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Luís Mazás López: «Não se pode entender o galego sem o português e à inversa»

Escrevo para as pessoas da minha comunidade existencial, para os distantes, para os que vamos, em palavras de Thomas Bernhard, na direção contrária.

 

Por que um livro de poesia? Por que a poesia?Luismaças2

Levo muito tempo escrevendo poemas. Publiquei algum artigo sobre literatura e linguística. Também tenho uma novela curta inédita Adela no país de Ural. Mas a poesia a levo dentro desde adolescente. Aos dezesseis anos, no liceu Masculino da Corunha, formava parte dum grupo de pop-rock, desses muitos que desaparecem ao pouco tempo. Como não se me dava moi bem tocar a guitarra, optei por escrever as canções.

Depois na Faculdade de Filologia da Corunha formei parte da revista universitária “Gaveta”. Foi onde publiquei os meus primeiros versos junto a companheiros como Alfredo Ferreiro, Tati Mancebo, Mário Herrero e Pedro Casteleiro.

Com estes mesmos poetas e também com Chíqui Lozano, François Davó e Dulce Fernández, formei parte do coletivo Hedral.

Esta foi uma época muito importante para a minha formação como poeta. Hedral nasceu ao abrigo da Agrupación Cultural O Facho. O legado para a literatura galego- portuguesa está na publicação coletiva do grupo: 7 POETAS. A CORUÑA 1995.

 

Escrevo na grafia histórica do galego desde o ano 1992. Não se pode entender o galego sem o português e a inversa. É uma opção linguística que nos leva a ter uma projeção dentro da lusofonia.

Escrever na grafia histórica do galego… muito clássico o dizer; o reintegracionismo tem uma trajetória longa e particular na Corunha, não é?

Escrevo na grafia histórica do galego desde o ano 1992. Não se pode entender o galego sem o português e a inversa. É uma opção linguística que nos leva a ter uma projeção dentro da lusofonia

Os problemas que temos os que optamos pela grafia portuguesa são fundamentalmente ficar relegados a um segundo plano. No 1992 publiquei nas Actas do Congresso Internacional “A língua portuguesa no Mundo” um artigo sobre a língua legítima e os prémios literários na Galiza. Muito do que escrevi, por desgraça, ainda tem vigência hoje.

Vou citar uns parágrafos que podem ilustrar a situação do escritor lusófono na Galiza:

A alternativa do escritor galego está em fazer parte da elite intelectual intimamente conectada com o poder ou passar a uma situação marginalizada: Escrever na normativa de mínimos ortográficos (elaborada pela comissão de linguística da ”Xunta” pre-autonómica), na normativa de máximos ortográficos (elaborada pela “Comissom Linguística da Associaçom Galega da Língua”), ou seguir as normas do acordo Ortográfico de 1990, que unificou a escrita do galego, português e brasileiro.

Esta segunda opção é coartada pelo poder em áreas da uniformidade literária: O sistema homogéneo das maiorias (remito-me a Deleuze e Gauttari).Podemos dizer que boa parte da produção literária na Galiza é anulada, inexistente

É uma censura de conteúdos, situação não exclusiva da Galiza. O que ocorre é que no caso que nos ocupa está marcada linguisticamente por um padrão legítimo. As opções morfológicas (comer o caldo/ come-lo caldo) e gráficas (filologia-filoloxía) não têm valor por si próprias, senão como símbolos de uma situação de não poder e de poder, respectivamente.

Realmente somos uma minoria dentro duma minoria. Mas percebo um ar fresco de esperança, porque afortunadamente começamos a ser escutados (ainda que timidamente). É um avanço porque não podem prescindir da nossa voz, da minoria dentro da minoria.

E agora? é um outro tempo? que é ‘Três tempos’?

Em relação ao meu livro “Três tempos” dizer que cronologicamente o ponto de partida foi o 1995, depois da publicação de 7 poetas. Os últimos poemas são do 2015. O processo de criação foi longo e com muitas vicissitudes. O meu caso não deixa de ser diferente a muitos da minha geração. Aos vinte anos não era viável a publicação dum livro em reintegrado e então o corpus poético foi crescendo, atualmente quatro poemários.

Três tempos e uma seleção de três deles: Abjeção a preto e branco, O fundo Absurdo das paisagens e Road Movie. Não inclui um grupo de poemas inspirados numa releitura do livro do desassossego, que ficam inéditos pelo momento.

A terceira parte, Road Movie ,como o seu nome indica, é um percorrido por localizações espaciais e também do universo poético. É uma viagem surreal num aeroplano que aguardo que o leitor também se suba a ele e experimente as suas próprias percepções.

A segunda seção, O fundo absurdo das paisagens, a defino como uma investigação da linguagem poética e do universo pessoal do poeta que entra em conjunção com a paisagem, fundamentalmente galega. Há muitas localizações evidentes e outras mais ocultas.

O primeiro poemário, Abjeção a preto e branco, ganhou o a primeira edição do prémio de poesia Terra de Melide em 2001. Apresentei-o na norma de AGAL. Para mim foi uma surpresa já que sabia que isso era um escolho para o júri. O prémio tinha dotação econômica, mas não a publicação do poemário. De ai nasceu a ideia de publica-lo e de facto apresentei o projeto a várias editoras. Todas as tentativas fracassaram e então foi passando o tempo.

É difícil, é, até sobreviver. Mas não abandonaste a escrita…

Os anos foram passando, e a partir do 2003, abandonei o trabalho de comercial de editoras, passando ao industrial, ao mundo do material elétrico.

Por motivos pessoais, devidos fundamentalmente a escassez de tempo, abandonei a vida cultural e também a diretiva da Agrupação Cultural O Facho.

Segui escrevendo aos poucos, aproveitando o tempo livre. Há três anos retomei timidamente a atividade cultural.

Entrei em contacto com Ramiro Vidal Alvarinho, ao que já conhecia desde os anos noventa. Com ele partilhei projetos, participando mais ativamente em recitais poéticos. Ele puxo-me em contacto com a Porta Verde do Sétimo Andar, com Alfonso Laúzara e com Miguel Alonso Diz.

Três tempos já é uma realidade. O lançamento foi o 26 de Fevereiro no Centro Ágora da Corunha. Depois tenho previsto mais, em princípio em Ferrol e talvez também em Santiago.

Agora é o público o que tem a palavra. Há certos caminhos que levam tempo. De facto nunca é tarde para publicar. Devo citar a Ernesto Sampaio: Escrever é entregar-se à fascinação da ausência de tempo, e aqui aproximamo-nos da essência da solidão.

Escrevo para as pessoas da minha comunidade existencial, para os distantes, para os que vamos, em palavras de Thomas Bernhard, na direção contrária.

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