mar, uma lota de peixe, um parque, uma fraga, uma praia, a ribeira de um rio, uma montanha, uma quinta, um mosteiro e, em geral, qualquer lugar é bom para aprender. Tal projeto levou, como antes não acontecia, a que milhares de escolares e de jovens possam escolher com este plano educativo entre mais de um cento de disciplinas e de temas. E além disso, educadores do mundo inteiro vão a Filadélfia para se familiarizarem com este método educativo-didático, e poder pô-lo em prática nos seus lugares de origem. Com este depoimento dedicado a Bremer completo o nº 67 da série.

UMA PEQUENA BIOGRAFIA DE BREMER:

john-bremer-foto-de-jovem    John Bremer era de ascendência irlandesa e de nascimento inglês, sendo educado em Cambridge. Chegou pela primeira vez aos EUA em 1951, desfrutando de uma bolsa “Fulbright”, e viveu em Vermont desde 1996. Nasceu no Reino Unido a 14 de abril de 1927, vivendo em Londres durante o “The Blitz” e serviu na “Royal Air Force” durante a segunda guerra mundial, construindo aeródromos na Inglaterra. Faleceu a 30 de novembro de 2015, com 88 anos de idade. Licenciou-se no “Pembroke College” de Cambridge (Reino Unido) e estudou também na Universidade de Leicester e no “St. John´s College” dos EUA. Foi um educador muito conhecido internacionalmente e um filósofo socrático que se envolveu profissionalmente na educação e no ensino durante mais de meio século. Teve como uma dupla carreira, primeiro investigando e escrevendo sobre textos académicos, especialmente do filósofo grego Platão, e, segundo, aplicando o que aprendeu aos problemas da sociedade e dos cidadãos, através da educação. No primeiro aspeto, descobriu a estrutura aritmética e harmónica dos Diálogos de Platão (de 1960 a 1984) e, neste último, fundou o famoso “Programa educativo Parkway” em Filadélfia em 1968 e o “Cambridge College” em 1971.

john-bremer-folheto-do-parkway-programm-de-filadelfia    Em 2008 aposentou-se como professor superior do “Cambridge College” de Massachusetts, onde fora professor de Humanidades e diretor também do “Humanities and Freedom Institute College”. Como comentámos, Bremer fundou em 1971 o “Cambridge College”, quando era conhecido como “Instituto de Educação Aberta” no “Newton College” do Sagrado Coração. Na década de 1960 Bremer ganhou reconhecimento internacional pela criação do “Programa Parkway” em Filadélfia, a primeira Escola sem Muros ou Paredes, como se documenta num livro com este título. Esta escola apareceu resenhada na revista Time na sua edição de 23 de março de 1970. Foi investigador principal de Killan na Universidade de Dalhousie em Halifax e mais tarde comissionado de educação para a Columbia Britânica do Canadá em 1973. Em 1975, quando era professor de Educação na “Western Washington University”, fundou o Instituto de Estudos Socráticos, em que foi o seu diretor até que se mudou para a Austrália em 1980 para fundar ali um Suplemento educativo para um jornal australiano. Depois de reformar-se, viveu a tempo completo em Vermont, onde continuou as suas pesquisas e escrita.

FICHAS TÉCNICAS DOS DOCUMENTÁRIOS:

  1. A Escola sem muros: O Programa Parkway de Filadélfia.

     Duração: 52 minutos.

Ver em: https://studsterkel.wfmt.com/programs/john-bremer-discusses-educational-innovation-school-without-walls-philadelphias-parkway

  1. Filadélfia, turismo e história.

     Duração: 11 minutos.

  1. Filadélfia. Percurso histórico da cidade.

Duração: 4 minutos.

 

O “PROGRAMA PARKWAY”: UMA ESCOLA SEM MUROS:

  john-bremer-capa-livro-em-ingles-1  Criado por John Bremer em 1968, e posto a andar em 1969, o “Programa Parkway” de Filadélfia, é um projeto educativo inovador, em que se rompe com os muros ou paredes da escola. Pensado especialmente para o ensino secundário, pode também ser aplicado no primário e no profissional. Tal escola não tem uma sala de aulas que se possa chamar sua ou de seu. Porém, todas as semanas, entre 30 e 40 administradores escolares vêm a Filadélfia para examinar a escola secundária do programa “Parkway”. Este projeto iniciou-se como um esforço por parte do conselho de educação de Filadélfia para limitar no possível o problema da excessiva matrícula de escolares nos estabelecimentos de ensino secundário da cidade. Alguém sugeriu estabelecer uma escola especial que usaria instalações culturais tais como museus e bibliotecas para desenvolver neles aulas. E, dado que muitos destes estabelecimentos culturais se encontram no denominado “Benjamim Franklin Parkway”, sombreado de árvores, o projeto foi batizado de imediato como “Programa Parkway”. Para levá-lo para a frente, o conselho contratou John Bremer, um educador britânico de 42 anos naquela altura que tinha sido diretor de um distrito escolar controlado pela comunidade de Nova Iorque. Bremer, com grande acerto, decidiu alargar o programa muito para além do seu plano original. Estabeleceu uma aula de mecânica automotriz numa loja de reparação de carros, uma aula de marroquinaria numa loja de coiro, um curso de jornalismo nos escritórios do “Evening Bulletin” e dúzias de outras especialidades que são lecionadas nos bairros centrais da cidade.

Na maioria dos casos, os cursos especializados são ministrados pelos próprios profissionais. Um médico dá um curso de serviços de saúde. Uma impressora ensina as formas de imprimir, um desenhador de joias como se cortam as gemas, um historiador de arte, um curso da sua especialidade tendo em conta o contexto e o que a cidade oferece neste campo. E todos os profissionais oferecem de forma voluntária e com agrado os seus serviços. Como resultado, o catálogo da escola aumenta com mais de 250 ofertas de cursos muito variada. A área do centro de Filadélfia tornou-se em pouco tempo literalmente no “campus” da escola, com estudantes que se abrem caminho de uma aula para outra de autocarro, de metro ou a pé.

Com este formoso projeto o mais importante para Bremer foi reorganizar toda a administração de uma escola secundária pública. Dividiu a escola em três unidades autónomas e estabeleceu uma “reunião municipal” semanal para cada unidade entre estudantes e faculdades. Juntos, discutem o plano de estudos, os estudantes propõem aos professores o que querem saber e aprender, os professores explicam aos alunos o que necessitam adquirir para bem aprender e depois exercer. Amiúde as aulas acolhem mistura de idades dos estudantes, com estudantes do nono ano, por exemplo, sendo desafiados a misturar-se com alunos das últimas turmas do secundário. Não existem nem notas nem classificações. No entanto, os professores escrevem uma avaliação do trabalho de cada aluno. Na sua maior parte, a assistência não é obrigatória, enfatizando, isso sim, a informalidade e a responsabilidade. Os estudantes podem chamar os professores pelos seus nomes e falar com liberdade, embora com educação e respeito. Os professores entusiastas, escolhidos entre uma multidão de candidaturas, são na sua maioria menores de trinta anos, com frequência usam jeans e cabelos longos. O elenco experimental do programa pedagógico de Bremer também atraiu um bom número de estudantes estagiários de uma ampla variedade de universidades. Junto com o pessoal regular, os estagiários conseguiram que a proporção aluno-docente seja inferior a 8 a 1 e o tamanho médio de turma a 15. “A dignidade e a importância do aluno tornam-se primordiais”, chegou a dizer orgulhoso Bremer. E um estudante negro de 14 anos, chamado Robert Johnson, chegou a afirmar: “Na minha velha escola, amiúde tinha medo de fazer uma pergunta, porque pensava que a professora opinaria que era estúpida. Aqui nunca tenho medo de dizer o que penso”.

ABRIR A ESCOLA À COMUNIDADE:

    Tal como fez Bremer em Filadélfia, em finais dos sessenta, é necessário agora mais do que nunca, com a grave crise em que se encontra o ensino, abrir as portas das nossas escolas à comunidade, retirando ou reduzindo os seus muros e paredes, permitindo que o bairro em que a escola se encontre, a sua comunidade use as instalações e equipamentos e, em versões mais avançadas, adquira voz e participe em decisões e atividades da escola, incluindo nalguns casos as atividades de ensino. A escola amuralhada, com grades e cadeados reais e mentais face ao mundo exterior, deve ceder o lugar a uma escola mais próxima e amigável com o meio social e natural. “Abrir a escola à comunidade” tem de ser hoje a palavra de ordem em todo o mundo, não só no administrativo, no curricular e no pedagógico, como também no arquitetónico. A moderna arquitetura escolar deve procurar uma relação mais fluida, visual e física, entre o dentro e o fora da escola, e assumir o encontro escola-comunidade como um elemento central na conceção dos espaços. É muito importante que a escola saia à comunidade e aproveite o que esta oferece, que alargue o seu olhar e o seu território para construir comunidade de aprendizagem para além das aulas, aproveitando o contexto e o sustento comunitário à cultura e à prática escolares. Eliminando também as dificuldades e entraves administrativos que costumam ter as direções e os docentes que querem pôr em prática estes novos modelos inovadores do ensino. Felizmente, cada vez são mais numerosos na prática estes planos educativos. Já existem escolas que saem à comunidade para percorrê-la e conhecê-la melhor, para fazer pesquisas, para partilhar aprendizagens, experiências, celebrações e atos culturais. Expedições e percursos, desenhos e elaborações de mapas, oficinas de leitura, safaris fotográficos, narrações e concertos ao ar livre, exposições e feiras, visitas a bibliotecas e a locais históricos, gravações e filmações, entrevistas a personagens, trabalho em hortos e jardins, sementeira de árvores, elaboração de cartazes e murais, participação em campanhas de diferentes tipos e temas, etc.john-bremer-noticia-num-jornal-em-ingles

O grande pedagogo italiano Francesco Tonucci, a que em breve dedicaremos um nosso depoimento da série, leva anos a promover a rede europeia de cidades educativas, em que, entre outras, estão por merecimentos próprios Florença, Roma, Londres, Paris, Barcelona, Vitória-Gasteiz, Salamanca, Madrid e as galegas da Corunha, Ponte Vedra e Compostela. Dous grandes pedagogos, Tagore e Freinet, tinham claro que é o ambiente o melhor recurso educativo que existe. O francês, com grande acerto, assinalava que o melhor livro de todos é a vida. E isto mesmo disse no seu dia Otero Pedraio. Pela sua parte, o bengali Robindronath Tagore, recomendava aos professores: “Não levem a árvore para a escola, mas a escola para debaixo da árvore”, o que levou à prática no seu paraíso educativo de Santiniketon (“Morada da Paz”), onde as aulas se dão ao ar livre, debaixo de árvores centenárias em que cantam os pássaros, muitos deles de cores. Todos os pedagogos das Escolas Novas europeias e americanas criaram as suas escolas em pleno campo, embora perto das cidades. Desta maneira, aproveitavam os dous ambientes. O natural do campo e o social, artístico e cultural da cidade.

No sistema educativo atual é preciso mudar muitas cousas. O ensino termina por ser enormemente rotineiro, e portanto, aborrecido. Na maior parte dos casos, os únicos recursos que se utilizam são, em primeiro lugar a saliva e o manual escolar, que pouco ou nada fala aos escolares das suas cousas próximas e da sua vida. É um livro desumanizado, genérico, abstrato e quase que irreal. Se a isto acrescentarmos no final o exame memorístico e repetitivo, que considera os estudantes como papagaios ou magnetofones, a antipedagógica escola está servida. Partilhamos o que muito acertadamente comentou no seu dia o pedagogo galego Jurjo Torres Santomé, quando escreveu: “Um ensino organizado por matérias ou disciplinas ao redor do manual escolar como único recurso didático como fonte informativa não respeita a diversidade cognitiva, cultural e social do alunado”.

Todos os especialistas em Didática coincidimos em dar muita importância ao tema dos recursos didáticos. Quase que todos coincidimos na classificação que dos mesmos fazemos. Essencialmente seriam os impressos, audiovisuais, os manipulativos, os humanos e os fornecidos pelo entorno natural, sociocultural, artístico, comercial e inclusive industrial. Se contemplarmos as sete grandes cidades galegas (Compostela, Corunha, Lugo, Ourense, Ponte Vedra, Vigo e Ferrol), infelizmente, observaremos o pouco que os estabelecimentos de ensino e escolas dos diferentes níveis, aproveitam para o ensino e organização de atividades educativo-didáticas, os múltiplos recursos que oferecem, a começar pelos humanos (artistas, escritores, artesãos, historiadores, docentes, jornalistas, críticos, etc.) convidando-os para pronunciar palestras sobre os temas que dominam. E o mesmo com os seus recursos naturais, sociais e artísticos, como museus, arquivos, parques, jardins, igrejas, castros, portos, quintas, lotas, rias, fábricas, praias, indústrias, catedrais, bibliotecas, livrarias, alamedas, praças, mercados, emissoras, escritórios de jornais e de rádios, estádios, fontes termais, ribeiras de rios, estações de autocarros e comboios, casas consistoriais, auditórios, paços de desportos, etc.

 

    TEMAS PARA REFLETIR E REALIZAR:

Vemos os documentários citados antes, e depois desenvolvemos um Cinema-fórum, para analisar a forma (linguagem fílmica) e o fundo (conteúdos e mensagem) dos mesmos, assim como os seus conteúdos.

john-bremer-capa-livro-escola-sem-muros   Organizamos nos nossos estabelecimentos de ensino uma amostra-exposição monográfica dedicada a John Bremer, a sua vida, a sua obra, as suas ideias, o seu pensamento e o seu importante labor, ao criar em Filadélfia o seu “Programa Parkway”, uma escola aberta sem muros ou paredes. Na mesma, ademais de trabalhos variados dos escolares, incluiremos desenhos, fotos, murais, frases, textos, lendas, livros e monografias. A citada amostra incluirá também uma secção especial dedicada ao seu plano educativo inovador de “Escola sem muros”, as suas atividades e as suas publicações.

Desenvolveremos um Livro-fórum em que participem todos os escolares e docentes. O livro mais adequado para ler é o intitulado Escola sem muros. A revolução pedagógica. O Programa Pakway de Filadélfia. Este livro foi publicado pela editora Ibrasa de Brasil em 1975. Poderia valer também, em edição em castelhano, o livro La escuela sin paredes. Una nueva experiencia educativa, editado por El Ateneo de Buenos Aires, no mesmo ano de 1975. Seria de grande interesse que, de forma cooperativa entre docentes e alunos do nosso estabelecimento de ensino, se elaborasse um plano similar ao de Bremer, para desenvolver na nossa localidade, contando com os recursos que tenhamos na mesma: humanos, artísticos, históricos, bibliográficos, naturais, etc.

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