Memória reintegracionista

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Capa da 'Breve História do Reintegracionismo', de Tiago Peres (Através Editora, 2014)
Capa da ‘Breve História do Reintegracionismo’, de Tiago Peres (Através Editora, 2014)

Os coletivos humanos, das famílias às nações, precisam de suportes em que se encarnam, espaços onde sedimentar as memórias para saber donde vêm e aonde vão. Em Breve História do Reintegracionismo, Tiago Peres Gonçalves não só reconstrói com minúcia historiográfica a nossa árvore genealógica, senão que também nos dá o calor dum álbum familiar.

A caminho entre o trabalho académico e a divulgação, este percurso polo reintegracionismo – entendido como estratégia de restauração linguística – divide-se em dous blocos separados pola guerra de 1936. Abre-se o livro com a cita duma acusação de 1928 a Johan Carballeira por ter posto uma “bomba” no El Pueblo Gallego ao reabrir o debate sobre a ortografia do galego; e é que o fenómeno descrito pola ‘Lei de Berto’ vem de mui atrás, dos mesmos inícios do Ressurgimento. O primeiro bloco revê, com um detalhe inédito, estes primeiros debates que provocam surpresa pola antecipação de quase todos os argumentos que uma e outra parte esgrimem nos dia de hoje. Ainda, Tiago Peres amplia as habituais antologias de declarações de vultos do reintegracionismo posicionando-se a favor da unificação ortográfica, resgatando textos pouco conhecidos, como o “Cara a língoa franca galaico-portuguesa” (1926) de Rafael Dieste.

No segundo bloco aborda-se a crucial fase de normativização do galego e o nascimento do reintegracionismo strictu sensu, assim como a sua evolução de corrente académica a movimento social. Tiago Peres – que tem como outra das suas linhas de investigação o papel da direita galeguista na institucionalização da Autonomia – fornece interessantes dados sobre esse processo de blindagem do espaço do possível que poderíamos chamar, à maneira de Guillem Martínez, Cultura da Autonomia, e que tivo como principal agente o pinheirismo: a presidência na RAG de García-Sabell, o ‘Decreto Filgueira’, e o pau e a cenoura da perseguição linguística e as prebendas da ‘bolha literária’.

Quanto à transformação do reintegracionismo em movimento social, estamos perante um exemplar trabalho de memória dissidente que lamentavelmente não abunda: a maioria dos movimentos galegos permanecem na história oral e com dificuldades de transmissão (das quais o adanismo dos novos movimentos são um sintoma). A perspetiva do autor, aliás, difere da que monopoliza a autorrepresentação do reintegracionismo como um movimento urbano, tecnológico, neofalante e até liberal; com justiça, Tiago Peres dá uma visão mais plural, sublinhando o determinante papel do sempre incómodo independentismo e o ativismo de base.

PERES GONÇALVES, Tiago. Breve história do reintegracionismo, Através Editora, 2014.